Vôlei. Personagens da equipe que colocou Montenegro no cenário nacional relembram histórias. Livro que conta a trajetória será lançado nesta sexta-feira
O nome do livro já diz tudo: “Vôlei em Montenegro: uma história de paixão e glórias”. Um projeto iniciado do zero, que no começo não permitia imaginar a dimensão atingida poucos anos depois, transformou-se em um livro. Escrita pela jornalista Cláudia Coutinho, a obra que conta a trajetória do vitorioso vôlei montenegrino será lançada nesta sexta-feira, às 20h, em evento para convidados na sede social do Clube Riograndense.
Reunir as memórias daquele projeto histórico era um sonho antigo de um grupo de ex-jogadores e dirigentes que, durante vários anos, dedicaram-se às equipes que vestiram as camisas do Riograndense e da Frangosul. Em 2014, ocorreu um talkshow em Montenegro sobre o vôlei, e vários personagens daquele time vencedor participaram. Foi aí que surgiu a ideia de eternizar aquela rica história.
Como repórter, editora de esportes ou assessora de imprensa da equipe, Cláudia Coutinho acompanhou de perto praticamente todas as fases do projeto, desde o domínio do Riograndense no Estado, até o título da primeira divisão da Superliga Masculina de Vôlei na temporada 1994/1995 (parceria da Frangosul com a Ginástica Novo Hamburgo). No início de 2015, a jornalista foi convidada para escrever a obra. “Fiquei muito contente com o convite. Tivemos reuniões, montamos um projeto e começamos a trabalhar em cima do livro. Me convidaram pois são 35 anos de dedicação, desde 1982 vivencio o voleibol e acompanhei toda a trajetória da equipe comandada por Cilon Orth”, comenta.
Natural de Porto Alegre, Cláudia veio a Montenegro várias vezes a fim de realizar pesquisas e entrevistas para a produção do livro. O pontapé inicial na obra se deu em maio de 2015, viabilizado pela Lei Federal de Incentivo à Cultura/Lei Rouanet, com patrocínio do Grupo Vibra, de Montenegro.
“Levei cerca de um ano e meio para colher todas as informações necessárias e escrever o livro. Comecei a escrevê-lo em junho do ano passado e mexi nele até quando pude, sempre aprimorando cada detalhe. Fiz pesquisas em arquivos de Montenegro, Porto Alegre e na Federação Gaúcha de Vôlei. Ao todo, foram 22 entrevistas e mais de 20 horas de gravação”, ressalta a autora.
Satisfeita com o resultado final, a porto-alegrense considerou um grande desafio contar a trajetória de um dos projetos mais vitoriosos do esporte no Rio Grande do Sul. “É uma história muito grande e fez parte da minha trajetória profissional, por isso a motivação é total. Viver esse momento e contar isso é demais. Além de ser um grande desafio, registrar essa trajetória é uma grande responsabilidade. O vôlei gaúcho nunca tinha chegado tão longe. O voleibol montenegrino colocou o Estado no cenário nacional. Sempre levei este livro como uma grande reportagem. Nele, reunimos a história de vários personagens. Todo o trabalho valeu a pena”, enfatiza.
“Um dos maiores troféus da minha vida”, diz Cilon Orth sobre o livro
Principal responsável pelo sucesso de Riograndense e da Frangosul nas décadas de 1980 e 1990, o professor Cilon Renato Orth recebeu com surpresa a notícia de que seria produzido um livro sobre a trajetória da vitoriosa equipe treinada por ele durante anos e não esconde a felicidade. “Nunca esperava isso. O momento chegou, e é muito bom, muito bacana. A família toda está contente. Sem dúvidas, é um dos maiores troféus da minha vida, tínhamos perdido as esperanças”, revela.
Ao lado de sua esposa Carmen Orth, que por sinal conheceu por causa do voleibol, quando era professor da Escola Jacob Renner, Cilon está sempre atento aos jogos de vôlei na televisão e conta que mantém contato com vários atletas e dirigentes da época memorável. “Telefonamos, marcamos encontros com quem mora aqui”, frisa.
O projeto iniciado nas escolas do município do Vale do Caí no final da década de 1960, que levou à formação da equipe que ficou entre os quatro melhores times do mundo na temporada 1991/1992, sempre teve Cilon e seu irmão Celso Orth como protagonistas. Entretanto, o Professor Cilon, como era chamado por todos, enaltece a participação da população montenegrina nas conquistas. “Enchemos 11 ônibus para Novo Hamburgo ainda quando éramos um time amador. Era bonito de se ver. Quando jogávamos no ginásio do Taninão, fazíamos daquilo uma loucura, era um bafo na nuca dos adversários”, salienta.
Um dos principais momentos para Cilon foi a conquista do campeonato gaúcho sobre a Sogipa, em 81/82. “A final foi no Grêmio Náutico União, contra a Sogipa, nosso principal rival. Tinha a torcida do Inter de um lado, do Grêmio no outro, e a nossa no meio delas, e fizemos mais barulho. Essa é a minha principal lembrança”, afirma.
