Especial. Marcelo Garcia e Júlio Cézar de Vargas, o “Julica”, dois personagens do futebol na cidade contam suas histórias e relembram o início da trajetória no esporte
Futebol onze em Montenegro praticamente inexiste há vários anos. Campeonatos de futsal também não acontecem no município há um bom tempo. Apesar disso, a cidade ainda conta com muitos apaixonados pelo esporte. Marcelo Garcia e Júlio Cézar de Vargas, o Julica, são exemplos de paixão e perseverança pelo futebol. Eles empilham conquistas e histórias em suas trajetórias, dentro e fora das quatro linhas.
Natural de Rio Grande, Marcelo Garcia, atualmente com 45 anos, veio para Montenegro em 2005. Em sua cidade-natal, defendia o time Garrafinha e jogava futebol sete, onze, futsal e areia, em muitas ocasiões de pés descalços, de acordo com ele. “Desde pequeno jogava bola lá em Rio Grande. Não tinha vídeo-game na época, o primeiro brinquedo que ganhávamos era uma bola”, conta.
Um ano após chegar em Montenegro, começou a jogar no Grêmio Gaúcho, pelo time 100% Amigos. Marcelo respira futebol. Três anos depois, resolveu criar, ao lado de dois amigos, o Chelsea. Em 2010, assumiu o cargo de treinador e foi campeão da Série Prata do Grêmio Gaúcho com sua equipe recém-fundada. No ano seguinte, o Chelsea de Marcelo ficou vice-campeão da Série Ouro no clube.
Na sequência, algumas divergências fizeram com que Marcelo retirasse o Chelsea do campeonato de futebol sete do Grêmio Gaúcho. De lá, partiu para o Cantegril, onde seu time também teve um início meteórico. Seu amigo Alexandre Dias, o Neni, outra figura futebolística muito conhecida em Montenegro, comandava o Silver Bar, equipe em que muitos atletas treinados por Marcelo no Grêmio Gaúcho, atuavam.
Foi aí que Marcelo resolveu firmar uma parceria com Neni, e formou-se o Silver Bar/Chelsea. Em 2013, foram campeões da Série B e vice-campeões da Série A no Cantegril, de forma invicta nas duas campanhas. No ano seguinte, a equipe já passou a se chamar somente Chelsea, assim como era no Grêmio Gaúcho, e levantou a taça do Torneio de Verão logo nos primeiros meses do ano. “O futebol entra no sangue e vicia. Quando não tem campeonato, a gente chega a ficar nervoso”, relata Marcelo.
Com três filhos também apaixonados pelo esporte, o treinador do Chelsea formou uma verdadeira família dentro das quatro linhas. Atualmente, a equipe disputa torneios de futebol sete, futebol de areia e futsal. “Nada se decide sozinho, por isso divido as atenções com o Neni. Onde está o Chelsea, estamos eu e ele”, comenta Marcelo, sobre a parceria com Neni no comando técnico da equipe.
No segundo semestre de 2016, veio a maior conquista da dupla no clube. Com uma vitória sobre a tradicional Brenner, o Chelsea comemorou seu primeiro título da Série A no Cantegril. “Para nós, foi uma das principais conquistas, junto com a Série Prata do Grêmio Gaúcho, que vencemos com a gurizada que tinha 14, 15 anos na época”, ressalta.
Mesmo com cinco cirurgias feitas no joelho, o treinador do Chelsea não abre mão de jogar futebol. Neste começo de 2018, Marcelo vem atuando pela sua equipe na Copa Intermunicipal de Futebol de Areia de Maratá, onde o Chelsea defende o título do veterano e vem fazendo bonito até o momento.
Por falar em campeonatos fora da cidade, esse é um dos motivos que entristece Marcelo em Montenegro. “Esse é o mal da cidade, não ter campeonatos de futsal, por exemplo. Vemos os municípios ao lado fazendo festa, com ginásios lotados, e nós não temos nada. Isso chateia. Temos que sair para disputar os torneios. E, além de não termos campeonatos, não se vê ninguém tentando colocar em prática”, lamenta.
No mesmo caminho: espelho, amizades e a marca na pele
Em seus 13 anos morando no Vale do Caí, Marcelo Garcia já conheceu diversas pessoas ligadas ao futebol e fez inúmeras amizades. Um dos grandes amigos do treinador do Chelsea é Júlio Cézar de Vargas, o Julica, que comanda o Expulsos do Bar no Grêmio Gaúcho. Além de amigo, Marcelo considera Julica um exemplo a ser seguido no futebol montenegrino. “Algumas coisas me espelho nele, pela entrega ao time, por não desistir nunca. É um cara a ser admirado”, destaca.
A amizade entre os dois treinadores vai muito além das quatro linhas, como pontua o comandante do Chelsea. “Ele reinou dentro do Grêmio Gaúcho por vários anos. Tem o símbolo do nosso time na camiseta deles e temos o símbolo deles na nossa. Famílias se uniram”, enfatiza.
