Depressão: conversa e atenção ao comportamento dos pequenos são essenciais

A depressão, aponta a Organização Mundial de Saúde, será a doença mais incapacitante no planeta até 2020. Atualmente, mais de 322 milhões de pessoas sofrem do transtorno no mundo, representando 4,4% da Terra. E o problema de saúde não está restrito aos adultos. Atinge cerca de 2% das crianças em idade pré-escolar e 11,7% das que já passaram para o período da puberdade.

Com as crianças, em especial, é preciso ter atenção a alguns sintomas como: Alterações no humor, tristeza, desânimo, choro fácil, mudanças no apetite, alterações no sono, irritabilidade, deixar de brincar, estado permanente de insatisfação. Essas características são comuns a pacientes de qualquer idade. Entretanto, como as crianças costumam ter dificuldades em relatar o que sentem, é preciso um olhar mais apurado dos pais ou responsáveis.

A psiquiatra da infância e da adolescência pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) Maria Aparecida Nunes Fontana ressalta, às vezes, ser difícil para os pais entenderem ou aceitarem o problema vivido pelos filhos. Falas de responsáveis sobre darem “tudo para os filhos” e, ainda assim, eles apresentarem depressão ou ansiedade são frequentes. “Não parecem ver sentido nisso. Mas, na verdade, em cada idade é preciso enfrentar diferentes conflitos e obstáculos. As crianças e adolescentes podem não conseguir lidar com essas situações difíceis”, explica.

Quem sofre da doença nesta fase, tem mais de desenvolvê-la quando adulto. Os reflexos quando pequenos já são grandes. “É uma criança que teria todas as condições de estar experimentando, em momento de aprendizado, de desempenhar todas as suas habilidades e acaba não conseguindo por não estar bem. Na verdade, o que se pode fazer é tentar minimizar os efeitos desse quadro para que ela possa ter um bom desenvolvimento”, sublinha a psiquiatra, também professora do curso de Medicina da Universidade da Região de Joinville (Univille).

A depressão tem diferentes quadros, variando entre leves, moderados e graves. A especialista destaca a necessidade de, notando um ou mais sintomas, o paciente seja levado, primeiramente, a uma ajuda psicóloga ou psiquiatra que faça terapia. Para, na sequência, avaliar se a criança precisa ou não de medicação. Além disso, em alguns casos, os pais precisam fazer tratamento, seja acompanhamento psicológico ou psiquiátrico.

O cuidado com a saúde mental dos pequenos não deve ficar restrito aos pais. Também é importante ao comportamento deles na escola. “Crianças pequenas, quando afastadas dos pais, podem apresentar um comportamento similar a um quadro depressivo, ficam muito apáticas e não se movimentam muito. De repente até não correspondem a estímulos”, comenta Maria Aparecida. Esses casos precisam ser melhor avaliados.

Maria Aparecida Fontana

Sintomas são confundidos com “coisas da idade”
No caso de adolescentes, é comum os responsáveis julgarem comportamentos diferentes dos filhos, como “coisas da idade”. Em certos aspectos isso até é verdade, aponta a psiquiatra, mas podem ser sinais de estarem deprimidos ou talvez com algum outro problema dessa natureza.

“Porque o adolescente tem períodos que fica mais associal, separado. Mas os pais têm que ir lá, procurar, ficar atentos. Quando eles não estão bem vai ter comprometimento do rendimento escolar, afastamento do grupo de amigos ou vão deixar de fazer coisas que antes ‘curtiam’. Nessas horas, é preciso se manter próximo, chamar para fazer coisas juntos, algo que o adolescente goste, manter-se atento, observar seu jeito, comportamento, mudanças”, aconselha.

A médica salienta como fundamental os pais, ao perceberem os sintomas, chamarem os filhos e terem uma conversa franca. Não existe um manual eficiente de como criar um filho, por isso, a dedicação em dar o seu melhor assume caráter imprescindível. Vale ler livro sobre o assunto, pesquisar em sites confiáveis, conversar com os psicólogos da escola, enfim, uma série de itens. Só não é permitido pecar por omissão.

Alguns Sintomas
Alterações no humor,
Tristeza
Desânimo
Choro fácil
Mudanças no apetite
Alterações no sono
Irritabilidade
Deixar de brincar
Estado permanente de insatisfação

O tratamento
O tratamento é feito com auxílio médico profissional, por meio de medicamentos, e acompanhamento terapêutico, conforme cada caso. O apoio da família é fundamental.

Prevenção
Exercícios regulares
Dormir bem
Controlar o estresse
Evitar álcool e drogas
Manter ou crie hobbies
Ter mais contato com a natureza

Relatos de suicídios não são comuns
Os suicídios de crianças não são comuns. Há, segundo Maria Aparecida, mas que devido a pouca idade dos autores não resultaram em mortes. Por outro lado, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o suicídio está entre a segunda maior causa de mortes, entre jovens entre 15 e 29 anos, atrás somente das ocorridas em acidentes de trânsito. “Em 99,9% das vezes, antes do suicídio essas pessoas já estavam apresentando algum quadro psiquiátrico fosse depressão, bipolaridade, ansiedade, às vezes, uso de drogas. Essas pessoas deveriam estar sendo acompanhadas”.

Síndrome da Adolescência Normal
Maria Aparecida Fontana cita o conceito de Síndrome da Adolescência Normal, elaborado pela psicanalista argentina, Arminda Aberastury. Síndrome, para a medicina, remete a doença, e normal, a ausência dela. Isso, em um primeiro momento, parece um paradoxo. “Ela quer dizer com isso que o adolescente tem alterações de humor, de comportamento, que são próprios deste fenômeno, adolescência. Essas alterações oscilam entre timidez, arrogância, irritação com um comportamento associal”, lista.