Com 72 anos, Cilon ressalta que apesar de sua vida girar em torno do voleibol, nunca praticou o esporte, a não ser de brincadeira. “É só falar em voleibol que fico arrepiado. Nos colégios, lembro que os alunos preferiam jogar vôlei a futebol. A maioria do pessoal da cidade que gosta de vôlei hoje é por incentivo daquela época. Eu jogava futebol no Ensino Fundamental, mas sempre gostei de vôlei, e a paixão pelo esporte aumentou de vez na faculdade”, completa.
Se Cilon não foi jogador de vôlei, seu filho foi. Jefferson Orth, o Jeffe, aposentou-se das quadras ano passado, após defender o Canoas Vôlei por cinco anos, disputando a Superliga Masculina de Vôlei, principal competição nacional. Pequeno quando o pai já era ídolo da população montenegrina, Jeffe também reverencia o apoio da torcida nos jogos. “Lembro que era um projeto amador, e que deu certo. Era algo muito família, por conta das amizades. A população abraçou e ajudou muito. O ginásio estava sempre cheio”, enfatiza.
Adriano Oliveira: de gandula a diretor da equipe
Presente em todas as etapas do livro, Adriano Oliveira, 58 anos, teve papel fundamental na construção do time que ficou entre os melhores do Brasil por seis temporadas seguidas (de 1986 a 1992). Porém, devido a uma poliomielite diagnosticada com 15 meses de vida, nunca pode praticar o esporte pelo qual se apaixonou. Sua colaboração se deu fora das quadras.
Aos 13 anos, Adriano iniciou como gandula nos treinamentos e partidas do Riograndense, e conta como era seu salário naquela época. “Eu estava sempre presente nos treinos e jogos. Meu salário era por saque errado. Recebia 10 centavos por erro, então de certa forma tinha que torcer para eles errarem. E isso era uma forma de incentivo para os jogadores não errarem, já que ninguém queria dar R$ 0,10 para o gandula”, relembra.
Para Adriano, a época é resumida em histórias contadas, amizades feitas e obviamente resultados obtidos. Depois de gandula, ele foi técnico das categorias de base do Riograndense, em 1984, comandando de graça as equipes mirim e infantil. Antes, viu de perto a conquista do bicampeonato gaúcho do Riograndense, em 1981 e 1982.
Em outubro de 1985, participou da reunião em que ficou decidido tornar a equipe montenegrina profissional, já como Associação Atlética Frangosul. Promovido a supervisor/diretor do time, Adriano buscou reforços para a disputa do campeonato estadual e também do nacional. O início do trabalho foi logo em janeiro e os frutos colhidos na sequência, com o título gaúcho e o 6° lugar no campeonato brasileiro. Mas o sucesso da equipe, como todos sabem, não parou por aí. “Enquanto houve Frangosul, fomos campeões estaduais. Foram seis temporadas seguidas conquistando o título. Montenegro era conhecida como a capital gaúcha do vôlei”, destaca.
Além dos seis títulos estaduais consecutivos entre 86 e 92, a Frangosul conquistou dois vice-campeonatos brasileiros, um terceiro e um quarto lugares, além de ficar três vezes na sexta posição. Porém, a melhor lembrança para Adriano não foi nenhum troféu. “Minha melhor lembrança é como ‘catador de bola’ (gandula). Foi isso que me levou a chegar a diretor. Me apaixonei por um esporte que nunca poderia praticar.”
Ex-jogador destaca a força da torcida
Nas décadas de 1980 e 1990, Montenegro respirava voleibol. Prova disso se via nos ginásios da cidade em que Riograndense e posteriormente Frangosul jogavam. Atacante de entrada de rede da equipe no início do projeto, Luiz Fernando de Oliveira, hoje com 55 anos, reforça o apoio do público nas partidas do time. “O clima era algo único. Nossos jogos geralmente eram nos sábados, com os treinos nas segundas, quartas e sextas. Os torcedores nos abordavam durante a semana, perguntavam sobre os jogos e nos motivavam para as partidas seguintes. A torcida sempre enchia o ginásio e jogava junto. Jogar em casa era uma fortaleza para nós”, diz.
O ex-atacante lembra as dificuldades enfrentadas nos primeiros anos do projeto. “Quando ainda era amador, não recebíamos nada. O time recebia verba do Riograndense, da Prefeitura e promovia ‘vaquinhas’ para locar ônibus a fim de jogar em outras cidades. O patrocínio era do fardamento e de uma ou outra viagem”.
Além da torcida, a liderança e inteligência do Professor Cilon Orth também são enaltecidos por Luiz Fernando, ao lembrar da concorrência com as outras equipes do Estado. “Nossos principais adversários eram de Caxias do Sul, São Leopoldo, Porto Alegre e Novo Hamburgo. O material humano dos outros times era maior, pois em todas as cidades tinham universidades, e aqui em Montenegro não. O Cilon buscou com uma lupa os jogadores. A base era 90% da cidade”, relembra.
Considerando Cilon Orth como um segundo pai para todos daquele elenco, Luiz Fernando conta que leva os ensinamentos do Professor para sua vida profissional. “Ele sempre cobrou muita disciplina, era um grande líder. Hoje, uso muitos exemplos aprendidos com ele na minha vida profissional. Foi uma fase única, somos privilegiados de ter vivido e feito parte de tudo aquilo”, finaliza.