Estudo do CFM aponta que gasto médio nacional com recursos próprios na área é de R$ 403,37 por habitante
Um estudo feito pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) mostrou que cerca de 2.800 municípios brasileiros gastaram menos de R$ 403,37 na saúde de cada habitante durante todo o ano de 2017. Segundo a análise da entidade de classe sobre as contas da Saúde, esse foi o valor médio aplicado pelos gestores municipais com recursos próprios em Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS), declaradas no Sistema de Informações sobre os Orçamentos Públicos em Saúde (Siops), do Ministério da Saúde. Dos Municípios do Vale do Caí, não atingem essa média Capela de Santana, Portão e São José do Sul.
O levantamento mostra ainda, por exemplo, que os Municípios com menos população arcam proporcionalmente com uma despesa per capita maior. Em 2017, nas cidades com menos de cinco mil habitantes, as prefeituras gastaram em média R$ 779,21 na saúde de cada cidadão, quase o dobro da média nacional identificada. Na região, algumas Prefeituras chegam até mesmo a ultrapassar esse número. É o caso de São José do Sul, onde o investimento em saúde per capita em 2017 foi de R$ 1.061,08. Entre cidades do mesmo porte no Vale do Caí, apenas Linha Nova investiu mais: R$ 1.142,05 por munícipe.
De acordo com o estudo, Municípios de 50 a 100 mil habitantes tiveram um gasto médio em Saúde de R$ 329,14. Encaixando-se nessa categoria, Montenegro apresentou um investimento maior que a média, chegando a gastar na área R$ 437,60 por habitante. Na região, o maior gasto por morador ocorre em Triunfo, que possui 28.289 habitantes. Lá, o Executivo gasta em saúde R$ 1.261,37 per capita.
Conforme o CFM, grande parte dos municípios brasileiros está sendo cada vez mais sobrecarregada, investindo, em média, quase 30% de seus orçamentos na Saúde.
Para a entidade, esse cenário decorre de dois fenômenos: a queda da participação do Governo Federal no financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a manutenção dos gastos estaduais ao longo dos últimos dez anos.
Municípios elevam gastos, União e Estados diminuem
Segundo os dados oficiais analisados pelo Conselho Federal de Medicina, nos últimos dez anos, só as despesas municipais com recursos próprios aumentaram quase 50% em todo o Brasil, passando de R$ 55,7 bilhões, em 2008, para R$ 82,5 bilhões, em 2017, em valores atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor amplo (IPCA).
“O Município é o ente do Poder Público mais próximo do cidadão e, portanto, mais suscetível às pressões diretas da população. Além disso, é o maior responsável pela entrega dos serviços do SUS na atenção primária e na urgência e emergência, que são as portas de entrada do sistema, e mesmo na média complexidade”, explica o diretor da consultoria Monitor Saúde, Januário Montone.
Segundo o especialista, a crise econômica dos últimos anos agravou a situação e, apesar de uma pequena melhora em 2017, os gastos em saúde ainda não recuperaram o patamar per capita de 2014.
“A União e os Estados tiveram maior capacidade de se ajustar com a queda de receitas – os que quebraram simplesmente deixaram de honrar seus compromissos e de atender a população –, mas os Municípios têm uma capacidade infinitamente menor de ajuste”, destaca.
Em 2008, as prefeituras assumiam 29,3% do gasto público na saúde. Esse percentual em 2017 alcançou 31,4%. Já a União, que na década de 1990 chegou a ser responsável por 75% do financiamento da saúde no Brasil, praticamente se manteve próxima de 43% na última década. No caso dos Estados, o índice teve pouca variação no período, oscilando entre 26,8% a 25% das despesas.
Dificuldades são sentidas pelas secretarias de Saúde
À frente da secretaria municipal de Saúde e Assistência Social de Brochier, Mônica Aline Kerber Neis, sente na prática as dificuldades oriundas da falta de investimento por parte da União e do Estado na Saúde. Segundo ela, é possível observar o aumento de gastos de recursos próprios principalmente na compra de medicamentos que deveriam, obrigatoriamente, serem distribuídos pelo Estado e que, muitas vezes, são essenciais à vida de pacientes, bem como gastos com o pagamento de alguns exames que antes eram oferecidos pelo SUS.