O comportamento, muitas vezes, é normal nessa faixa etária, mas pode representar um sério problema de saúde.
Isso aumenta a relevância de sempre estar atento, questionar se está tudo bem, procurar saber como passou o dia. “Também é legal fazer coisas juntos, mas o que ele gostaria de fazer? Quer ver filme de terror? Vou ver. Gosta de ouvir uma música que eu não curto? Vou tentar me inteirar do que ele gosta, como se fosse um amigo. Às vezes, os pais ficam muito numa postura de discurso, o que eu faço, o que eu faço que é bom, e isso acaba afastando a vontade de estar perto”, aconselha.

Luciana Lopez Silva

Nem tudo é depressão
Luciana faz a ressalva de haver diferença, às vezes esquecida pelos pais, entre estar triste e deprimido. Os casos clínicos, que prejudicam o desenvolvimento da criança precisam de tratamento.

Por outro lado, segundo ela, o imperativo cultural de ser feliz o tempo inteiro causa uma dificuldade do adulto em lidar com o fato de perdas e tristezas serem inerentes à vida também. “É comum famílias buscarem atendimento porque a criança estaria ‘deprimida’ com a perda de um familiar. E a criança pode não estar deprimida, e sim de luto, e a tristeza neste caso é um sentimento que precisa ser vivenciado”, esclarece.

Criação dos filhos demanda tempo
Diante de um mundo cada vez mais corrido, foi disseminada a ideia do importante ser a qualidade do tempo passado com as crianças e não o tempo em sim. Para Luciana, isso não é verdade. “Criar um ser humano exige tempo. É necessário tempo para conversar, cuidar da rotina, brincar com os filhos, conhecer os amigos, acompanhar a escola. Organizar limites em vez de ‘impô-los’ requer tempo. Quando se organiza um limite, se ajuda a construir um psiquismo fortalecido para os revezes da vida. Quando se apenas impõe, corresse o risco de este seja vivenciado pela criança como uma submissão ao adulto, e não como algo protetivo”, ensina.

Professores percebem sinais
Gislaine dos Santos Sarmento, psicóloga no Colégio Sinodal, destaca que o diagnóstico da depressão infantil deve ser bastante cuidadoso, pois a criança não consegue expressar verbalmente seus sentimentos e deve ser entendido todo contexto em que ela vive. Por isso a importância das escolas estarem atentas.

“O professor é o principal agente de observação em sala de aula. Ele é orientado a estar atento a comportamentos como apatia, falta de interesse, tristeza, irritabilidade, agressividade, bem como baixo rendimento escolar”, destaca Gislaine, citando a ação multidisciplinar realizada na instituição de ensino em que atua.

Com algum destes sintomas percebido o professor deve fazer um encaminhamento ao setor de orientação escolar para que possam ser feitas observações, conversa com aluno e família objetivando conhecer a realidade do aluno e possíveis fatores que possam estar desencadeando tais comportamentos e, sempre que necessário, o setor sugeri para a família um acompanhamento com profissional da saúde para ser feito um diagnóstico.

Secretarias da Saúde e Educação estão atentas
Em Montenegro, as crianças em sofrimento psíquico são atendidas na Secretaria Municipal de Saúde (SMS), nos setores da Pediatria. A pasta atua de forma integrada com a Secretaria de Educação e Cultura (Smec).

A psicóloga da Pediatria da SMS, Luciana Lopez Silva, destaca existir a cultura da falta de limite aliada a um imperativo de sucesso, felicidade, magreza, entre outros. “Os limites muitas vezes são vivenciados não como protetivos ou como parte de um processo de construção de um ideal, mas como fragilizadores da autoestima. A comparação entre a vida real, repleta de possibilidades e limites, e a vida idealizada pela cultura (felicidade plena, a família da propaganda ou a que é mostrada no Facebook alheio) produz sofrimento. Nos indivíduos, nas famílias e nas crianças”.

O problema pode levar à depressão, transtornos de conduta, dificuldades na aprendizagem, ansiedade, dificuldades na interação social, entre outro, nas crianças. Além de causas relacionadas com a própria estruturação do psiquismo da criança, há desencadeadores externos que podem ocasionar uma baixa importante na autoestima, como as vivências de bullyng na escola.

Escolas municipais em alerta e em contato com as famílias
Os professores da rede municipal têm, segundo a Smec, preocupação com o desenvolvimento integral dos alunos. Estão sempre atentos a comportamentos que chamem a atenção no dia a dia, que possam ser causados por algum tipo de sofrimento. “Quando tais situações são identificadas, a escola busca chamar a família do aluno para conversar na intenção de auxiliar, apoiar e até mesmo pensar junto em possíveis estratégias de intervenção”, conta a psicóloga da instituição Melissa Lopes Araújo.

No caso de surgir uma demanda específica em alguma escola, é pensado em parceria com a SMS, alguma ação de prevenção como palestras e rodas de conversas. “Quando a escola percebe algum caso pontual, já conversou com a família e é uma situação que precisa de encaminhamento para um profissional de saúde, pedimos auxilio a rede de atendimento do município, para que o aluno receba os atendimentos necessários e assim tenha uma melhor qualidade de vida”, frisa a psicóloga.

Ela aponta estar ocorrendo um crescimento do número de famílias em busca auxílio da escola quando percebem que seus filhos não estão bem. “Existe uma troca importante que a escola, família e profissional da área da saúde fazem buscando o bem estar da criança ou do adolescente”, finaliza.

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