Volta às aulas exige olhar atento para a saúde mental dos jovens

Agora está mais perto. Acabado o período de férias, a volta às aulas bate à porta para alguns e, para outros, já chegou. Mesmo passado bons meses do pico da pandemia, muitos estudantes de diversas idades não se adaptaram às aulas on-line, fazendo com que procrastinassem e se sentissem desmotivados para dar continuidade ao desenvolvimento escolar. Segundo Giovane dos Santos, psicólogo do Hospital Sagrada Família, em São Sebastião do Caí, como consequência, se estabeleceram altos índices de sofrimento emocional, em muitos casos desencadeando ou potencializando transtornos, como quadros somáticos, ataques de pânico, hipocondria, depressão, isolamento e ansiedade generalizada.

Giovane dos Santos, psicólogo do Hospital Sagrada Família. Foto: arquivo pessoal

Uma pesquisa do Instituto Ayrton Senna apontou que 70% dos estudantes relataram quadros de depressão ou ansiedade no retorno às aulas. O estudo ainda mostrou que na retomada presencial das atividades escolares pós-pandemia, 33% do corpo discente teve dificuldades de concentração, 18,8% se sentiram totalmente esgotados e sob pressão, 18,1% disseram perder o sono por excesso de preocupações, 13,6% apresentaram dificuldade de autoconfiança e um terço dos alunos se sentiram pouquíssimo focados. “Estes são traumas profundos e sofrimentos emocionais que vão permanecer por alguns anos, precisam ser superados aos poucos e mesmo após algum tempo, ainda fazem parte da vida dos estudantes, sendo imprescindível um olhar atento ao estado psicológico dos mesmos”, ressalta Giovane.

Com o clima de volta às aulas, as instituições de ensino podem ajudar a recuperar a saúde mental dos jovens de todas as idades. Para Giovane, este acolhimento emocional é fundamental nas instituições em todos os momentos e, principalmente durante alguns anos após a pandemia. “A escola não é apenas um espaço para aprender conteúdos teóricos, mas também para acolher as demandas e necessidades emocionais dos alunos”, aponta. Para isso, devem oferecer um espaço de escuta e suporte emocional, buscando a realização de atividades que possam restabelecer a segurança e a tranquilidade dos alunos, ajudando-os na superação de medos, lutos e dificuldades gerais. “O estímulo ao desenvolvimento de competências e habilidades sociais também é muito importante para o resgate da vida social”, acrescenta o psicólogo.

Como os estudantes podem minimizar o “caos”?
Os estudantes de todas as idades podem tentar minimizar as “sequelas” deixadas pelo isolamento social quando se trata do desenvolvimento escolar. Para Giovane, é necessário que os estudantes sempre busquem informações adequadas, visando eliminar fake news e crenças irreais sobre a pandemia e suas consequências. “Para uma melhor saúde mental, também é importante buscarem alternativas de lazer, fazerem algo que gostem, como brincadeiras, estar junto às pessoas queridas, restabelecendo os vínculos sociais, praticarem alguma atividade física, tentar terem um sono regular e uma boa alimentação”, assinala. Outra dica de ouro é a interação com os colegas de classe, amigos, professores e familiares sobre qualquer dificuldade emocional. Assim, fica mais fácil o acolhimento, escuta, orientação e até mesmo encaminhamento psicológico, caso seja necessário.

A escola deve ser local para também acolher as demandas e necessidades emocionais dos alunos. Foto: arquivo Jornal Ibiá

Apoio familiar alinhado ao escolar é fundamental
Para os estudantes de menor idade, as consequências de tanto tempo em casa podem ser mais agravantes. É nos primeiros anos na escola em que a criança tem a oportunidade de sair do núcleo familiar onde inicialmente estava convivendo. Passa a experimentar o convívio social, com conflitos, aprendendo a manejar as emoções e lidar com angústias e diferenças. Giovane também destaca que é nestes primeiros anos que ocorre o desenvolvimento emocional e motor, além da alfabetização e outras tantas aprendizagens. Tudo isso foi atrasado pela pandemia.

Porém, segundo ele, através de um ensino sistemático, com constância e regularidade bem como o comprometimento e participação da família, é possível recuperar gradualmente o funcionamento deste sistema. “A família tem papel fundamental na continuidade da vida escolar e na superação gradual das dificuldades causadas pela pandemia. Escola e família precisam estar alinhadas para que os alunos consigam ter um bom desenvolvimento emocional. O diálogo e o acolhimento das dificuldades dos estudantes são muito importantes”, pontua.