Além de os repasses do Governo Federal e do Governo Estadual não ter aumentado nos últimos anos, os Municípios também enfrentam o atraso nos pagamentos desses repasses por parte do Estado. “No final de 2018, o montante atrasado do Estado somava aproximadamente R$ 200 mil”, conta Mônica.
Segundo ela, os recursos oriundos da União estão sendo pagos em dia. A secretária de Saúde e Assistência Social de Pareci Novo, Gislaine Ribeiro dos Santos, diz que o aumento nos gastos de recursos próprios em Saúde no Município se deu justamente devido ao atraso nos repasses por parte do Estado.
“O Município investiu mais recursos para poder atender a demanda de exames, consultas de especialidades médicas, aquisição de medicamentos e fraldas”, exemplifica Gislaine. Conforme ela, os principais gastos da secretaria são com a compra de medicamentos e com a folha de pagamentos. Esses também são os principais gastos da secretaria de Saúde de Brochier. Em ambos os Municípios, também gera dificuldade para as gestoras da área o fato de a falta de repasses por parte do Estado restringir o atendimento em diversos hospitais que servem de referência de atendimento de especialidades.
Medicamentos e fraldas começam a faltar
Os gestores das secretarias da Saúde das prefeituras da região estão preocupados com a demora nos pagamentos obrigatórios que competem ao governo do Rio Grande do Sul. A maioria deles não recebe desde outubro do ano passado. Por esses atrasos, a Secretaria de Saúde e Assistência Social de Pareci Novo informou nesta semana que fraldas geriátricas estão sendo distribuídas de forma racionada.
“A procura pelas fraldas é grande e a quantidade disponível é menor que o habitual”, revela o comunicado da prefeitura. Desde outubro de 2018 o caixa municipal não recebe os aportes necessários e o município adquire as fraldas com recursos próprios. A situação é provisória até que o repasse seja normalizado.
Já em Brochier, a secretária da Saúde, Mônica Aline Kerber Neis, afirma que no início do ano passado o Estado depositou valores referentes ao exercício de 2017 e que durante o ano outros saldos não foram repassados. Em relação à compra de fraldas aos pacientes, Mônica afirma ter firmado um acordo com as cerca de 30 famílias que fazem a retirada do item na Secretaria. “Um mês o município compra e no outro a família adquire. Isso é de competência do Estado, mas estamos mantendo com recursos próprios”, diz a secretária.
O município de São José do Sul é outro que não teve os valores para a compra de fraldas geriátricas creditado. Segundo a gestora da área, Ciliane Santos Krahl, ainda há estoque dos itens na farmácia do Posto de Saúde. “Aos poucos a quantidade vai reduzindo, mas estamos conseguindo atender a demanda devido à organização da nossa farmacêutica, que monitora a situação”, afirma Ciliane.
Além disso, a secretária destaca que vem fazendo contato com o Estado desde a semana passada para saber como as pendências serão resolvidas, no entanto, não há retorno dos responsáveis. “A insulina também está em falta e estamos comprando com recursos próprios. Até o momento conseguimos nos organizar, preparar um estoque e atender a população”, acrescenta a responsável pela Saúde.
Conforme a cidadã Sabrina Janaina Rodrigues, há três meses a Prefeitura de Montenegro não tinha fraldas para entregar. Ao menos foi este o período que sua filha cadeirante, de 3 anos, ficou desamparada. Mas na terça-feira, 5, Sabrina informou que recebeu o produto.
A Secretaria Municipal de Saúde de Montenegro esclarece que o Governo do Estado não havia repassado verbas nos meses de novembro e dezembro. Então em janeiro cumpriu sua obrigação e quitou os recursos para compra de fraldas, que foram entregues à comunidade na semana passada.
Maratá não distribuirá fraldas neste mês
Em Maratá a situação não tem sido diferente, pois os valores que são de obrigação do governo estadual não chegam há cinco meses. Segundo o secretário interino da Saúde, Luciano Grings, não existe estoque de fraldas geriátricas na farmácia do Centro de Saúde do município. “Conseguimos manter a compra até aqui, mas neste mês não vamos ter como atender essa demanda”, revela Grings.
Medicações por processos administrativos e judiciais também estão faltando na farmácia do município. “O Estado anunciou que iria realizar alguns pagamentos no mês de março”, diz o secretário. Com toda essa situação que atinge os municípios da região, é justificável que as prefeituras tenham gasto mais na área da saúde, a fim de atender as obrigações que deveriam ser do governo estadual. (JH)