As lições de vida de Rufino, o Catador de Sonhos

Um exemplo nacional. Geraldo Rufino afirma que as pessoas lamentam muito e terceirizam a culpa de seus atos

A greve dos caminhoneiros que paralisou o país serviu para que outras categorias e até a população em geral chutasse o balde contra o governo, a corrupção, os impostos e até a democracia. Mas será que no meio da massa houve quem fizesse um mea-culpa e se enxergasse como parte do processo de mudança e tomasse alguma atitude pelo bem do país? Exemplo bacana de autocrítica vem de um homem que cresceu em meio ao lixo e fez das dificuldades o combustível para vencer na vida: o empresário Geraldo Rufino, 59 anos — mineiro de nascimento, paulista por adoção —, também conhecido como “Catador de Sonhos”, numa alusão à infância, quando juntou latinhas nos aterros sanitários perto de casa para sobreviver.

Dono de uma história de vida singular e também da JR Diesel, empresa de desmanche de caminhões com receita bruta anual próxima aos R$ 50 milhões, ele recentemente esteve em Porto Alegre para dar palestra no evento Tá na Mesa, da Federasul. As palavras de Rufino são daquelas verdades que, para muitos acomodados, podem doer. O brasileiro agradece pouco, lamenta muito e terceiriza a culpa, resume ele. “Mamãe sempre me ensinou que, independentemente da condição, quem deve estar disposto a mudar é você. Se tiver disposição de trabalhar, neste País só passa fome quem quiser”, apregoa.

Essa atitude proativa não vem de agora. Rufino é um otimista de carteirinha desde o início, ou seja, os tempos de pobreza, em que catava coisas no lixão para vender. “Minha vida não é boa porque arrumei alguns trocados. Ela é boa lá de trás”, conta o empresário, que vê a vida pelo ângulo oposto da maioria dos brasileiros. Em uma metáfora sobre o País, o palestrante apontou que as pessoas “olham para as fezes e esquecem do cavalo”, isto é, foca-se no que há de ruim e esquece-se o lado bom é muito maior.

A pobreza vem do pensamento das pessoas, acredita Rufino. “Esse é um estado de espírito, porque a condição material você pode mudar.” Em relação ao país — que todo mundo critica, mas poucos fazem algo para ajudar a mudá-lo —, ele é enfático: “Nosso cavalo [Brasil] está prontinho, arriado, selado, fortíssimo e gigante.” Há muita terra para plantar e alimentar o mundo, pois aqui tem chuva e sol em abundância. Se falta comida na mesa de alguém, coisa que aconteceu com ele na infância, basta procurar uma feira de hortifruti e aproveitar os restos.

A administradora montenegrina Elaine de Paula afirma que a palestra na Federasul foi muito boa. “Um homem simples, humilde, de valores familiares e com um bom humor surpreendente, que caiu e levantou tantas vezes quanto foram necessárias. Contou sua história de superação. Teve que trabalhar muito cedo, como catador de lixo. Hoje, é um empresário de sucesso”, enaltece. Assistir Rufino foi muito gratificante e de grande aprendizado, segundo ela.

Reclame menos e pare de terceirizar a culpa

Empresário destaca que, para começar a mudar o país, as pessoas não podem trocar voto por poste ou calçada

Geraldo Rufino enfatizou que o brasileiro precisa lutar por si, sem esperar migalhas, principalmente do poder público. “Cabe ao povo agradecer mais, reclamar menos e parar de terceirizar a culpa de seus erros.” As pessoas, sem engajamento político e sem interesse pela política, em nada colaboram para colocar o país nos eixos. O governo, que segundo ele “somos todos nós”, deve parar de atrapalhar o cidadão, o que se faz com a diminuição da burocracia e o fortalecimento do empreendedorismo.

O paulista tem até uma receita bem simples para quem pensa em começar um negócio, mas não tem grana para investir. A saída é arrumar um emprego para que você possa empreender no CNJP do patrão e, com isso, colocar na cabeça que as conquistas na vida vêm aos poucos, degrau por degrau. “Empreender é um jeito de pensar. Se você já começar pensando em CLT, não vai crescer. Você tem 24 horas por dia e só quer trabalhar oito? Igualdade se busca através da produtividade. Trabalhar é o melhor remédio para o nosso país.”

Crítico, o empresário afirma não estar entre aqueles que jogam sobre a classe política a culpa pela estagnação do Brasil. “[Essa situação] é culpa nossa, da omissão dos que se dizem bons”, salienta. Presidente do Movimento Brasil 200 — movimento empresarial que defende ampla reforma no País —, ele critica o excesso de assistencialismo. Diz que a cultura convence as pessoas de que elas são “menos” somente porque frequentaram escola pública ou porque são descendentes de africanos.

Para o Catador de Sonhos, iniciativas como o Dia da Consciência Negra servem para continuar a convencer as pessoas dessa raça que elas são inferiores. As políticas de cotas raciais e de assistencialismo, na visão dele, não colaboram para o desenvolvimento pessoal e profissional. “Se você começa a acreditar nisso, não sai do lugar. Não posso achar que o cara de Harvard é mais inteligente que o cara daqui, da escola pública. Quem falou isso?”, questiona.

O poder do voto
O País está a quatro meses de eleições gerais, ou seja, é mais uma oportunidade para os brasileiros decidirem o futuro com responsabilidade, honestidade e igualdade. A força do voto, na opinião de Geraldo Rufino, é imensa, mas pouca gente compreende a real importância desse direito. “A comunidade de periferia precisa de um estímulo à sua autoestima, precisa ter noção de empreendedorismo e de ferramentas que o permitam começar do zero. Essas pessoas precisam ser um bom exemplo e tudo começa por assumir responsabilidades. Mas temos que lembrá-las que uma das principais ferramentas para a busca da igualdade, antes da produtividade, é a força do voto, por isso não se pode trocá-lo por uma calçada ou um poste”, alerta.

O assistencialismo é como uma faca de dois gumes, porque não ajuda as pessoas a saírem das condições em que se encontram. “A melhor contribuição social que eu posso dar é levar orientação, motivação, bons exemplos, porque se eu levar alguma coisa para beber, comer ou dormir, amanhã terei que levar de novo. Mas se levar para ele uma mudança no jeito de pensar, esse cara vai se fortalecer e descobrir a força que ele tem. Aí sim a gente começa a criar uma estrutura de base que vai mudar o país.”

Você está no fundo do poço? Para o Catador de Sonhos, não tem o menor problema. É o melhor lugar para você recomeçar, diz ele. Neste caso, porém, é preciso que você reconheça que desceu em função de suas próprias atitudes, e não por que alguém lhe empurrou. “Nós é que criamos os problemas. A possibilidade de resolvê-los está em suas mãos.”

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