Mãos para o alto

Troca. Há dez anos na Brigada, soldado Tainara se despede da corporação para ingressar na Civil

O coração de Tainara Kerber, 30 anos, tem batido mais forte nos últimos dias. E, nesta quarta-feira, os batimentos cardíacos estarão ainda mais acelerados, em um misto de sentimentos que talvez nem ela mesma saiba descrever. O motivo é que, após dez anos de serviços prestados à Brigada Militar, a soldado Tainara vive as últimas 24 horas como policial militar.

Integrante dos quadros do Comando Regional de Policiamento Ostensivo do Vale do Caí (CRPO-VC), Tainara foi aprovada no último concurso para a Polícia Civil, em 2013. Agora, quase quatro anos depois, ela toma posse como escrivã nesta quinta-feira, em Porto Alegre. Depois disso, saberá qual seu destino. O desejo é continuar na região, já que é natural de Maratá, tem os pais na cidade, o marido, o soldado Silveira, que serve no 5° BPM, os amigos todos e a própria casa montada.

Formada em Direito e pós-graduada em Segurança Pública e Cidadania, Tainara explica que a decisão de migrar para a polícia judiciária tem a ver com o fato de ser uma carreira de nível superior, questão salarial e por oferecer a possibilidade de trabalhar com a área em que é formada. “A Brigada Militar faz o trabalho de polícia ostensiva, enquanto a Polícia Civil atua como polícia judiciária”, acrescenta ela.

Enquanto não é exonerada na Brigada Militar e toma posse na Civil, atos que ocorrerão amanhã, Tainara vive uma mistura de angústia, aflição, ansiedade, curiosidade, expectativa e felicidade. Com tanta coisa junta, admite que não tem sido fácil lidar com a mudança nos últimos dias. “É uma sensação estranha, é uma fase de transição. Hoje estou no CRPO, amanhã não vou estar mais”, pontua.

No Comando Regional, a soldado Tainara atua no setor de pessoal e em atividades internas. Quando conversou com a reportagem do Ibiá, na semana passada, com autorização do comandante do CRPO-VC, Ronaldo Buss, estava na recepção, controlando o acesso e a saída de pessoas. Ela diz que sentirá falta de todas as atividades desempenhadas e do uniforme, e garante: só quem usa a farda sabe o significado dela. “Devo tudo o que tenho à Brigada Militar. Não tenho queixas. Sou apaixonada pela corporação”, afirma.

Nos dez anos dedicados à corporação, ela não conseguiu uma promoção por diferentes fatores, especialmente pelo longo período sem concurso interno. Quando finalmente ocorreu, não pode realizar uma das provas por coincidir com uma avaliação durante o curso de formação para os novos policiais civis.

Devo tudo o que tenho à Brigada Militar.
Soldado Tainara que amanhã troca a BM pela Polícia Civil

Na passarela: soldado foi rainha da Oktoberfest quanto tinha 17 anos

Caminho natural foi seguir pela área da segurança
Ex-rainha da Oktoberfest, quando tinha 17 anos, a carreira na segurança pública começou a ser desenhada na vida Tainara desde muito cedo. Quando ainda estava no Ensino Médio, fez estágio de um ano na Polícia Civil, em Brochier, que funciona em um ambiente conjunto com a Brigada Militar. E foi justamente por conta disso que acabou sendo incentivada para que fizesse o concurso para a BM assim que completou a maioridade.

Entusiasmada e apaixonada, a jovem seguiu os conselhos, fez o concurso e foi aprovada. Antes disso, ganhou outro empurrão para a área ao estagiar, durante um ano, no Departamento Estadual de Florestas e Áreas Protegidas (Defap). “Era uma adolescente, mas o convívio com a BM, o fato de ser instigada e ser curiosa me fizeram seguir o caminho”, observa a policial militar, a poucas horas de deixar a farda.

A precocidade no ingresso fez com que Tainara protagonizasse uma situação curiosa: embora maior de idade e com porte de arma, não pode dirigir veículos militares, já que a legislação autoriza apenas pessoas com 21 anos completos a fazê-lo. Hoje ela não se vê trabalhando em outra área que não seja a da segurança pública.

Soldado diz que o uniforme da Brigada Militar lhe fará muita falta

O primeiro passo para a realização de um sonho maior
A aprovação para a Polícia Civil também representa o primeiro passo para a realização de um sonho: ser delegada de polícia. O pré-requisito, que é a formação em Ciências Jurídicas e Sociais, ela já tem. Cautelosa, Tainara prefere ir devagar, mas traça metas para conseguir atingir o objetivo. Até porque sabe que o trabalho na Civil irá lhe apresentar um mar de desafios que terá de aprender a superar.

A vantagem de Tainara é a experiência na área de concursos. Afora o da Brigada Militar e o da Polícia Civil, ela tem na bagagem outras provas, inclusive já havia feito outro para a Civil, mas ficou de fora. “A gente não faz concurso para passar. A gente faz até passar naquele que a gente quer”, completa.

E passar no concurso da Civil foi uma prova de superação e tanto para ela. Durante um mês e meio, precisou conciliar a preparação com o final da pós-graduação, em meio ao estresse extremo. Para não “enlouquecer”, pode contar com o apoio do marido, parceiro de estudos e responsável por muitos dos resumos que a ajudaram a alcançar a aprovação.

Como retribuição ao seu marido e a todos os demais colegas de farda da Brigada Militar, Tainara promete continuar ajudando na Polícia Civil com o que fazia na BM. Afinal de contas, conhece muito bem a realidade da segurança.

Atividades físicas fizeram parte do curso de formação

Um curso psicologicamente puxado
Durante cinco meses de curso, Tainara e outros 218 colegas que se formaram como escrivães e inspetores passaram por um verdadeiro teste de resistência. Foram cerca mil horas/aula de curso na Academia de Polícia Civil (Acadepol) sempre de segunda a sexta-feira, nos dois turnos, e com provas aos sábados.
“Foi psicologamente puxado”, resume a jovem. Tamanho sacrifício fez com que ela se mudasse para Porto Alegre nos meses em que foram realizadas as aulas, já que considerava inviável o deslocamento diário entre o Vale do Caí e a capital. A volta para a casa se resumia apenas aos domingos.

O fato de ser policial militar ajudou a superar muitas das adversidades no curso, mas o barulho excessivo de Porto Alegre, especialmente a constante movimentação de aeronaves no aeroporto Salgado Filho (a Acadepol fica na região do aeroporto) tirava a sua tranquilidade. Mas nada que a impediu a fazer e de ser aprovada nos testes.

Aliás, a mesma coragem que a fez entrar para a BM em uma terra de alemães, superando o machismo em uma cidade pequena, Tainara pretende exercitar na Polícia Civil. Sobre o medo do que virá pela frente, ela é objetiva e didática: “medo a gente tem que ter, se não a gente morre. O medo é que te mantém viva”.

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