Moradores de rua têm abrigo no Recreo em noites frias de Inverno

A casa de passagem realiza acompanhamento humanizado de cidadãos

Os últimos dias têm sido de frio intenso em Montenegro, e para pessoas em situação de rua o Recreo é um local de maior conforto e cuidado. O Retiro Comunitário de Reabilitação Ocupacional (Recreo) tem sede administrativa no Centro de Montenegro e fazenda na localidade de Passo da Cria, além de uma fazenda para jovens e adolescentes na zona rural e um espaço na zona urbana para mulheres.

Acomodações são organizadas pelos abrigados

O Recreo é a fazenda terapêutica mais antiga do RS, fundada em 1989. Na sua sede ocorre o programa “Casa de Passagem Casulo”, destinado a pessoas em situação de rua. Mas muito além de cuidados básicos como banho e alimentação, o projeto busca a integração e mudança dessas pessoas. “A idéia principal do projeto é buscar a transformação dessas pessoas que estão em situação de rua. Nós vamos além do necessário”, diz o vice-presidente da Recreo, Nelso Lopes de Sousa.

Programa é elogiado por seus usuários

O programa é financiado pela Prefeitura de Montenegro, e o pagamento é mensal, com um limite de 15 vagas. “Nós temos um limite de ingressantes, mas nós nunca negaremos acolhimento”, fala Nelso. Local também abriga aqueles que estão em recuperação para seguir para o tratamento de dependência química na fazenda.

Com as temperaturas baixas, aqueles que forem se abrigar no Recreo ganham banho, refeições e cuidado especial com profissionais qualificados, dentre eles médico, psicólogos e enfermeiros. “Nessa época de frio muitos vêm procurar, mas não podemos obrigar a ficar, isso é opcional”, explica o vice-presidente. Inicialmente o abrigado pode ficar três dias, mas dependendo da situação é expandido.

O Recreo faz parte da Rede de Atenção em Saúde, e do Serviço de Assistência Social do município, trabalhando diretamente com o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). “Nós sempre encaminhamos eles para o Creas, porque a nossa função não é só fornecer lugar para dormir e comer, mas integrar a sociedade e a família também, além da busca de um tratamento especializado”, relata Nelso.

De acordo com a diretora de Assistência Social, Leila Ternes, as pessoas em situação de rua são atendidas pela Prefeitura em casos de denúncias. “Recebendo denuncia nós vamos verificar e encaminhar para a Recreo”. Na secretaria também ocorre a distribuição de roupas e cobertores a quem desejar.

Diversas atividades são realizadas em conjunto no espaço do Recreo

Disciplina e boa convivência
Atualmente a Casa de Passagem Casulo conta com cerca de 13 pessoas, que possuem uma rotina de disciplina e trabalho. No Recreo todos colaboram com algo, são quatro alimentações por dia e quem as prepara são os próprios abrigados. A limpeza e manutenção da casa também é responsabilidade de todos, e é proibido beber ou usar alguma droga ilícita.

Os horários para as atividades são regrados, e todos já estão acostumados com a rotina do local. O respeito e a educação também são essenciais; ao terminar a refeição se escuta um “Obrigado, cozinha” dito aos colegas que doaram seu tempo na produção do prato.

Em busca de uma melhora
Todos ali possuem sua própria história, mas compartilham da mesma vontade de superar os vícios. Luis Carlos da Silva, de 40 anos, chegou na manhã desta quinta-feira, 4, no Recreo, e está na Casa de Passagem. Ele irá começar o acompanhamento com o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) para decidir como será seu tratamento.

Refeições são feitas em horários regrados e em conjunto no refeitório

“Eu procurei o Caps e eles me mandaram aqui, porque eu não tenho para onde ir, e posar na rua não tem como, é muito frio”, relata Luis. Com problemas com o alcoolismo, o homem já passou pelo projeto Casulo e garante que foi bem tratado. “Aqui é bom, já tive no Recreo como casa de passagem antes. Foi quando sai da prisão e não tinha para onde ir. Eu estava na praça dormindo e me contaram do lugar. Eu fiquei uns 10 dias”, relembra.

Sobre a sua família, Luis lamenta ao afirmar que hoje pode dizer que não restou quase ninguém ao seu lado. “Hoje eu posso dizer que não tenho família, perdi por causa do álcool. Os meus pais são falecidos, e eu tinha uma esposa, mas ela não quer saber de mim e fica complicado de ver meus filhos”, explica ele.

Como muitos, Luis Carlos começou a beber aos poucos, mas com o tempo foi exagerando e nem ficava mais em casa. “Era dia e noite no bar, o que eu adquiria ia tudo para o bar”, diz. Com o objetivo de parar totalmente com a bebida, ele relata que, sem a ajuda de alguém, não conseguiria. “Já tentei parar com a bebida, porque eu tenho problema com depressão. Eu até paro por um tempo, mas então acontece algo e eu volto a beber”, comenta Luis.

Anildo Rodrigues, de 58 anos, também tem problemas com o alcoolismo e está há três meses na Casa de Passagem do Recreo. No seu terceiro tratamento, iria terminar o reforço e seguir para a fazenda, porém, devido à hepatite, problema ocasionado pela bebida, terá que continuar na sede por mais três meses.

Natural de São Leopoldo, Anildo morou muito tempo em Montenegro, e relata que se não estivesse no Recreo hoje, provavelmente estaria bebendo em algum lugar. “Quero parar, assim como estou há cinco anos sem fumar cigarro”, afirma. Anildo conta que a sua rotina era beber o dia todo. “Eu ficava muito fora [de casa], vivia bebendo. Vinha de São Leopoldo para cá, ficava na rua. Dormi muito na rua, até que resolvi vir para cá”, conta o morador.

Ele expressa a saudade do filho de 16 anos, que é usuário de drogas e passa também por problemas, mas Anildo garante que se sente bem onde está. “Esse é um lugar muito bom, a gente se dá bem e o acolhimento é bom. Às vezes me sinto melhor aqui do que em casa, porque em casa às vezes eu tenho uma discussão e saio para rua e já bebo de novo”, fala.

Últimas Notícias

Destaques