Firmado recentemente, acerto prevê isenções de taxas de importação e exportação
Foram 20 anos de negociações até que, no fim de junho, Mercosul e União Europeia firmaram a criação daquela que é considerada a maior área de livre comércio do mundo. De um lado, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai e, de outro, 28 países europeus entraram em acordo para vender e comprar produtos com taxas de importação e exportação reduzidas e, em alguns casos, completamente zeradas.
Ainda não está valendo. Depois das muitas idas e vindas na mesa de negociação, o acordo firmado em Bruxelas precisa ser aprovado pelo Parlamento Europeu e por cada casa legislativa dos membros do bloco. O documento já enfrenta movimentos contrários dos dois lados, como ecologistas franceses que criticam o uso de agrotóxicos nos produtos do Brasil e que vão acabar indo para lá.
São tratativas que devem demorar mais um tempo, mas empresários e entidades já reagem a notícia, uns com bons olhos, outros, nem tanto. Não há dúvidas de que o acordo, se aprovado, vai trazer consideráveis impactos. E Montenegro e região não estarão alheios a eles.
Citricultura será segmento beneficiado
Aprovado o acordo, haverá um período de dez anos para que, gradativamente, 91% dos produtos que a União Europeia exporta para cá fiquem sem tarifas. Em sentido contrário, no mesmo período, 72% do que é enviado para lá deve ter o mesmo corte. Aí entram muitos itens do setor agrícola brasileiro. Dentre eles, é especificamente citado o suco de laranja.
“Sempre é bom igualar as condições de concorrência entre os produtos agrícolas. Isso possibilita que as reais condições de produtividade e qualidade apareçam”, analisa o presidente da Cooperativa dos Citricultores Ecológicos do Vale do Caí (a Ecocitrus), Maique Kochenborger.
96% do suco de laranja produzido na empresa montenegrina já vai para França, Itália e Alemanha, na União Europeia. O corte da tarifa representa redução de custo, diminuição de preço no exterior e, com isso, possibilidade de expansão. “O acordo possibilita ampliar o leque de clientes que têm interesse em consumir orgânicos e que não têm acesso em virtude do preço”, destaca Kochenborger. Ele aguarda com expectativa o comportamento do mercado com a queda gradual das tarifas.
O documento divulgado com o acordo também fala na isenção das taxas das frutas e exemplifica melão, melancia, laranja e limão. A bergamota não é especificamente citada, mas a possibilidade existe. Se confirmada, a fruta símbolo de Montenegro deve ser ainda mais valorizada.
180 toneladas de frango terão isenção
Muito do que não vai ter tarifas totalmente cortadas para a venda intercontinental também será beneficiado, mas em um sistema de cotas. São produtos considerados “sensíveis” aos europeus, que não quiseram prejudicar seu mercado interno com muita oferta do produto importado. É o caso, por exemplo, do açúcar, do etanol e de um dos produtos mais importantes para Montenegro no quesito exportação: a carne de frango.
Desta, haverá uma cota de 180 mil toneladas por ano que será exportada do Mercosul para a União Europeia sem tarifa nenhuma. Motivo de comemoração para a JBS Aves, que tem frigorífico aqui no Município; e também para o Grupo Vibra, que tem sua sede instalada aqui. O mesmo para todos os produtores de aves espalhados pelo interior da região e que são integrados às duas empresas.
“O ano de 2019 marca um novo momento para o setor de proteína animal do Brasil, com a possibilidade de embarcar um fluxo maior para um dos mais relevantes mercados consumidores globais”, exalta o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Francisco Turra. É a entidade que representa o setor no país. “Ao mesmo tempo, o acordo pontuará critérios mais justos e transparentes nos negócios entre os dois blocos”, adiciona.
Medida ainda não agrada a todos
Dentre os pontos acordados estão isenções para produtos manufaturados e industrializados. O setor calçadista, com nomes representativos na região, como a Kildare, de Maratá, é um dos que comemorou a novidade. O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados, Heitor Klein, ressaltou a importância do acordo, apontando que, ainda com as taxações, no ano passado, 17,7 milhões de pares de calçados feitos no Brasil foram exportados para a Europa.
Mas nem todos comemoram esse “acerto”. Em até quinze anos, a tarifa sobre a importação dos carros europeus para cá vai ser zerada. É bom para quem compra, que deve ter acesso a produtos importados por preços mais acessíveis, mas não tão bom para quem produz dentro do Mercosul e pode perder a preferência no mercado interno. O mesmo receio enfrentam os produtores de vinho da Serra Gaúcha e até produtores de queijo, que já se manifestaram contrários ao acordo da forma como ele está.
Até são previstas algumas medidas protetivas nesse sentido. Elas ainda não estão muito claras, mas colocam que existirão mecanismos para enfrentar práticas desleais, dando subsídios aos internos que se mostrarem prejudicados. Também deve haver uma lista com nomes registrados de cada país que não poderão mais ser utilizados por produtores de outras áreas. A cachaça do Vale dos Vinhedos, por exemplo, não poderá ter seu nome usado em mercadorias vindas da Europa.
Devem ter isenções, ainda: maquinários, peças, produtos químicos e farmacêuticos, vestuário, tecidos, chocolates, refrigerantes, ovos, arroz, carne suína e mel. A maioria, itens que também são produzidos, consumidos ou demandados pelo mercado local. O impacto disso é inegável.
ACI Montenegro/Pareci Novo tem boas expectativas a partir do acordo
O presidente da Associação Comercial, Industrial e de Serviços (ACI) de Montenegro/Pareci Novo, Karl Heinz Kindel, é um dos que comemora o acordo. Ele avalia que o acerto, além de auxiliar a suprir necessidades complementares de ambas as partes, deve incentivar a revitalização do Mercosul e facilitar o fechamento de acordos de livre comércio com outros blocos econômicos.
O Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo, apesar de figurar entre as maiores economias. Então, esta parceria vai acelerar o processo de internacionalização do país, o que é muito salutar e trará benefícios a população local”, destaca.
Presidente da entidade que engloba a maioria das empresas locais, Kindel concorda que o aumento na concorrência pode trazer desafios para a indústria brasileira, que vem sofrendo com a ociosidade das fábricas, mas vê a questão de forma otimista. “Ao mesmo tempo que apresentará desafios, facilitará a aquisição de tecnologias, máquinas e equipamentos de forma mais barata, permitindo uma atualização do parque industrial e trazendo, como consequência, uma melhoria da competitividade”, finaliza.