Previna a iniciação ao tabagismo: evite o vício e doenças

Desde 1986, em 29 de agosto é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Fumo. O objetivo é reforçar as ações nacionais de sensibilização e mobilização da população para os danos causados pelo tabaco. As ações são voltadas para o controle e prevenção do uso, já que o tabaco representa um problema de saúde coletiva. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o tabagismo como a dependência da droga nicotina, presente em qualquer derivado, seja cigarro, cigarrilha, charuto, cachimbo, cigarro de palha, fumo de rolo ou narguilé. Além disso, considera o tabagismo a principal causa evitável de morte no mundo atualmente.

A OMS aponta que o tabaco mata mais de 8 milhões de pessoas por ano. Mais de 7 milhões dessas mortes resultam do uso direto desse produto, enquanto cerca de 1,2 milhão é o resultado de não-fumantes expostos ao fumo passivo. A Organização afirma ainda que cerca de 80% dos mais de um bilhão de fumantes do mundo vivem em países de baixa e média renda onde o peso das doenças e mortes relacionadas ao tabaco é maior. Segundo o Instituto Nacional de Câncer, o INCA, no Brasil, 443 pessoas morrem a cada dia por causa do tabagismo.

Crianças, adolescentes e jovens têm sido expostos cada vez mais precocemente ao tabagismo. A iniciação precoce ao fumo é também uma porta de entrada para o uso de outras substâncias, como álcool e drogas ilícitas. A prevenção da iniciação está prevista na Convenção-Quadro da OMS para o Controle do Tabaco (CQCT), que, em seus princípios norteadores, reforça o direito das pessoas à informação sobre a gravidade dos riscos decorrentes do consumo de tabaco; o direito de acesso aos mecanismos de prevenção à iniciação e de apoio para o tratamento para parar de fumar, além da proteção de toda pessoa contra a exposição à fumaça do tabaco.

Ainda segundo o INCA, para conter a epidemia do tabagismo, é necessário adotar inúmeras estratégias. Dentre elas, é preciso avançar no controle de vendas para menores; oferecer acesso a programas de educação e conscientização sobre os riscos que os produtos derivados do tabaco acarretam para a saúde, bem como oferecer programas de formação específicos voltados aos profissionais de saúde e educação. É fundamental, para prevenção, conscientizar o público sobre as questões relacionadas ao controle do tabaco, assegurando o direto a saúde para todos.

Adalberto Sperb Rubin, chefe do serviço de pneumologia da Santa Casa de Porto Alegre. Foto: divulgação

Pais ou responsáveis, parentes, professores, ídolos e amigos também exercem uma grande influência na iniciação ao fumo. O consumo de tabaco por estes e a atitude permissiva diante do uso por seus filhos promovem a aceitação social do tabaco entre as crianças, adolescentes e jovens e contribuem para incentivar o uso. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (2019), com relação ao consumo de cigarros, entre os escolares de 13 a 15 anos de idade no Brasil, o percentual que experimentou cigarro alguma vez na vida foi de 15,61% para os meninos e de 18,43% para as meninas (IBGE, 2021).

Ainda, é essencial orientar os adultos que não fumem em locais onde haja crianças, para que estas não sejam transformadas em fumantes passivos. Adalberto Sperb Rubin, chefe do serviço de pneumologia da Santa Casa de Porto Alegre, explica que os fumantes passivos são aquelas pessoas que apenas convivem com fumantes em casa ou trabalho. Mesmo que não faça uso do tabaco, dependendo do tempo de exposição à fumaça, pode desenvolver as mesmas doenças de um fumante.

Dispositivos eletrônicos são grandes vilões
Outra maneira de prevenir o uso do tabaco é evitando os Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs), cada vez mais comuns entre os jovens, os cigarros eletrônicos (conhecidos como vapes ou pod’s) e narguiles. Estes modismos, incentivados muitas vezes pela curiosidade, desejo de fazer parte de um grupo ou status, escondem riscos extras, além de serem uma porta de entrada para o vício em cigarro comum. Os cigarros eletrônicos e narguiles são tratados como menos nocivos, mas podem impor danos semelhantes ou até mesmo piores do que o cigarro convencional.

