Aos 86 anos, o médico Ubirajara Resende Mattana segue firmemente atuante na profissão, cuidando de trabalhadores e gerações de famílias que confiam no seu trabalho sério e competente. Em 2019 ele teve um ano especial de reconhecimento. No mês de outubro, devido ao Dia do Médico, o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) homenageou profissionais com 50 anos ou mais de exercício profissional com a entrega da Medalha Mérito Médico 2019. Dentre os agraciados, estava o Médico do Trabalho, que atua há 55 anos na cidade de Montenegro.
Humilde e de uma personalidade idônea, ele foi também escolhido para falar na cerimônia em nome de todos os homenageados. Apesar da honraria, Mattana acredita que seus esforços são iguais aos dos colegas que buscam o bem-estar do próximo. “Eu fiquei muito surpreso com a homenagem, e tive uma satisfação enorme de encontrar amigos da época do segundo grau de Caxias do Sul. Pra mim isso já valeu tudo”, diz.
Natural da cidade de Caxias do Sul, o médico é formado pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Recém-formado, mudou-se para Montenegro no dia 17 de janeiro de 1964 e atua desde então na área. A chegada no município foi a convite de um colega que iria se afastar, e ele então iria substituí-lo. No fim das contas o colega não foi embora, mas Ubirajara ficou eternizando suas raízes.
Orgulhoso, fala com carinho do trabalho em que realizou no Hospital Montenegro. “Eu cheguei no dia 17, e no dia 18 esse médico que ia embora de Montenegro e não foi me levou ao Hospital para me apresentar. E a partir desse dia eu me dediquei ao Hospital Montenegro. Nunca deixei o HM e atendo até hoje os funcionários de lá”, conta. No mesmo dia, Mattana abriu sua clínica com mais cinco colegas, e relata que por ter sido designado pelo Governo Federal a Chefe da Previdência Social, que compreendia toda a área da região, conseguiu trazer bons médicos para a cidade.
Conquistando espaços
O médico iniciou sua carreira na área da Pediatria e atuou muitos anos com afinco. Mas como Montenegro não tinha anestesista, resolveu se especializar. Todos os dias de manhã, durante um ano, Ubirajara pegava a estrada e se encaminhava ao curso em Porto Alegre. Ele tinha que estar no hospital antes do cirurgião para preparar os pacientes, e assim que terminava a cirurgia voltava a Montenegro. “Quando eu chegava a minha esposa levava o almoço pra mim no consultório. Não tinha tempo pra nada, e tinha os meus clientes também. E assim eu fiz o curso, sou especialista em anestesia”, fala.
Antevendo as alterações trabalhistas que estariam ocorrendo, Mattana percebeu que as empresas iriam precisar de alguém especializado para admitir funcionários, e assim realizou seu primeiro curso de medicina do trabalho, em Novo Hamburgo, há mais de 20 anos. A decisão por enfrentar a estrada novamente foi influenciada também pelo passado. “Eu pensei bastante, e o meu pai era industrial e eu conhecia bem a vida de industriais. Nós tínhamos uma empresa com mais de 500 funcionários e o meu pai sempre prestou a atenção nisso, sempre cuidava dos funcionários, achei importante essa decisão”, relata. Após isso, começou a atender as áreas de medicina do trabalho e clínica geral, em que atua até hoje.
Lembranças do passado
Quando olha para trás Mattana lembra e valoriza todas as pessoas que passaram e estão na sua vida. Segundo ele, a profissão já estava decidida quando, no seu terceiro ano do Ensino Médio, um professor reuniu todos os colegas em uma sala durante todo o domingo e realizou entrevistas com cada um, para saber qual a profissão que ele e os colegas se adaptariam. Um teste vocacional já naquela época. “Eu já sabia o que eu queria ser, mas na outra semana o professor nos chamou e disse em que área nós estaríamos mais direcionados para ter sucesso, e o interessante é que todas as pessoas da turma seguiram a carreira que ele havia dito”, relembra.
Casado há 57 anos com a mulher amada que conheceu ainda na cidade natal, Ubirajara agradece por todos os esforços da parte dela. “Ela me esperou tantos anos sem nunca reclamar por eu não estar em casa, que ela mais do que ninguém merece a minha presença”. Mattana comenta que muitas vezes já estavam com o carro pronto para dar um passeio, mas era adiado por precisar atender um paciente, e que mesmo assim a esposa não reclamava. Nas suas palavras, a companheira é fenomenal.
Reflexões no presente
Sobre a formação nos dias de hoje na Medicina, o médico considera tudo muito diferente. Para ele, já começa que hoje os jovens entram muito mais cedo na faculdade do que antigamente, e que a prática antes era muito mais valorizada. “Nós aprendemos anatomia dois anos em cima de cadáveres, não existia isso de boneco e aparelho de plástico. Se fazia clínica médica com os pacientes dos hospitais que nós tínhamos, e cada aluno era responsável por tantos leitos e tínhamos que acompanhar várias vezes por dia, a prática era muito importante”, fala.
Ele conta que os estudos eram rigorosos. Não existia fim de semana e nem feriado, era estudo para aprender a profissão. Ubirajara considera o ensino muito diferente, e relata que antigamente os alunos não possuíam 10% da aparelhagem que se tem hoje.
Mesmo aposentado há mais de 20 anos, o médico declara que não pode ficar sem a profissão. Para ele dois dias horríveis da semana são sábado e domingo, sem o consultório. “É o meu dia a dia, é a mesma coisa que quando eu entro em um hospital, eu me sinto em casa, porque faz parte da minha vida. A medicina me trouxe muita gratificação e eu nunca me arrependi de ter escolhido essa profissão”, diz. Sobre os dias difíceis, Mattana conta que teve muitos, mas que prefere lembrar daquilo que traz alegria e satisfação.