EM 18 ANOS, foram atendidos mais de 200 pedidos de ajuda
Há quem diga que na vida nada é fruto do acaso. Gilberto Büttenbender, de 55 anos, o Betinho, acredita nessa crença popular. Natural de Brochier, Betinho é conhecido na cidade como homem esforçado, trabalhador e, principalmente, generoso. No começo da década dos anos 2000, Betinho comprou um caminhão Chevrolett 1975, com a intenção de prestar serviços para agricultores, que não tinham como transportar excrementos de suínos de suas propriedades. A ideia foi colocada em prática, mas, essa acabou não sendo a única atividade desenvolvida com o veículo. A cada incêndio registrado no município, Betinho era lembrado e chamado para, com uso de água transportada no tanque do caminhão, auxiliar no combate ao fogo, até a chegada dos Bombeiros.
Lá se vão 18 anos desde que Gilberto começou a ajudar em situações de sinistros com fogo. Para ele, o “chamado” ocorreu de forma natural. “As pessoas me ligavam pedindo para ir com o caminhão para apagar fogo em forno de carvão, no mato…Surgiu naturalmente, não foi algo que eu planejei ou que me ofereceram uma incumbência”, explica.
A coragem para encarar o desafio surgiu junto com a necessidade. Muitas vezes, Betinho se sentiu em risco em meio aos incêndios, principalmente quando eram em áreas de vegetação. Mas nem por isso ele desistiu de levar socorro a quem precisava.“Já entrei em lugares com capoeiras que a gente não enxergava se tinha toco ou pedras e o fogo vindo. Se trancasse um pé em um toco ficaria preso no meio do fogo”.
O tempo foi passando e Betinho foi perdendo as contas de quantos incêndios ajudou a controlar. Para ele, mais importante que o número é o resultado final de cada atuação. “Cerca de 200 casos eu atendi até hoje. Não dá tempo para registrar todos, você combate o incêndio ou registra”, comenta.
Poder ajudar a comunidade onde está inserido é motivo de satisfação para Betinho – que atualmente é secretário de Agricultura Meio Ambiente, Indústria e Comércio de Brochier, e eleito vereador nesta gestão. A lembrança de algumas situações, no entanto, amargam na memória. “Lembro de alguns casos de sucesso e outros de insucesso. De ficar a semana toda pensando que aquela família perdeu tudo e eu não pude fazer nada”, relata. “Ser chamado e não chegar a tempo causa uma certa decepção na gente. É muito triste chegar lá para apagar brasas”, emociona-se ao falar.
Já são quase duas décadas vendo de perto perdas e o sofrimento de muitas famílias conhecidas. Mesmo assim, Betinho afirma que ainda é muito difícil segurar a emoção. “Até hoje quando as pessoas perdem a gente fica triste por elas”.
Entre altos e baixos, Gilberto dá valor a cada “missão de sucesso”. Ao relatar um dos tantos casos que já atendeu as lágrimas dão espaço ao sorriso. “Tem um caso específico que lembro muito bem”, sublinha. “Era dia 31 de dezembro, não lembro bem o ano, me chamaram às 23 horas. Os bombeiros fazem um trabalho excelente, mas a distância impede que venham tão rápido, por isso, logo sou lembrado”, explica. “Eram dois galpões em que cabiam, mais ou menos, 150 mil quilos de carvão, na localidade de Vila Progresso.Um galpão e um caminhão queimaram por completo, mas, a nossa satisfação foi que o outro galpão não queimou. Conseguimos controlar as chamas. Ele não perdeu tudo, pode continuar a atividade no carvão”.
“Todos se unem contra o fogo”
Com Betinho não tem dia nem horário, precisou de ajuda é só chamar. A comunidade sabe disso. “Eu largo minhas atividades para fazer isso, sem problema nenhum. Me considero um bombeiro voluntário, independente da legalização ou não”. O bombeiro voluntário de Brochier destaca que não está só nessa missão e que, assim como ele, outros munícipes se unem, quando preciso, para espantar o perigo causado pelo fogo. “Colonos que têm tratores com tanque também fazem esse trabalho. Estou na atividade há mais tempo, por isso o pessoal lembra de mim e do caminhão, por que às vezes chego mais rápido. Mas, se existe algum mérito, ele é de todos que ajudam na hora em que é preciso”, aponta o voluntário.
Nas últimas semanas, diante de várias ocorrências de incêndios em Brochier, Betinho tem sido visto com frequência a bordo de seu Chevrollet. O tanque do veículo conta com capacidade para sete mil litros de água, mas têm ficado carregado com a metade. Isso por que em caso de necessidade, ele fica mais leve para se deslocar, ganhando mais velocidade. “No caso da Serraria Schneider, por exemplo, eu tinha três mil litros e cheguei muito mais rápido que se estivesse carregado”.
O tipo de bomba do tanque possibilita que o abastecimento, por completo, se dê em questão de poucos minutos.“Em geral a água é pega na hora. Essa bomba puxa e também faz a dispersão da água, diferente da dos bombeiros, que tem mais pressão, mas não puxa água. Já tive vontade de não cuidar mais do caminhão mas, por conta disso, não consigo”, conta Betinho. “O nosso trabalho de voluntário é um auxílio aos bombeiros de Montenegro, é o primeiro atendimento até a chegada deles”, faz questão de explicar o socorrista.
“São muitos anos, a gente já viu tanta coisa ruim nesse tempo, mas as pessoas sempre se lembram de agradecer e me perguntam se tem que pagar. Não tem como cobrar. Nunca cobraria, acho que a pessoa já perdeu o suficiente e outro dia a gente também pode precisar de um auxílio nesse sentido ou coisa parecida”, conclui Gilberto.