Segundo a OMS, uma sessão com narguile dura, em média, de 20 a 80 minutos, o que corresponde a exposição de todos os componentes tóxicos presentes na fumaça de 100 cigarros. Os riscos são os mesmos associados ao fumo regular, que incluem as doenças cardiovasculares, respiratórias e cânceres. O uso coletivo aumenta, ainda, a exposição a doenças como herpes, hepatite C e tuberculose. Com os cigarros eletrônicos, a história se repete. O dispositivo produz um vapor inalável. Quem utiliza estes métodos, está duas vezes mais propensos a avançar para cigarros convencionais o que aqueles que nunca utilizaram estes dispositivos.

foto: freepik

Programa Municipal de Controle ao Tabagismo em Montenegro
O INCA é o órgão do Ministério da Saúde responsável pelo Programa Nacional de Controle do Tabagismo (PNCT) e pela articulação da rede de tratamento do tabagismo no Sistema, em parceria com estados e municípios. Montenegro possui esta rede de atendimento que, após inativa por um tempo, está em funcionamento há cerca de seis anos. No município, os responsáveis pelo programa são a odontóloga Cristina Helena Vaccari Lopes, a enfermeira Mariana Luft de Vargas e o médico Cristiano Ramos Braun.

O primeiro passo para aderir ao programa gratuito é a inscrição. O interessado deve se dirigir até a Secretaria Municipal de Saúde, a SMS (rua Campos Neto, 177), e se inscrever no setor de Exames Especializados, ou, ainda, através do número (51) 3649-1983. Em seguida, conforme vão abrindo novos grupos, ocorre o chamamento. Após, os pacientes passam por uma consulta de enfermagem para que Mariana possa conhecer mais afundo seu histórico e, assim, saber como desenvolver seu tratamento.

A próxima etapa é o início do grupo, com reuniões durante quatro semanas seguidas, realizados na SMS. “Neste momento trabalhamos com ferramentas de incentivo, assim como realizamos uma escuta de toda a história dos pacientes. O principal, dentro dos grupos, é a troca entre eles. Cada história pessoal é diferente, mas eles vêm com o mesmo objetivo, que é parar de fumar”, explica Cristina. “Não é fácil, mas a gente diz que o principal é eles decidirem vir e estarem abertos para todas as ferramentas que a gente usa”, acrescenta.

Enfermeira Mariana e odontóloga Cristina

Após os encontros e tratamentos em execução, os pacientes passam para um grupo de manutenção. Com participação não obrigatória, muitos pacientes que já pararam de fumar há anos seguem fazendo parte deste último grupo. “Muitos que já há mais que quatro anos estão sem fumar e sem medicação continuam vindo, porque se sentem fortalecidos com toda a troca que acontece”, pontua Cristina.

Os adesivos de nicotina são fornecidos por até seis meses para os pacientes dentro do programa, uma medicação que serve como suporte, mas, outros medicamentos são prescritos conforme desenvolvimento de cada paciente. Os grupos das quatro sessões de tratamento ocorrem todas as quartas-feiras, das 15h30min às 16h30min. Já o grupo de manutenção, com presença não obrigatória e aberto para pacientes que já largaram o vício, ocorre também nas quartas-feiras, das 14h30min às 15h30min.

Aumento considerável da ansiedade prejudica tratamento
Cristina ressalta que, nos últimos grupos, principalmente pós-pandemia, há um aumento considerável da ansiedade dos pacientes. “Os que a gente percebe, ou que nos sinalizam, estamos tendo que encaminhar, fora do programa, para psicólogos e até psiquiatra para dar um suporte. Isso aumentou muito”, destaca. A enfermeira Mariana também relembra que, quando chegam ao atendimento, os pacientes já decidiram largar o vício, mas muitos outros aspectos estão inclusos no processo. “Se abre muita coisa. Outros problemas de saúde começam a aparecer, como problemas mentais, complicações na família. Então, a gente já precisa encaminhar para outros profissionais por fora do programa”, salienta.

Segundo Cristina, os medicamentos agem apenas como suporte. “A gente tira dos pacientes a ideia de que o medicamento é milagroso. O milagre está neles. É toda uma mudança de vida, que eles precisam querer parar.” Há, muitas vezes, a necessidade de mudar os ambientes que frequentam, a roda de amigos e às vezes até, temporariamente, o afastamento de familiares que tenham o vício. “A gente fala para eles explicaram para a família que talvez eles se afastem, mas que não é pessoal, é só porque eles estão tentando mudar de vida. Eles não podem ser as mesmas pessoas. Terão que mudar para ter sucesso na jornada”, diz.

