Jovens têm mais interesse na política, diz pesquisa

Em meio ao cenário emblemático que o Brasil atravessa nas eleições 2018, os jovens poderão assumir na vida pública o que representantes da faixa dos 40 acreditam ter perdido. Essa parcela dos brasileiros mostra maior interesse em participar da política, seja assumindo um cargo de governo ou em disputas eleitorais.

Os dados fazem parte de uma pesquisa realizada pelo Datafolha em agosto deste ano. No levantamento, o grupo com idade entre 16 a 25 disse ter muito ou pouco interesse em encarar as urnas, 29%. Conforme a idade aumenta, a disposição reduz. De 26 a 40 anos, apenas 19% dos entrevistados responderam da mesma forma, já na faixa acima de 41 anos, a taxa é de 15%.

Daniel Brochier teme as consequências de escolhas mal pensadas

Nas ruas de Montenegro, os jovens atribuem o resultado ao desejo de viver os próximos anos em uma nação mais digna, democrática e de oportunidades. Para o estudante Daniel Brochier, 18, as motivações em entrar para a vida pública surgem a partir de constantes inquietudes. “Eu já integrei um grêmio estudantil e o que me levou a participar foram as péssimas condições da escola naquela época, era uma vergonha”, disse Daniel. “As pessoas acima dos 26 anos não irão perceber os efeitos de uma política ruim ao longo dos próximos anos como nós, que iremos viver mais que eles, por isso, precisamos nos preocupar e participar mais.”

Adnilson Machado destaca as plataformas digitais como espaços importantes para troca de informações e atuação política

O futuro é o que mais preocupa o técnico de produção Adnilson Machado, 22. “Estamos mais engajados porque temos medo do que nos espera”, revela Machado. “Eu espero viver em um lugar mais democrático”, completa.

O regime democrático atrelado à tecnologia digital é um dos motivos que explicam a inserção dos jovens no campo político. É o que aponta o jornalista e doutorando em sociologia, Rogério dos Santos. Ele destaca que as condições econômicas e a liberdade comparada às gerações anteriores resultaram no protagonismo desse grupo nas manifestações de junho de 2013, quando milhões de pessoas de todo o país foram às ruas para cobrar mudanças.

“De lá para cá, a onda de indignação, revolta e envolvimento dos jovens na vida política só cresceu. Chamados a dialogar, eles foram instados a ter opiniões. Não existe aí uma novidade. Os jovens sempre tiveram opiniões. Muitas opiniões, diga-se. A diferença crucial agora é que o que eles dizem tem muito mais peso”, explica o pesquisador. “Eles são ouvidos e exercem influência sobre a família.”

Diferentes formas de atuação

Na era da tecnologia digital, a atuação política se mostra de diferentes maneiras. Na pesquisa do Datafolha, o compartilhamento de notícias é a forma mais comum de participação, onde 53% dos entrevistados com idade entre 16 a 25 anos afirmam ter compartilhado notícias e opiniões sobre sua cidade e seu país nas redes sociais. O percentual é próximo ao da faixa etária dos 26 a 40 (52 %), já naqueles com 41 anos ou mais, o número é menor (29%).

Metade do conjunto atuante identificado na pesquisa desenvolvia práticas de transformações sociais através de ONGs e igrejas, e a outra metade é o que a pesquisa chamou de “hackers da política”, ou seja, aqueles que tentam entender o sistema para encontrar brechas e fazer mudanças. Ainda, o levantamento mostra que 77% dos brasileiros mais jovens já tiveram alguma atuação política informal, enquanto só 19% se filiaram a partidos ou participaram de campanha.

Para Adnilson Machado, as plataformas digitais se transformaram em uma importante ferramenta de expressão política e exercício da democracia. Ele conta que tem o costume de utilizar o Facebook para expressar essa visão. “Geralmente compartilho e comento algo sobre as eleições e os casos de corrupção no país”, justifica.

São essas convicções de mundo que, na visão do pesquisador Rogério Santos, justificam a importância desse movimento para o cenário brasileiro. “Podemos dizer que os jovens [a grande maioria] acreditam na própria capacidade de mudar o mundo e reconhecem o papel determinante da política no cotidiano brasileiro”, ressalta.

O Datafolha ouviu 2.086 pessoas em 129 cidades. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

Wellington Bengua ressalta a importância do debate entre os jovens

“Políticos são analógicos e a juventude digital”
Na contramão do senso comum que afirma a política como algo indiscutível, o jovem Wellington Bengua, 19, contesta a ideia. “Eu discuto e acredito que todos tinham que fazer o mesmo, afinal de contas, são nossos direitos que estão em jogo”, dispara Bengua. “Eu voto em político que defende os direitos dos pobres e, principalmente dos vendedores ambulantes que querem trabalhar, mas são impedidos.”

Milena Lopes deseja mais representatividade na política brasileira

A estudante Milena Lopes, 17, conta que participou de poucos espaços políticos na vida, porém, sempre busca se posicionar. “Eu acho que os jovens estão mais atuantes porque querem ser reconhecidos e representados, o que infelizmente não acontece”, lamenta Milena se referindo ao perfil dos políticos do Brasil.

Na visão do pesquisador em sociologia, Rogério Santos, a inquietude de Wellington e Milena tem explicação. “As agremiações partidárias e os governantes não falam a linguagem deles”, justifica o pesquisar. “Os políticos são analógicos e a juventude digital.”

Os diferentes lados da democracia

Os dados obtidos pelo Datafolha, de que um terço dos mais jovens se interessa em estar na política formal expõe outra realidade: a polarização. De um lado a negação da política, e do outro, como resultado desse cenário, os movimentos de renovação.

Para Rogério Santos, o regime democrático atrelado à tecnologia digital é decisivo para este resultado da pesquisa. Foto: arquivo pessoal

O pesquisador e jornalista Rogério Santos explica que há uma polarização assimétrica entre a “nova direita”, surgida após as manifestações de junho de 2013, e a “esquerda oficial” no Brasil. “Nos protestos, apareceu uma direita social e insurgente, que foi para as ruas em grande número para se contrapor ao status quo de um ponto de vista conservador, onde já existia no Brasil uma ‘direita residual’”, disse.

“Meu medo é que poderemos chegar a extremos sem retorno. Parece-me que os alucinados que radicalizam essa polarização sem conteúdo estão apostando na possibilidade de ferir as instituições. O Brasil tem tido crescente presença de multidões na rua e multidões violentas, como as que lincham e fazem justiça com as próprias mãos”, receia o pesquisador.

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