Em Montenegro, mais de 40 crianças sofreram algum tipo de violência em 2023

SUSPEITAS de agressão física e violência sexual devem ser denunciadas

De janeiro até dezembro de 2023, o Conselho Tutelar de Montenegro atendeu 43 casos relacionados a agressões físicas e violência sexual contra crianças e adolescentes. Situações de negligência também têm chamado a atenção das autoridades dedicadas ao cuidado e proteção dos menores. Denunciar atitudes suspeitas é a forma mais eficaz de combater tais crimes, que ocorrem em ambientes onde se espera proteção e cuidado às crianças.

Ao falar sobre violência contra crianças e adolescentes, vem à memória dois casos recentes registrados no Vale do Caí. Na última semana de dezembro, em Salvador do Sul, um casal foi detido pela Polícia Civil após agressão a uma criança de apenas dois anos. Em um segundo episódio, no último dia de 2023, uma menina de 11 anos também foi apontada como vítima de suspeita de maus-tratos. A pequena acabou falecendo, sua mãe e padrasto foram detidos e são investigados.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/1990, define maus-tratos como qualquer forma de violência física ou emocional, abuso sexual, negligência ou exploração que cause dano à integridade física, psíquica ou emocional de uma criança ou adolescente. O ECA estabelece que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Leila Ternnes, coordenadora do Conselho Tutelar de Montenegro, destaca que toda a sociedade pode contribuir para o bem-estar dos pequenos. Para isso, ao suspeitar que algo não está correto, deve denunciar ao Conselho.”Quando chegam ao plantão do Conselho, as denúncias são prontamente verificadas e, quando necessário, encaminhadas para a rede de proteção e apoio. A identidade do denunciante é mantida em absoluto sigilo”, assegura.

“As escolas têm o dever de comunicar suspeitas de maus-tratos, e existem outras entidades, como CRES, CRAS e unidades de saúde, responsáveis por realizar visitas técnicas de checagem”, explica. Quando confirmados os casos de violência, medidas imediatas são tomadas para proteger a criança, que pode ser temporariamente afastada do ambiente de risco.

O Conselho Tutelar de Montenegro está disponível nos números: 51 9 9680-3318 (ligações) e 9 9707-9723 (WhatsApp). O endereço é: rua Cel Antônio Inácio, nº 57, próximo à Pracinha da Igreja Matriz, com atendimento das 8h às 12h e das 13h30 às 16h30. Fora desses horários, o plantão está disponível via telefone.

O conceito de maus-tratos segundo o ECA abrange:
Violência física: ações que causem lesões corporais à criança ou adolescente, sejam elas resultantes de agressões, castigos físicos ou qualquer tipo de violência que prejudique sua saúde ou bem-estar físico.

Violência psicológica: compreende atos que causem dano emocional ou diminuição da autoestima, como aterrorizar, intimidar, humilhar, discriminar, ameaçar, entre outros.

Abuso sexual: qualquer forma de atividade sexual imposta à criança ou adolescente, seja ela por meio de relações sexuais, atos libidinosos, exposição a material pornográfico, exploração sexual, entre outros.

Negligência: refere-se à omissão por parte dos responsáveis em prover as necessidades básicas da criança ou adolescente, como alimentação adequada, cuidados médicos quando necessário, educação, afeto e proteção contra qualquer forma de violência ou perigo.

Violência e negligência estão por trás da retirada de menores de seus lares
A negligência, violência sexual e psicológica surgem como as principais razões que levam menores a serem retirados de seus lares. Essa triste realidade é compartilhada por Rosângela Flores da Rosa, responsável pela gestão da Casa de Acolhimento Menino Jesus de Praga. Atualmente, através de convênio com o Município, a instituição abriga 25 crianças e adolescentes, com idades variando de zero a dezoito anos e de ambos os sexos.

Rosângela destaca uma preocupante predominância de casos relacionados a maus tratos, que acabam em outras violações graves de direitos. “De nossos residentes, apenas uma criança foi acolhida devido a violência física direta. No entanto, a maioria enfrentou situações alarmantes que incluem negligências, abusos sexuais, violências psicológicas, além de conviverem com genitores ou responsáveis envolvidos em dependências químicas, violência doméstica e, frequentemente, conflitos familiares que os colocam em risco”, revela.

O endereço do Conselho Tutelar é: rua Cel Antônio Inácio, nº 57, próximo à Pracinha da Igreja Matriz, com atendimento das 8h às 12h e das 13h30 às 16h30. Foto: arquivo Jornal Ibiá

Conforme a gestora, a Casa de Acolhimento Menino Jesus de Praga busca não apenas abrigar, mas também restaurar a dignidade e o bem-estar desses jovens. Ao chegarem, muitos estão em estados emocionais e psicológicos extremamente vulneráveis. “Realizamos uma investigação minuciosa do histórico de vida de cada criança ou adolescente, abrangendo aspectos escolares, familiares e de saúde. Com base nessa avaliação, desenvolvemos um plano de atendimento individualizado”, explica a equipe de coordenação.

