Os riscos do uso excessivo da internet por crianças e adolescentes preocupam cada vez mais os pais, educadores e profissionais da saúde. Repleto de estímulos, o mundo virtual é uma ferramenta de aprendizagem e socialização para os jovens, porém, esses espaços também os deixam vulneráveis a conteúdos inapropriados ou, ainda, reféns da criminalidade online.
Redes de pedofilia, ciberbullying, assédio e violência sexual, jogos e desafios que induzem à autoagressão e ao óbito por suicídio estão entre os perigos do meio digital. Com o intuito de alertar a sociedade para esses perigos, neste mês, o Comitê Estadual de Promoção da Vida e Prevenção do Suicídio divulgou nota de esclarecimento sobre jogos virtuais para os meios de comunicação, familiares e população em geral.
A psicóloga do Núcleo de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, Nathalia Fattah, explica que o suicídio é um fenômeno complexo e multifacetado, que nunca resulta de um único evento, como a reprovação em um exame ou o término de um relacionamento.
Ocorre pela interação de diversos fatores, como discriminação, violência, conflitos familiares, transtornos mentais e comportamentais, uso prejudicial de álcool e outras drogas, traços significativos de impulsividade e agressividade. Uma tentativa prévia é o principal fator de risco isolado para uma morte por suicídio. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é a segunda principal causa de morte em todo mundo para pessoas de 15 a 29 anos de idade e mata mais jovens do que o HIV. No Brasil, dados do Ministério da Saúde apontam que a morte por lesão autoprovocada aumentou em 30% nos últimos anos, na faixa etária de 15 a 19 anos.
Desde junho de 2011, as tentativas de suicídio se tornaram agravos de notificação compulsória e, desde 2014, de notificação imediata nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional. O que indica a necessidade de acionamento imediato da rede de atenção e proteção para a adoção de medidas adequadas a cada caso.
Medidas preventivas podem evitar até 90% dos casos
A sensibilização dos profissionais de saúde que atuam na rede de assistência é importante para ampliar e qualificar as notificações. Neste ano, o Programa Estadual de Vigilância da Violência Interpessoal e Autoprovocada completa 10 anos e, nesse período, foram realizadas capacitações permanentes em todas as regiões do estado para trabalhadores e gestores das redes de saúde e intersetorial. Os profissionais de saúde também precisam estar preparados para atuar no acolhimento e na escuta qualificada de usuários com risco de morte por suicídio.
O psiquiatra do Hospital Montenegro, Ricardo Silveira, destaca que o suicídio pode ser evitado em até 90% dos casos, por ser altamente previsível. “Se forem feitas as intervenções necessárias, com tratamento e uma boa avaliação, é possível chegar a uma porcentagem até maior que essa, porque o suicídio é um desfecho de quadros depressivos graves que podem ser tratados”, afirma o profissional, destacando que a rede pública tem recursos suficientes para oferecer os tratamentos necessários.
Isolamento no mundo virtual
A psiquiatra do Hospital São Pedro, Roberta Rossi Grudtner, destaca que familiares e amigos devem estar atentos ao que escutam, enxergam e sentem, e perguntar diretamente ao identificar que alguém está estranho, diferente, inquieto ou assustado. “Pergunte, influencie, aja: isto salva vidas”, esclarece. Se a pessoa está em sofrimento e, nestes casos, correndo risco, sentirá alívio ao saber que pode contar com alguém para buscar ajuda nos serviços de saúde ou atendimento de profissional da área de saúde mental.
“No caso dos jovens, os pais e responsáveis devem controlar a qualidade, intensidade e o tempo de uso da internet. Devem observar se esta criança ou adolescente está exilado no mundo virtual”, alerta a psiquiatra. De acordo com a médica, estudos indicam que mais de uma hora por dia de exposição a telas de TV, computador, celular ou outros dispositivos, especialmente depois da 19h, começa a atrapalhar o sono, o desenvolvimento e a memória.
Senha de acesso
Para garantir a saúde mental e segurança das crianças e adolescentes, Roberta Rossi Grudtner destaca que é preciso equilibrar as horas de jogos online com o convívio em família e amigos, atividades esportivas, brincadeiras, exercícios ao ar livre ou em contato direto com a natureza. A médica explica que o computador não pode ser de uso individual para uma criança ou adolescente. Os pais ou responsáveis devem ter a senha de acesso a esses dispositivos, dessa forma, é fundamental que a família mantenha um diálogo com os jovens, orientando e informando sobre os riscos do ambiente virtual.
“Só o fato de os pais saberem a senha de acesso dos jovens já os protege e desperta para um uso mais consciente e responsável destas mídias, pois isso pressupõe um diálogo anterior sobre o tema e passa a mensagem: estou aqui para te defender e proteger”, completa a psiquiatra.
Onde posso buscar ajuda?
– Unidades Básicas de Saúde (Saúde da Família, Postos e Centros de Saúde)
– UPA 24H, Samu 192, Pronto Socorro, hospitais
– Centros de Apoio Psicossocial (Caps), uma iniciativa do SUS
– Centro de Valorização da Vida – telefone 188 (ligação gratuita)