O domingo de primeiro de outubro de 2017 – há exato um ano – foi um dia quente e abafado que culminou em um dos temporais mais devastadores da história recente de Montenegro. A chuva e os ventos de até 120 quilômetros por hora atingiram diversos bairros da cidade, avariaram cerca de 500 residências, derrubaram postes, derrubaram árvores e acumularam prejuízos que, infelizmente, até hoje não foram totalmente reparados. Tem muito montenegrino que ainda sofre as consequências daquele fim de tarde.
Na casa de Cleci Augusta da Rosa, no bairro Aeroclube, moram seis pessoas. A maioria é menor de idade. Móveis estragados há um ano ainda não puderam ser repostos. Mesmo carente, a família não conseguiu ser beneficiada por nenhuma das 1.403 telhas doadas pelo governo estadual ao município na segunda quinzena de outubro. Um dos filhos ainda chegou a ser beneficiado pelo saque do FGTS liberado às vítimas, mas o valor disponível era de míseros R$ 120,00. Ainda chove dentro da residência.
Uma área coberta na frente da casa, usada para estender roupas e para o uso diário, foi desmanchada para que as telhas pudessem ser realocadas nos pontos internos em que o material original foi avariado pelo temporal. A água que entra hoje ainda passa em alguns locais onde não foi possível arrumar devidamente, dada a falta de recursos para a aquisição de material. Algumas cumeeiras foram postas de improviso.
Em uma área comum, a família ainda não conseguiu fechar a abertura entre a parede e o início do telhado. “Entra muito frio. Esse último inverno foi bem sacrificoso”, lamenta a matriarca. No temporal da última semana, todo o pesadelo daquele outubro de 2017 lhe voltou à mente. “Graças a Deus que não deu nada de grave”, ressalta.
Não é o caso de Janete Pereira, moradora do bairro Senai. Vítima das forças da natureza no temporal passado, ela voltou a somar perdas com o temporal recente. Hoje, ela clama por ajuda. “A gente já tem pouco. Quando vê, não tem mais nada”, avalia, emocionada.
Janete é desempregada desde que teve problemas de saúde. Moram outras seis pessoas em sua residência. Cinco são menores. O que trabalha atua na citricultura, pelo interior, e depende do bom tempo para ter serviço. A renda é de cerca de R$ 200,00 por semana.
“Ano passado foi terrível”, recorda a proprietária. “O nosso telhado foi parar na casa do vizinho. Molhou tudo”. A família também não conseguiu o benefício de doação de telhas, nem qualquer outro auxílio do poder público. Com muitos pertences avariados, foi com a solidariedade de vizinhos que, aos poucos, eles foram conseguindo novos móveis. Parte do telhado foi emprestado por um conhecido e, em um ponto da cozinha, era um carpete que continha a água da chuva que vertia do forro.
Com o temporal desta semana, a situação piorou. De novo, telhas voaram. De novo, entrou água na casa. “Ficou alto de água. Quando mais a gente botava a água pra fora, parecia que mais entrava”, lembra Janete. Havia um bebê de 10 dias na residência no momento do ocorrido e o desespero era grande. A montenegrina conta que novamente foi atrás de ajuda e nada conseguiu. “Tu corre pra um lado e corre pro outro procurando um auxílio. Nada”, lamenta.
Bairro Estação: Loteamento Bela Vista foi fortemente atingido
No bairro Estação, o Loteamento Bela Vista é foco de muita polêmica, pois teve as casas construídas com diversos vícios de construção. Há, hoje, ações judiciais e até uma CPI na Câmara de Vereadores, que investiga como se deu a instalação das moradias. Mal feitas, as residências foram severamente atingidas pelo temporal do ano passado.
Na rua das Gardênias, por exemplo, só duas casas saíram ilesas. As outras todas sofreram avarias. Desde o ano passado, a “moradora” Mirian Gonçalves está vivendo de favor na casa de parentes, pois a sua acabou sendo condenada por um engenheiro da Prefeitura. Sem reboco, tijolos inteiros caíram das paredes durante o vendaval. Ela é grata por estar viva, mas lamenta sua realidade onde, hoje, precisa trabalhar na mercearia do cumpadre pelas peças que lhe foram cedidas para viver.