Muitos desses menores não tinham acesso prévio à rede socioassistencial. Diante disso, são prontamente encaminhados para especialistas e serviços especializados de acordo com suas necessidades específicas. “Seja através de pediatras, psicólogos, psiquiatras ou outros serviços disponibilizados pelo CAPS, AMENT e CSMIJ, nosso compromisso é proporcionar o suporte necessário para que cada jovem possa reconstruir sua trajetória com dignidade e esperança”, diz Rosângela.

Especialista alerta sobre sinais
O combate à violência sexual e maus-tratos infantojuvenis é uma questão que demanda atenção e compreensão. Sob a coordenação do psicólogo Guilherme Bulcão Manica, o Comitê Intersetorial de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil busca educar a comunidade para que possam reconhecer sinais indicativos e as consequências desse grave problema social.

Guilherme destaca que, muitas vezes, as crianças e adolescentes não verbalizam suas experiências traumáticas. Portanto, é fundamental que adultos ao redor estejam atentos a alterações comportamentais e emocionais que possam indicar a ocorrência de maus-tratos. Entre os sinais mais evidentes estão mudanças abruptas de comportamento, como agressividade desmedida ou isolamento excessivo, bem como variações no desempenho escolar sem razões aparentes.

Young Caucasian girl with broken leg in plaster cast

“É preocupante quando observamos lesões físicas sem justificativa plausível, marcas de violência ou até mesmo o medo manifestado pela criança ao estar na presença de determinadas pessoas. Outros indicativos incluem a relutância em retornar ao lar ou se afastar de atividades e colegas comuns”, esclarece Manica.

Além dos aspectos comportamentais, as repercussões emocionais em crianças vítimas são profundas. Elas podem manifestar ansiedade, episódios depressivos, distúrbios de sono e pesadelos frequentes. “É crucial estar atento a regressões comportamentais, como voltar a hábitos já superados, por exemplo, chupar o dedo. Esses sinais, muitas vezes sutis, podem ser indicativos de traumas que precisam ser abordados”, afirma o psicólogo.

As consequências traumáticas também podem se estender a longo prazo. Guilherme ressalta que crianças expostas a violências podem enfrentar desafios no desenvolvimento emocional, comprometimento no aprendizado, baixa autoestima e dificuldades de confiança. “Para mitigar esses impactos, é essencial oferecer suporte emocional e psicológico adequado, garantindo que essas crianças recebam o cuidado necessário para sua recuperação e bem-estar”, conclui o especialista.

Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil fomenta luta coletiva
Montenegro possui uma rede de proteção e apoio às crianças e adolescentes vítimas de violência. O grupo conta com representantes de órgãos como o Centro de Referência Especializado em Assistência Social e a secretaria municipal de Desenvolvimento Social, Cidadania e Habitação, entre outros. Em resposta à preocupação com a violência sexual contra crianças e adolescentes, o município conta ainda com o Comitê Intersetorial de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil.

O Comitê representa a união de forças das entidades na prevenção e combate às violações sofridas pelos menores. Coordenado pelo psicólogo Guilherme Bulcão, representante do CRAS, o comitê desempenha papel de órgão consultivo, propositivo e deliberativo, focado na prevenção.

Marília Santana, vice-diretora executiva da Fundação Municipal de Artes de Montenegro (Fundarte), é uma das vozes ativas no Comitê. Ela enfatiza a missão central da entidade: integrar esforços de instituições e membros da sociedade para prevenir e enfrentar a violência sexual infantojuvenil. O objetivo final é garantir que crianças e adolescentes cresçam em ambientes seguros, protegidos contra toda forma de violência.

Em 2023, o Comitê realizou 15 palestras em escolas de Montenegro, buscando educar tanto alunos quanto professores sobre os sinais de abuso e a importância da denúncia. Guilherme trabalha para tornar o tema acessível aos jovens, capacitando-os a reconhecer e relatar abusos. Além disso, o comitê capacita profissionais da educação e da saúde para identificar sinais de maus-tratos e negligência. Marília ressalta como vital o envolvimento de diversos atores sociais, desde o Conselho Tutelar, Brigada Militar, Polícia Civil, até professores e diretores escolares.

Canais de denúncia

Conselho Tutelar: 51 9 9680-3318 (ligações)
e 9 9707-9723 (WhatsApp)
Disque 100
Brigada Militar (190)
Polícia Civil: 51 3632 11 11 – 3649 00 00
Polícia Rodoviária Federal 191
Escolas (professores, orientadores, diretores)
Também é possível fazer denúncias diretamente ao Ministério Público, que tem o dever de promover ações de proteção aos direitos de crianças e adolescentes.

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