Mesmo passada a “febre” pelo esporte, município tem adeptos que seguem incentivando a prática
O paintball – aquele esporte onde os times se dividem e combatem um ao outro com armas de tinta – nasceu no início dos anos 80, nos Estados Unidos. Os equipamentos foram inventados a pedido do Serviço Florestal norte-americano para marcar árvores à distância, com o disparo da tinta. Acabou virando brincadeira e a brincadeira virou esporte.
No Brasil, ele foi se popularizando logo depois, começando no meio rural e depois indo para as cidades. A febre dos videogames e dos jogos de tiro impulsionou a prática, atraindo pessoas que queriam sentir a adrenalina que viam no meio virtual de forma mais real. O sucesso foi grande e, em 1996, o primeiro campo de paintball foi aberto em Montenegro: o Cambodja.
Junto de um grupo de amigos, o publicitário César Augusto Motta foi um dos responsáveis pelo empreendimento. “O campo foi construído ao pé do Morro São João. Na época, existia uma pizzaria no local. Fizemos uma parceria com o proprietário e foi um sucesso”, lembra. Algumas etapas de um campeonato estadual do esporte chegaram a ocorrer ali. O negócio, no entanto, acabou não indo longe. Fechou em 1999.
Mesmo sem um campo específico, muitos montenegrinos seguiram praticando o paintball, formando equipes e competindo regionalmente. Norton Maron é um deles. Ele lembra que, mesmo antes do Cambodja, já ia até Porto Alegre para praticar e também competir. A paixão pelo esporte o levou a investir na cidade com a abertura de um novo espaço, em 2011. Foi por meio dele que as “bolas de tinta” voltaram a Montenegro. Com isso, outros estabelecimentos do tipo também abriram.
Mas, com os anos, a febre voltou a passar e os campos acabaram desativados. O de Norton, ao final de 2015. Este fenômeno, constata o empreendedor, foi apenas regional. “Diminuiu aqui na cidade, mas não por aí afora”, garante. Ele conta que, mesmo hoje, segue praticando o esporte, tendo sido convidado recentemente, inclusive, para um campeonato de paintball na Argentina. Os campos, contudo, enquanto negócio na cidade, pareciam não ir para frente.
O aviário que virou campo de batalhas no bairro Zootecnia
Em meados de 2014, um negócio que parecia fadado ao fracasso em Montenegro virou a aposta dos irmãos Marcelo e Daniel Torales. Moradores do bairro Zootecnia, eles haviam acabado de cessar as atividades de um aviário que a família mantinha na propriedade e pensavam em dar algum uso para o espaço, que estava se deteriorando com o tempo. O paintball – esporte de que os dois apenas haviam ouvido falar – foi ideia de Daniel.
Em uma pesquisa de mercado que realizaram em um campo em Canoas, os irmãos perceberam que uma das dificuldades enfrentadas pelos estabelecimentos do ramo era a queda de clientela nos períodos de chuva e de frio, quando a maioria não queria praticar o esporte. Para isso, eles tinham a solução: o aviário parado, junto dos equipamentos e materiais ali armazenados, foi adaptados como um campo de paintball fechado, otimizando o funcionamento durante o ano todo. Ali eles operam até hoje.
O espaço, de 12×40 metros, foi organizado com obstáculos e “esconderijos” onde ocorre a guerra de tinta. Há uma base elevada para os atiradores e até uma estrutura móvel, que, em um tipo de esteira, se movimento para levar os atiradores, com proteção, para perto dos combatentes. As possibilidades são muitas e a diversão, asseguram os donos, é garantida.
Ali, a modalidade é o mata-mata e o foco é no entretenimento – o paintball, afinal, oferece diversas possibilidades. No campo Torales, nas partidas, são duas equipes que têm a intenção de acertar os oponentes com as bolinhas de tinta. Cada participante ganha um colete, uma máscara de proteção, a arma – que é chamada de “marcador” – e um pacote de munição. São os jogadores que decidem as partes do corpo onde podem acertar. Quem é atingido grita “morto” e sai do campo. Normalmente, os combates duram dez minutos. Após, os participantes se limpam e iniciam nova partida.