Mirian chegou a ser contemplada pela doação de telhas do Estado, mas, com a casa condenada, não pode usá-las. O material todo está largado no pátio, ainda sem uso. “Me disseram que iam vir, com pedreiro, pra fazer a reforma. Mas nada”, conta.
A situação é complicada. A casa foi doada pela Prefeitura a uma prima de Mirian, que lhe fez o repasse. A moça conta que tem um termo de doação, mas diz que o município prioriza os moradores “originais” para fazer as reformas. Ela diz, ainda, que tentou contato com a Administração para construir outra casa no lugar, de madeira, mas isso não lhe foi permitido. “Não deixam tirar do padrão que é”, ressalta, ainda sem casa e no aguardo.
Temporal provocou problemas por toda a cidade
O dia 2 de outubro de 2017 amanheceu para mostrar uma Montenegro que tentava se reerguer. As lojas de materiais de construção estavam lotadas de gente que, com poder aquisitivo, precisava reformar suas casas antes que a chuva voltasse. Proprietária de uma madeireira na Via 2, Marcia da Silva lembra que abriu a loja as 6h30min, já com fila na porta. Vendeu 4 mil telhas até o meio dia.
“Foi uma loucura. A gente não esperava que fosse ser daquele jeito”, relata. A empresária revela que, no contato com os compradores, soube de algumas lojas que se aproveitaram da situação e superfaturaram o material. “A gente fez o mesmo preço. Não é nessas horas que vai se aproveitar dos outros”, afirma.
Na loja de Solange Wadenphul havia pouca telha a pronta-entrega. A alta foi na venda de lonas, que deram cobertura provisória aos prédios avariados. “Já na noite do temporal, alguns começaram a nos ligar. Tinha faltado luz e ficou eu e minha filha dentro da loja cortando lona, com lanterna e lampião”, recorda. Elas tentaram ir a alguns locais para entregar o material, o que era difícil dada a grande quantidade de árvores e postes caídos nas vias.
Em um cenário de destruição, até no Cemitério Municipal algumas árvores caíram, quebrando o muro e algumas lápides. Relatos dão conta de corpos expostos após túmulos recém construídos terem sido quebrados.
No Centro, a loja onde funcionava o Oba Oba Festas – na Ramiro Barcelos – acabou incendiando após um curto ter dado início às chamas no momento do temporal. Moradores do bairro se uniram para apagar o fogo que, com a chegada dos bombeiros, foi contido por volta das 20h. Hoje, a loja funciona em novo endereço, na rua Buarque de Macedo.
Prédios públicos também não saíram ilesos. Dentre as escolas estaduais, por exemplo, cinco foram bastante afetadas. Uma árvore antiga derrubou o muro da Delfina Dias Ferraz. No Colégio Paulo Ribeiro Campos, o Polivalente, toda a quadra coberta de esportes veio abaixo e, até hoje, não há previsão para a reconstrução. Alunos do período noturno estão fazendo a educação física no estacionamento pois, no local da edificação derrubada, não há iluminação.
A Escola Ivo Bühler (Ciep) contabilizou cerca de R$ 20 mil em prejuízos com a perda de computadores, impressoras e da central telefônica, que molharam após as telhas do prédio terem sido avariadas. O diretor, Samuel Borges, conta que não há nem previsão da vinda de novos equipamentos do tipo. “Estamos usando o que tínhamos das outras salas, mas o que foi perdido, ficou”, lamenta.
Quanto às telhas, a escola instalou provisoriamente um material de zinco que tinha em seu poder. São necessárias 26 telhas no prédio e, para elas, o governo do Estado liberou, em abril deste ano, o valor de R$ 13.743,10. Samuel recusou. “Eu recebi o valor, mas achei um absurdo aquilo, pela quantidade de telhas que era. Pedi para que refizessem o cálculo”, revela. Não há nova previsão, diante disso.