ENFRENTANDO PRÉ-CONCEITOS. Penitenciária de Montenegro completa 20 anos
A Penitenciária Modulada Estadual de Montenegro Agente Jair Fiorim (PMEM) foi instalada na Estrada Major Carpes, na localidade de Pesqueiro, no dia 16 de novembro de 2001, e desde então passou a gerar questionamentos, por parte dos munícipes, sobre os reflexos que sua permanência poderia gerar à cidade. Vinte anos após sua chegada, a casa prisional ainda divide opiniões e apresenta problemas como a superlotação e a falta de esgotamento sanitário. Contudo, projetos voltados à humanização da pena tentam melhorar as condições de estada no local.
Em entrevista ao programa Estúdio Ibiá, na Rádio Ibiá Web, nessa quarta-feira, dia 1º, o diretor da casa prisional, Edson Neves, falou sobre questões que marcam as duas décadas da PMEM. A pauta teve ainda a contribuição do delegado André Roese, titular da 1ª Delegacia de Polícia de Montenegro, do representante da Pastoral Carcerária da Igreja Católica, padre João Vitor Freitas, e do vice-presidente do Conselho da Comunidade para Assistência aos Presídios de Montenegro, Florêncio Castilhos.
O problema da superlotação na Modulada é antigo. Quando inaugurada, a casa prisional tinha capacidade para receber cerca de 500 detentos – e contava com condição de engenharia para expandir para até 976 pessoas – o que levou a colocação de mais camas nas celas. Contudo, diante da lotação de outras cadeias do Estado, a PMEM precisou “dar um jeitinho” de acomodar um número que já chega a ser mais de duas vezes maior a sua capacidade inicial. Atualmente, conforme o diretor da instituição, mais de 1.760 homens cumprem pena no local.
Devido a lotação, o presídio não está recebendo novos detentos, situação essa que gera reflexos no trabalho da Polícia Civil. Isso por que é investido mais combustível e tempo para conduzir presos até outras penitenciárias da região metropolitana. Conforme o delegado André, a gasolina já passou a ser poupada, visando evitar o desabastecimento das viaturas. “Não temos previsão de repasse de combustível este mês. É importante que a Modulada volte a receber presos. A facilidade do deslocamento do preso à penitenciária é um ganho muito grande, principalmente, para a Delegacia de Pronto Atendimento”, diz o delegado. Edson explica que há um planejamento para que a PMEM volte a receber detentos, mas não fala em data para que isso ocorra.
Modelo humanizado de gestão
Para o diretor Edson Neves, muitos homens são marginalizados por falha nas políticas públicas. Lacunas na área da educação e desenvolvimento social podem impulsionar ao delito. Conforme Edson, a Modulada cumpre um papel social ao tentar resgatar o lado honesto dos apenados e mostrar-lhes um caminho diferente a ser seguido fora dos muros da prisão.
O conceito de prestação de serviço humanizado ganha espaço na Penitenciária. Através do Modelo de Gerenciamento Sustentável para o Sistema Prisional, idealizado e formatado pela direção e por servidores da Modulada, os detentos do regime fechado têm melhor aproveitamento de tempo e de suas habilidades. Através de termos de ação conjunta com empresas, mais de 30% da população carcerária desenvolve algum tipo de atividade laboral. Além disso, todo o trabalho de manutenção e refeições da PMEM é feito pelos detentos.
“A Penitenciária é importante para Montenegro e para o Estado, principalmente, pelo trabalho de ressocialização, porque isso vai diminuir o giro da criminalidade daqueles que voltam ao crime por que não encontram condições de vida em sociedade”, comenta Edson.
“Nem todo o criminoso é bandido”
Para o vice-presidente do Conselho da Comunidade para Assistência aos Presídios de Montenegro, Florêncio Castilhos, a forma como a sociedade vê os privados de liberdade interfere diretamente no futuro que esses indivíduos terão após pagarem pelo erro cometido. “Se o apenado não for recebido pela sociedade ele vai cometer novo delito”, acredita Florêncio.
Através de um projeto chamado “Saber nunca é demais”, Florêncio leva oportunidade de novos conhecimentos aos apenados dos presídios de Montenegro. “Há mais de cinco anos venho fazendo isso. Tenho ex-alunos que estão empregados. Muitos me criticaram por dar aula para presos. As pessoas precisam lembrar que nem todo o criminoso é bandido, muitos foram parar na cadeia por falta de oportunidades”, acrescenta. “Para as famílias, é muito importante ter o presídio perto da cidade”.
“A comunidade deve questionar por que existe o presídio”
Para o padre João Vitor Freitas, da Pastoral Carcerária, é preciso parar de tentar separar as pessoas por “rótulos”. “Não existe nós e eles. Existe a comunidade, e todos somos essa comunidade. A Pastoral Carcerária vê os detentos como pessoas, acho lamentável a sociedade vê-los como um problema”, opina o vigário.
João Vitor propõe que antes de julgar os apenados, os cidadãos reflitam sobre algumas questões. “Quem produz a população carcerária é a sociedade, quando não dá condições à essas pessoas. É interessante a comunidade se questionar por que existe o presídio. Que bom que temos penitenciária Montenegro”, diz.
Para diminuir a necessidade de vagas nas cadeias, o padre sugere mais investimentos em educação. Para ele o problema é estrutural. “Na Pastoral trabalhamos muito com a Justiça Restaurativa, percebemos que a sociedade não faz uma auto-crítica. Fazemos esse trabalho de conscientização da comunidade por que nós cremos que é possível mudar,” sublinha o religioso.“Muitas vezes, as pessoas esquecem que Jesus foi considerado bandido e foi encarcerado. Se todos somos a imagem e semelhança Divina, todos devemos ter oportunidades.”
Superlotação, risco de fuga e saneamento
O diretor da Penitenciária instalada no Município de Montenegro, Edson Neves, afirma que não há motivos para temer fugas da casa prisional. Segundo ele, faz pelo menos dois anos que não é registrada nenhuma tentativa de evasão no local.
“A penitenciária, em relação ao nível de segurança, é de média complexidade. E, isso se deve ao o trabalho conjunto feito com outros entes da Segurança Pública, como Polícia Civil e Brigada Militar”, acrescenta o diretor.
O delegado André Roese comenta que penitenciárias de menor porte, como a Modulada, são opções para cumprimento de penas decorrentes de crimes nas comunidades locais. Com isso, evita-se que as famílias precisem se deslocar até cidades mais distantes para visitas. “Para a comunidade, é grande a importância que os apenados continuem em suas cidades”, diz André.
Em relação aos problemas ocasionados pela falta de esgotamento sanitário, uma estação de tratamento de esgoto está em fase de implantação na PMEM. Enquanto não é finalizada, o esgoto é recolhido e transportado através de caminhões até uma estação de recolhimento da região metropolitana de Porto Alegre.