Sócio do hoje único campo de paintball de Montenegro, Marcelo conta que o estabelecimento faz cerca de seis jogos por mês. Mas a variação é grande. Em alguns finais de semana, chega a ter quatro confrontos agendados. Ele avalia, no entanto, que mesmo considerando um movimento razoável, o negócio só segue porque não é a única fonte de renda dele e do irmão. Ambos trabalham fora e, no local, há também aluguel de campo de futebol.
“Não pode depender só do campo porque o movimento vai ter altos e baixos. Isso é uma febre”, aponta. “O pessoal joga duas, três vezes e já não quer mais. Tem que estar sempre contando com um público novo”, observa Marcelo. Para jogar no Torales, o participante precisa agendar previamente. Só são marcados jogos com o mínimo de dez participantes e a idade mínima é de dez anos. Cada pessoa paga R$ 30,00 por 1h30min utilizando 100 bolinhas de tinta como munição. Recarga para mais 50 bolinhas custa R$ 10,00; para mais 100, R$ 18,00.
Diversificando o negócio
Pensando em chamar o público de volta e atrair ainda mais clientes, o Torales está projetando uma nova modalidade de paintball, que deve começar a ser praticada já no próximo verão. Externo, um novo campo terá 60 x 60 metros em meio a uma plantação de acácia. Haverá carcaças de carros, tonéis e uma série de obstáculos até um forte, no meio, onde estará uma bandeira – o grande objetivo do jogo.
Os participantes, ali, precisarão pegar a bandeira. O desafio vai da escolha da equipe. O jogador pode apenas ter que chegar até ela, pode ter que trazê-la até a base do seu time ou, ainda, levá-la para a base do time adversário. Tudo isso sem ser acertado pelas balas de tinta no “fogo” cruzado entre os jogadores. “Pessoal vai ter que montar estratégia, estabelecer regras. Vai ser bem diferente”, adianta Marcelo.
Mercenários: a equipe montenegrina de paintball
Além dos praticantes comuns – que, além de frequentar campos como o Torales, têm equipamentos próprios de paintball e frequentam diversos eventos do gênero – há no município uma equipe oficial do esporte: a Mercenários. Eles já foram acompanhados por outras equipes, mas, hoje, são a única ativa da cidade. Atuam desde 2014.
O grupo é formado por doze integrantes – nove montenegrinos e três de outros municípios da região. Eles praticam a modalidade de “Real Action”, onde – ao invés de terem um objetivo ou de combaterem times – realizam simulações de batalhas reais de guerra. O capitão do Mercenários, Batista Junior Avila da Silva, explica que o intuito é replicar até mesmo a hierarquia dos militares, reproduzindo um conflito real. “Essa nossa modalidade tenta ser bem mais tática”, aponta.
Em eventos do tipo, a equipe já esteve em várias partes do Estado. Há dois anos, conseguiu autorização para utilizar o prédio abandonado da empresa Frigonal, em Montenegro, com este fim. “Já teve evento com umas 100 pessoas ali”, conta Batista.
Dentre os membros do Mercenários, não falta paixão e dedicação pelo esporte. “Normalmente, os eventos são em domingos de manhã. Tem que acordar às 4h da manhã pra estar pronto pra jogar. Nós somos apaixonados. É um esporte diferente e eu sou fascinado”, expõe o capitão. Os eventos de Real Action têm idade mínima de 16 anos.
Jogo de pura adrenalina
O Torales costuma ser frequentado por famílias, grupos de amigos, colegas de trabalho e até recebe festas de aniversário. Em alguns locais do país, inclusive, o paintball é utilizado como dinâmica de grupo por empresas, visto que incentiva o respeito às regras e à hierarquia – tendência ainda não identificada em Montenegro. Para Marcelo, o esporte, mesmo com o intuito do entretenimento que tem o campo, possibilita um autoconhecimento, pois coloca a pessoa dentro de uma situação de tensão e adrenalina.
A pressão dos marcadores (armas), no campo, nunca é a máxima. Mesmo assim, as bolinhas de tinta chegam a 240 quilômetros por hora, garantindo alguns hematomas, mas nada que não seja suportável. “Dependendo da distância, há uma ardência, mas logo vai passando”, diz. Quando há crianças envolvidas, a pressão é diminuída e, além disso, sempre existem regras que, aliadas aos equipamentos de proteção, garantem a segurança dos participantes.