Quando a criança se sente ouvida e acolhida, se sente mais confiante e segura. Assim, Giovane ressalta a importância da conversa sobre regras, por exemplo. “Oriente e passe confiança para que consigam retomar as atividades escolares da forma mais tranquila possível, superando os medos, dificuldades e desafios”, afirma. Ele destaca que os pais devem sempre reforçar os laços com seus filhos, encorajando, acompanhando seu processo de aprendizagem e aconselhando sobre as dificuldades encontradas nos processos, estando engajados nas atividades escolares. “Também devem estar atentos às dificuldades de aprendizagem, ao comportamento, emoções, sentimentos, medos e sofrimentos dos filhos, auxiliando como puderem e buscando diálogo com a escola e ajuda profissional se for necessário”, complementa.

Inteligência emocional ajuda na resolução de conflitos
Os traumas causados pela pandemia podem potencializar sentimentos como intolerância, impaciência, irritabilidade, isolamento, tristeza, entre outros, o que segundo o psicólogo Giovane, gera mais conflitos interpessoais. “Desenvolver a inteligência emocional é fundamental para que os alunos possam aprender a lidar com os conflitos e dificuldades e incertezas da vida, desenvolver a empatia, bem como gerenciar os pensamentos negativos e comportamentos que não sejam saudáveis, proporcionando que lidem bem com as emoções e sentimentos”, explica.

A pandemia trouxe ainda mais à tona a necessidade de os alunos terem uma educação socioemocional. Desta forma, Giovane afirma que pode ser importante proporcionar atividades de entrosamento e integração, como dinâmicas de grupo e o estabelecimento de diálogo aberto e acolhedor. “O espaço de comunicação e escuta é muito importante para a expressão e gerenciamento de conflitos no ambiente escolar. A escola é onde o aluno precisa aprender a conviver, respeitar e tolerar as diferenças, visando um melhor controle das emoções.”

As famílias e as instituições de ensino podem ajudar a garantir a saúde mental dos jovens de todas as idades durante o processo de volta às aulas. foto: freepik

O desenvolvimento da inteligência emocional pode ser estimulado com atividades de integração dentro do ambiente escolar, pois facilitam a constituição da afetividade e a construção de vínculos. “Os laços consistentes são desenvolvidos através de atividades que proporcionem o reconhecimento dos pares e valorização das boas práticas com o próximo. O projeto de vida também auxilia no autoconhecimento, bem como na tomada de decisões, inserção social e a melhor forma de agir em sociedade. Todos esses estímulos podem auxiliar os alunos no desenvolvimento da inteligência emocional, algo muito importante na vida escolar e fora dela”, conclui o psicólogo.

Além disso, o desenvolvimento da inteligência emocional proporciona uma melhor habilidade em lidar com os colegas, principalmente pós pandemia quando os relacionamentos precisaram ser adaptados ao isolamento. Por isso, Giovane afirma que é necessário também observar quais outros fatores costumam contribuir para que aconteçam conflitos nos relacionamentos interpessoais entre os alunos.

Saúde física precisa estar em dia
Lembre-se que a saúde física também é importante neste momento e o corpo sinaliza quando a mente não vai bem. Por isso, uma noite de insônia ou quando se acorda muito antes do que está previsto, falta de apetite ou apetite descontrolado e desânimo em relação às atividades que antes geravam prazer são alguns dos sinais que podem indicar que a mente não está indo como deveria. Sendo assim, manter uma alimentação saudável, sono em dia e dentro do recomendado de oito horas mínimas e até mesmo tirar um tempo para práticas como meditação são essenciais para manter o equilíbrio entre saúde física e mental.

No período de pandemia, os estudantes necessariamente precisaram se aproximar ainda mais das telas. Computadores, celulares e notebooks eram não só a única maneira de tentar manter os estudos em dia como também os momentos de lazer. Uma boa dica é utilizar os momentos de lazer para outras atividades que lhe tragam prazer, podendo ser a prática de alguma atividade física, encontros com os colegas, leitura, entre outros. O importante é tirar um tempo longe da tecnologia para distrair e descansar a mente.

Vacinação é sinônimo de segurança
Ter vacinação em dia é sinônimo de segurança dentro do ambiente escolar e para jovens de todas as idades. A vacinação garante proteção para quem já garantiu as doses e também para aqueles que ainda não podem ser vacinados, como bebês ou pessoas com sistema imunológico debilitados. Esta é a forma mais eficaz de prevenir a propagação de doenças e minimizando o risco de, novamente, as instituições de ensino precisarem fechar suas portas. Assim, é de extrema importância que os pais e responsáveis garantam que as crianças estejam devidamente vacinadas antes de retornarem ao período letivo.

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