“Se eu colocar um cigarro na boca, eu volto a fumar”
A montenegrina Eliseti Ulrich, 59, começou a fumar cigarro com apenas 15 anos de idade, não por curiosidade e muito menos desejo, mas por pressão de terceiros. Ela relembra que em um internato onde estudou com esta idade, durante as saídas nos fins de semana, as internas costumam fumar e ingerir bebidas alcoólicas. “Elas fumavam e eu tinha que fumar, porque se não eu era a única, daí, como era proibido, se alguém entregasse elas, pensariam que fui eu. Então, se eu fumasse junto, eu não ia me entregar. Tinha medo que elas me pegassem escondido e me dessem um pau”, relata. Eliseti ficou apenas cerca de quatro meses no internato, o suficiente para seguir fumando.

Eliseti fumou por 40 anos de sua vida

Alguns anos depois, se casou com um fumante, assim, o vício teve grande espaço em sua vida. Eliseti relembra que, na época, “fumar era bonito”. “Tinha propaganda com aqueles carrões e as mulheres com lenços, elegantes e fumando. A gente achava tudo lindo, era muito divulgado. Tinha até uma marca que se chamava “Ela”, daí a gente pensava: Ela sou eu”, conta. Ela lembra, ainda, que em Montenegro, era normal fumar cigarros dentro de ônibus e clubes, por exemplo.

Ela chegou a parar de fumar por oito meses em uma das tentativas, mas sem mais nem menos, em uma oportunidade, o vício foi mais forte. “Fui acampar com minha cunhada que fumava e não sei, me deu uma vontade, fumei um e mais o dobro. Aí eu voltei”, salienta. Ela conta que, em outro momento, chegou a frequentar o grupo do município, cerca de 10 anos atrás, sem sucesso. “Eu não tinha cabeça para parar de fumar, tinha muita ansiedade também. Eu pensava que nunca ia parar de fumar”, ressalta.

Foi há mais ou menos quatro anos que Eliseti conseguiu, efetivamente, entrar para o grupo atual e largar o cigarro de vez, segundo ela, agora para sempre. “Mas não foi fácil. É muito difícil parar de fumar. Eu achava que viria no grupo e já sairia de vez sem fumar. Não parei logo que cheguei”, conta. A decisão partiu dela própria, um dia em que, fumando sozinha, viu que estava abusando. “Eu acordei oito horas e as nove meu cinzeiro já estava cheio. Aí eu pensei que não dava mais. Fumei o último cigarro e deu, nunca mais”, destaca.

Ao parar pela primeira vez, Eliseti lembra que engordou cerca de 20 quilos. “Tu desperta outras coisas que substituem. Eu comia pote de bala, quebrava os dentes de tanto que comia”. Até hoje Eliseti segue “substituindo” o cigarro por, principalmente, doces e chimarrão. “Eu tenho compulsão por coisas. Não posso ir no mercado e comprar uma caixa de chocolate que eu como toda”, conta. Mas, em contrapartida, revela não sentir desejo de fumar. “Eu não posso nem sentir o cheiro que me deixa ruim, me dá ânsia. Eu pretendo não voltar a fumar, mas se eu colocar um cigarro na boca, eu tenho certeza que eu volto e não vai ser só duas carteiras. Vai ser quatro para cima”, destaca. Ela ressalta que, mesmo longe do cigarro, continua no grupo pelo grande incentivo que encontra nas rodas de conversa. “O grupo fortifica a gente.”

Danos ficam evidentes após anos de uso

Adesivo de nicotina é fornecido para os pacientes do SUS

Segundo o pneumologista Adalberto, não se sabe qual é o grupo de risco específico, mas pessoas com transtorno de ansiedade e depressão tendem a ser mais suscetíveis ao vício da nicotina. Após ser absorvida, a nicotina atinge o cérebro entre 7 e 19 segundos, liberando substâncias químicas para a corrente sanguínea que levam a uma sensação de prazer e bem-estar. Essa sensação faz com que os fumantes usem o cigarro várias vezes ao dia. Por sentir prazer, o fumante busca o cigarro em situações de estresse, para “relaxar”. Um dos grandes problemas é que grande parte dos danos a saúde causados pelo tabagismo se torna evidente apenas após anos ou décadas de uso.

Segundo o INCA, o tabagismo ativo e a exposição passiva à fumaça do tabaco estão relacionados ao desenvolvimento de aproximadamente 50 enfermidades, dentre as quais vários tipos de câncer, doenças do aparelho respiratório (enfisema pulmonar, bronquite crônica, asma, infecções respiratórias) e doenças cardiovasculares (angina, infarto agudo do miocárdio, hipertensão arterial, aneurismas, acidente vascular cerebral, tromboses). Há ainda outras doenças relacionadas ao tabagismo: úlcera do aparelho digestivo; osteoporose; catarata; patologias buco-dentais; impotência sexual no homem; infertilidade na mulher; menopausa precoce e complicações na gravidez.

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