Investimento tecnológico está em todos os setores da cadeia produtiva na indústria do frango, um dos principais produtos da economia do Vale do Caí
Não ter mais que puxar sacos de ração manualmente para alimentar os animais. Nem temer que a climatização inadequada do ambiente faça as aves sofrerem. E, ao final da criação, ter a certeza de entregar uma produção dentro dos padrões de qualidade que fazem o frango brasileiro chegar a 150 países. É isso que a evolução tecnológica permitiu à indústria aviária.
Essa realidade é descrita pelo produtor de aves Jair Luis Kleinschmitt, de Harmonia. Ele, que tem a criação desde 2009 e conta com seis aviários na propriedade, relata as mudanças observadas a partir do investimento em tecnologia. O mais recente aconteceu nos dois últimos galpões, construídos há três anos, que contam com tecnologia de ponta e, juntos, custaram mais de R$ 1,3 milhão. O avicultor garante que o investimento compensa. “Se não fosse a tecnologia eu ia ter que contratar uns quantos pra me ajudar nos aviários. Daí não ia dar conta”, avalia. Ele calcula que o tempo gasto para alimentar os frangos, por exemplo, reduziu para, pelo menos, um terço do que seria sem a automatização do serviço.
Hoje, quem trabalha nos seis aviários de Jair é ele, a esposa, a filha e o genro, sendo que este último cuida das granjas mais modernas. Todo o controle da produção é feito através de um painel, que mostra a temperatura, ventilação, alimentação, água, peso diário dos animais e com quantos dias eles estão. “Se fica muito quente, ele liga automaticamente a ventilação para resfriar”, exemplifica Leo Carlos Hensel, genro de Jair. Essa facilidade garante maior conforto aos animais e reduz o custo da produção. “Os frangos dos outros aviários demoram cerca de três dias a mais para ficar no mesmo padrão”, calcula.
Por lote, são produzidas cerca de 180 mil aves. “O ganho principal é a conversão da quantidade de ração que come pelo peso. Aqui [nos aviários com maior investimento tecnológico] eles comem a mesma coisa que lá [nas demais unidades da propriedade], mas conseguem ganhar mais peso, por causa da temperatura mais uniforme”, explica Leo Carlos. Além dessa diferença de dias, as granjas que oferecem maior conforto e tecnologia podem alojar entre 18 e 19 aves por metro quadrado, enquanto as demais, segundo os criadores, alojam entre 15 e 16 unidades.
A tranquilidade do dia a dia também foi citada por Jair e Leo Carlos. O comparativo entre as unidades produtoras da propriedade é feito, sobretudo, no que diz respeito ao abastecimento do forno, que mantém os aviários aquecidos. O material utilizado deixou de ser a lenha para ser o cavaco, muito mais prático e rápido, já que o abastecimento do tonel que armazena os cavacos é feito através de um trator, e não mais manualmente. Já o forno, propriamente falando, recebe os cavacos na medida certa, conforme a necessidade, e de forma automática. “A gente ainda tem compromisso, mas consegue manter a temperatura mais uniforme. Agora precisa só passar e olhar durante a noite. Se não fosse automático, teria que passar a noite colocando a lenha”, avalia o proprietário da criação.
O peso do frango na balança de exportações do Brasil
Hoje, praticamente 100% do volume de frangos abatidos pela Seara Alimentos, em Montenegro, é exportado, de acordo com o diretor de indústrias da empresa, Anderson Andrade. “Nos últimos anos, só tem melhorado o desempenho de comercialização e vendas, sobretudo no mercado do Oriente Médio”, afirma. Em 2016, os principais destinos do frango brasileiro foram Egito, Arábia Saudita, China, União Europeia, Japão, Emirados Árabes, Hong Kong e África do Sul.
No centro dessa evolução, está a indústria tecnológica, que permitiu avanços quantitativos e qualitativos da produção de frango. Dados fornecidos pela Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav) demonstram essa melhora. Em 2006, foram abatidos no Rio Grande do Sul 600 milhões de frangos. Uma década e muita evolução nos aviários e nas indústrias depois, o número alcança 840 milhões de em 2016, um acréscimo de 40% na produção.
Esse é um setor bastante importante para a economia nacional e, também, regional. O Brasil tem produção aviária na casa dos 13 milhões de toneladas abatidas anualmente. Isso representa 15% da produção e 38% das exportações mundiais de frango. Nacionalmente, o Rio Grande do Sul ocupa a 3ª posição como estado produtor e exportador, perdendo apenas para Paraná e Santa Catarina. Os três estados da região Sul são responsáveis por 70% da produção avícola nacional.
Em Harmonia, por exemplo, onde Jair investe no aprimoramento tecnológico da sua propriedade, a criação de aves é um dos principais segmentos da economia. A expectativa, segundo a prefeitura da cidade, é que 70% de toda a riqueza do município seja gerada pela agropecuária. Dentre as atividades listadas, estão a produção de frango e de ovos como carro-chefe da economia local. “Foram feitos muitos investimentos ao longo dos anos”, avalia o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Loemar Antonio Weber. “Em geral, os produtores vão se modernizando. A gente precisa ter um pouco de cuidado no investimento, mas facilita muito o trabalho, principalmente porque a mão de obra está se escasseando. Muitos filhos de produtores vão saindo do campo e a automação dos aviários é vital, porque não tem mais tanta gente para trabalhar”, avalia. Hoje, Harmonia conta com mais de 80 famílias trabalhando na criação de aves e suínos.