Dentro de campo, os dois comandantes se ajudam, emprestando jogadores para os torneios e assumindo o comando técnico quando um deles está impossibilitado. Além da paixão pelo futebol, Marcelo e Julica também têm em comum uma marca na pele. Os dois treinadores fizeram uma tatuagem do símbolo de seus times. Marcelo realizou o procedimento recentemente, em novembro do ano passado. Já Julica tem o escudo do Expulsos do Bar tatuado em sua perna há muitos anos. É a única tatuagem que ambos possuem.
Quando o assunto é decepções na carreira, a resposta dos dois é rigorosamente a mesma. “Não dá para agradar a todos. Às vezes, depositamos a amizade em alguém e ocorrem sacanagens”, frisa Marcelo. “A maior decepção é tu trazer um amigo para o grupo, acolher esta pessoa e ele te trair, falar mal de ti pelas costas”, acrescenta Julica.
Apesar disso, o que fica para o comandante do Chelsea é a parceria, dentro e fora de campo. “A amizade e o churrasco prevalecem. A gravação do DVD do nosso time me marcou muito. O choro do nosso goleiro, quando conquistamos o título no Cantegril em 2016, é uma imagem que fica na cabeça. É muito difícil ser campeão no clube. Ali, vimos que somos uma família”, completa Marcelo.
Trajetória no esporte: os títulos e as concentrações antes dos jogos
Além de treinador, Julica é gestor, roupeiro, psicólogo e preparador do Expulsos. Um apaixonado pelo time. O primeiro título conquistado pela equipe no Grêmio Gaúcho foi sobre o Hooligans, que é o atual Ellite, principal rival do Expulsos no clube. Após isso, o time ainda levantou mais cinco taças com a nomenclatura Expulsos do Bar e ainda venceu o campeonato do clube duas vezes com o nome de BRM.
Contudo, para Julica, nenhum título foi tão emblemático quanto o primeiro campeonato noturno realizado no clube, no campo sintético, há 11 anos. “Começamos perdendo por 2 a 0, viramos ainda no primeiro tempo e vencemos por 12 a 4 o Eu Q Sei, outro time muito qualificado que enfrentamos. Sem inferiorizar os outros campeonatos que vencemos, mas este foi o título mais diferenciado. Nunca vi isso aconteces nos clubes”, enaltece.
Naquela época, Julica preparava o time para a partida com a tradicional “concentração” e mexia com o psicológico dos atletas nas palestras minutos antes dos jogos. “Reunia todos do grupo, fazia preleção e mostrava vídeos para os atletas. Mas o que mexeu demais foi a mãe de um atleta participar de uma das concentrações estando mal de saúde. Aquilo mexeu com todos”, recorda o treinador.
Sobre seu temperamento na beirada do campo, o personagem principal do Expulsos do Bar admite que incomoda bastante, mas garante que todos gostariam de tê-lo no time. “Sou muito chato, talvez o pior na beira do campo. Vou brigar até o fim pela minha equipe”, conclui.
A relação entre o Expulsos do Bar e o Carnaval
O montenegrino Júlio Cézar de Vargas, mais conhecido como Julica, 52 anos, comanda um dos times mais vitoriosos do futebol sete da cidade. Com oito títulos do campeonato de futebol sete do Grêmio Gaúcho e um dos únicos times do clube a nunca ser rebaixado, o Expulsos do Bar foi criado a partir de um bloco de Carnaval, no ano de 1995, segundo Julica.
No entanto, o comandante da equipe deu seus primeiros passos no futebol como atleta, jogando nos times de futebol onze da cidade. “Comecei jogando. Na época, o treinador levava foices para nós roçarmos o campo antes dos treinos”, relembra. Depois de jogar em praticamente todos os campos do município, teve uma nova ideia.
Em uma das festas de Carnaval da cidade na década de 90, criou um bloco, uniu muitas pessoas e resolveu criar o Expulsos do Bar.
O nome do time, como é de se imaginar, surgiu a partir de um fato curioso. “Com 15, 16 anos, nos reuníamos para jogar. Depois, íamos em um barzinho para tomar refrigerante. Como tínhamos pouco dinheiro, fazíamos aquele litrão durar o máximo. Porém, após um tempo, o dono do estabelecimento sempre pedia para sairmos, pois ele tinha que dar atenção aos clientes. Por isso, colocamos o nome de Expulsos do Bar”, conta.
O início da participação do Expulsos no campeonato do Grêmio Gaúcho já deu mostras do que seria a equipe nos anos seguintes. Logo no primeiro ano, a equipe foi vice-campeã, perdendo por escore mínimo para o Locadora Anderson que, na época, era uma grande equipe. “Neste primeiro campeonato, jogamos com um fardamento emprestado. Depois, fizemos uniforme e pegamos gosto”, diz Julica.
Como grande parte do elenco do Expulsos morava na Timbaúva, o grupo estava sempre reunido, como uma verdadeira família. “No Carnaval, no shopping, em jantas, iam todos juntos. Já fizemos meias soquete, bermudas, camisetas, regatas, chinelos, cuias, bombas e muitos outros acessórios com o escudo do Expulsos”, ressalta o comandante da equipe.