Ex-governador argumenta que pessoas erraram, e não o PT como um todo
Um grupo de aproximadamente 50 pessoas se reuniu na tarde de sábado, 31, no Espaço Comunitário Vale do Caí para ouvir o que tem a dizer neste momento um dos mais coerentes petistas. O ex-governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra era esperado com ansiedade, e, ao chegar, correspondeu às expectativas cumprimentando um a um e posando para fotos fazendo seu gesto característico da mão aberta e voltada para cima.
Também correspondeu aos anseios ao realizar uma fala política contundente, todavia moderadora. Afirmou que a militância não deve responder ignorância com ignorância, tampouco a oposição no Brasil alinhavar um impeachment. Olívio comparou está postura “ao golpe que derrubou uma presidenta honesta”, referindo-se à deposição de Dilma Rousseff, e defende como saída a mudança através do voto, com debates que devem iniciar hoje.
Ao elogiar a existência do Espaço Comunitário, afirmou que a movimentação política parte da classe baixa, que deixa de ser objeto para ser sujeito da Política. Olívio repudiou a expressão classe política. “Para nós, política é uma coisa muito importante, e não é uma carreira, uma profissão. Todos somos políticos”. Segundo ele, a ideia que este é um jogo vertical – de cima para baixo – vem do que classificou como “elite”.
O ex-governador sustenta que esta ciência deva visar a construção do bem de todos, com a pessoa como protagonista, e não o lucro. Também repudiou o novo pensamento da política sem partido, definindo uma candidatura individual como “projeto pessoal”. Ele afirma que partidos são aglutinadores de ideia semelhantes e expositores daquele pensamento que será escolhido e eleito pelo povo. “Não há partido que atenda a todos. Isso é mentira”, declarou.
Olívio quer dizer que há diferença sim entre as siglas, pois, como o nome diz, o partido representa “uma parte” da sociedade. E entre as funções destas organizações sociais está promover a “presencialidade”, sendo espaço do debate, do contraditório. “Se encontrar faz com que o ser humano se valorize como gente, e não seja apenas mais uma engrenagem”. Neste sentido, segue o ex-governador, “a sociedade se ergue de uma construção coletiva, na qual o cidadão deve iniciar participando em seu bairro”.
Estado tem que cobrar e não anistiar os devedores, defende Olívio
Jornal Ibiá – O senhor falou que a democracia passa por constante mudança. O senhor acredita que agora estamos vivendo uma mudança na democracia?
Olívio – Penso que esta havendo um retrocesso no processo democrático brasileiro, e que nunca se conclui, é verdade. A democracia brasileira sempre foi suscetível a golpes, golpes abertos, armados, declarados; e golpes como este último ai com a denominação de impeachment… e esse golpe ensejou a esta vitória midiática via “facknews” do atual presidente, que é essa pessoa que em alguns momentos nos ficamos até envergonhados de como ele se porta assim desrespeitosamente. Bueno, então há um retrocesso. A democracia é uma obra aberta. Ela precisa ser consolidada e aperfeiçoada. E nos estamos desrespeitando a democracia… porque ela sofre golpes… então ela precisa ser reconquistada pelo povo, portanto, debaixo para cima… precisamos recuperar a democracia jovem que vínhamos construindo depois do golpe de 64, e que foi agredida com o golpe de 2016.
JI – Quanto é a responsabilidade do Partido dos Trabalhadores neste momento político, sendo que deu razão aos seus acusadores?
Olívio – Olha, o Partido dos Trabalhadores é parte deste processo evidentemente. Aliás, não se constroi democracia sem partidos. Os que pregam a demonização da política e a criminalização do PT são os que pensam em uma democracia mitigada, sem povo, e um estado sob o controle dos mais espertos, dos mais ricos, dos mais poderosos, dos mais influentes. Então o PT tem a responsabilidade de afirmar um projeto onde a democracia não é uma tática, é uma estratégia permanente, um objetivo constante. Evidente que teve gente no PT que cometeu erros, pisou no tomate. Mas se tu vai contar os que estão envolvidos nisto tudo, a maioria dos demais partidos ganham de goleada, com seus filiados, seus figurões, metidos em coisas de apropriação do dinheiro público. É bem verdade que no PT não tinha que ter nenhum! Nenhum com este tipo de comportamento! Mas o PT não é o fulano, o beltrano. O PT é um partido, é um sujeito coletivo, que não surgiu de cima para baixo. Surgiu de baixo para cima. Por tanto, tem razões enormes para se apresentar como uma alternativa efetivamente democrática, respeitadora da coisa pública, do dinheiro público.
JI – Não está faltando algumas cabeças do partido assumir publicamente que o Partido errou, e talvez até recomeçar ao invés de defender algumas figuras?
Olívio – O Partido dos Trabalhadores não é o santinho de passo certo, né. Mas ele jamais poderia ter figuras como algumas que cometeram… descumpriram inclusive o fundamento do partido. Mas esses não são o partido, estou repetindo. E imitaram tantos outros, de tantos partidos, inclusive o do atual presidente da República, que estão envolvidos em tanta coisa mal feita. Então, não se pode exigir do PT exclusivamente que faça o seu arrependimento. Eu, particularmente, acho que o PT, sim, tem que falar com franqueza com a população. Dizer de como poderia ter feito, como deixou de fazer, como com as alianças, em que estavam todos esses partidos, inclusive o partido do atual presidente fazia base, não é, do governo Lula. Imaginem! Então não tem essa de dizer ‘o PT é o culpado’. Faziam parte, estavam lá no butim… o Lula está preso, no meu entendimento, injustamente. Pode ter a legalidade construída, essa é a legalidade construída, mas há injustiça na prisão do Lula, porque está demonstrado que houve parcialidade nas instâncias do Judiciário.
JI – O atual governo – e o antecessor – dizem que o Rio Grande do Sul não tem dinheiro devido às más gestões anteriores. O senhor que foi governador, como explica esta conta? O Estado não tem dinheiro?”
Olívio – Estes que estão no governo, os seus partidos administraram o Rio Grande há décadas. É o mesmo grupo social que tem o controle do estado em sucessivas eleições, com partidos com nomes diferentes, mas é a mesma visão do estado funcionando bem para poucos e mal para a grande maioria. Estes tiveram no Governo do Estado há décadas, se auto-sucedendo. Nós tivemos a honra de sermos eleito em poucos mandatos, e em nossos mandatos a gente reduziu, inclusive, o corpo da divida, o estado cresceu acima da média nacional, a renda foi melhor distribuída e a democracia foi ampliada através do Orçamento Participativo. Acho que estes governantes que estão ai, e aquele que os antecedeu, têm uma visão do estado mínimo. E a gente pergunta: pra quem? É um estado mínimo para a maioria do povo e máximo para o interesse do grande empresariado nacional e internacional, pois eles estão vendendo patrimônio público, vendendo a ‘galinha dos ovos de ouro’. Mas é claro que tem (dinheiro nos cofres do Estado). Mas evidente que tu tem que acabar com os benefícios fiscais para os grande grupos econômicos, com as isenções tributárias, com os favores para este grupo ou aquele setor.Tu tem que cobrar a divida, e cobrar com juro e não anistiar os devedores. Tem uma enorme sonegação… e são gente que financiam as campanhas deles (dos políticos), então evidente que não tinha essa escassez de recurso.