Operação Carne Fraca causou prejuízos ao setor
Os números finais de 2017 deverão apresentar uma queda. Segundo dados da Associação Brasileira de Proteína Animal, em março, quando houve a divulgação da operação Carne Fraca, pela Polícia Federal, as exportações da carne de frango brasileira sofreram um intenso baque. O volume mensal exportado foi de 380 mil toneladas em março para 320 mil toneladas em abril. Em junho, o setor já mostrava recuperação, alcançando 370 mil toneladas.
Investimento na tecnologia reduz perdas e aumenta a qualidade
Montenegro conta hoje com a maior unidade da JBS no Rio Grande do Sul, com capacidade para abater cerca de 500 mil frangos por dia. A empresa, que produz carne de aves e suínos para a Seara alimentos, gera cerca de 3.200 empregos diretos na unidade local, de acordo com o diretor de indústrias da Seara Alimentos, Anderson de Andrade.
Se no principal município do Vale do Caí cerca de 70% das 91 propriedades são vinculados à empresa, no Rio Grande do Sul, o número de integrados chega a cerca de 3.000, segundo dados da Seara. “Ao longo da cadeia produtiva, temos profissionais que nos dão o suporte mesmo após a chegada dos animais à fábrica, onde são transformados em alimentos”, afirma Andrade. “Há também o acompanhamento e a gestão diária de vários indicadores que competem a cada um dos segmentos (acompanhamento dos ovos, das matrizes, das condições dos criadouros), o que garante a maior qualidade de nossos produtos”.
O diretor não revela os valores investidos pela empresa na tecnologia produtiva, mas garante que a planta industrial é extremamente automatizada, com mão de obra em postos cada vez mais qualificados. “A tecnologia garante a padronização do produto final, com uma margem de erro bastante baixa; torna o produto mais competitivo pela alta tecnologia empregada; aumenta produtividade e reduz custos, trazendo lucratividade para toda a cadeia produtora”.
O principal objetivo, segundo Anderson, é reduzir a possibilidade de perda em qualquer setor da cadeia produtiva por erro humano. “Com isso, o aproveitamento da matéria-prima acontece de forma mais inteligente, controlada e padronizada, gerando custos menores de produção”.
Mais investimentos e geração de empregos na indústria
No RS, são gerados 44 mil empregos diretos, além das 10 mil famílias de produtores rurais integrados na atividade de frango de corte. A avicultura está presente em 241 municípios do Estado e o Vale do Caí é parte importante nessa cadeia produtiva.
De acordo com os dados do Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados do Ministério do trabalho e Emprego (Caged), a indústria da transformação – setor que engloba a indústria alimentícia – registrou, nos últimos 12 meses, um saldo de 100 admissões em Montenegro. Entre setembro de 2016 e setembro de 2017, o município teve 1.961 contratações e 1.861 desligamentos no segmento. Se for considerado somente 2017, houve variação positiva de 123 postos de trabalho no setor industrial da cidade.
Três municípios da região aparecem entre os 20 de maior capacidade de alojamento e criação aviária no RS. Tupandi está na 7ª posição, com 122 propriedades e 201 galpões. Na 11ª posição, aparece Salvador do Sul e suas 57 propriedades e 258 galpões. Montenegro ocupa a 16ª colocação, com 91 propriedades e 164 galpões. Juntas, as três cidades do Vale tem capacidade de alojamento para 10.283.888 aves. Em 2016, o RS abateu 850 milhões de unidades. Isso significou uma produção de 1.700.000 toneladas de carne, sendo que, dessas, 740 mil toneladas foram exportadas.
Ainda é preciso considerar que a indústria do frango vai além da criação para corte. Há toda a produção de ovos e, ainda, a cadeia de insumos, como o milho utilizado na ração dos animais. A produção nacional de ovos é de 3 bilhões de unidades ao ano. O Rio Grande do Sul ocupa o 4º lugar no ranking de estados produtores, com 8% da demanda nacional. Na sua frente, estão São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo.
O presidente da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav), Nestor Freiberger, confirma a vinculação do desenvolvimento tecnológico da indústria aviária com o seu crescimento e destaca, principalmente, o fator social agregado a ela e às comunidades envolvidas. “Melhorou o trabalho. As condições ao homem do campo. O criador tem de estar menos no galpão, na produção. E isso trouxe uma facilidade maior, qualidade de vida, que representa, inclusive, a manutenção do homem no campo”, destaca Freiberger, citando questões facilitadas pela tecnologia hoje embarcada nos galpões e que controlam a climatização e a alimentação dos animais, sem exigir a presença constante do criador.
O impacto da tecnologia também se vê na indústria, na hora do beneficiamento, que evita perdas da produção e chancela a qualidade do produto final. “A tecnologia auxiliou na ampliação da quantidade e, sobretudo da qualidade da produção, além de reduzir a mão de obra. É decisiva”, diz Nestor Freiberger. Ele explica que o frango brasileiro tem mercado aberto por conta de sua qualidade, estando livre de entraves sanitários. O controle de qualidade exercido pela indústria é essencial para que essa cadeia se mantenha forte.
A maior parte do que é produzido no RS não fica aqui. O consumo estimado de carne de frango no Estado é de aproximadamente 462 mil toneladas ao ano. O setor exporta para outros países 746 mil toneladas, em torno de 400 mil toneladas ficam no RS e o restante segue para outros Estados e vira matéria-prima para industrializados.
Principais cidades do Vale do Caí em capacidade de alojamento
Tupandi 201 galpões e capacidade de alojamento de 4.205.298
Salvador do Sul 258 galpões e capacidade de alojamento de 3.383.680
Montenegro 164 galpões e capacidade de alojamento de 2.694.910