MADALENA Bühler faleceu nesta segunda-feira à tarde, vítima de um infarto, aos 70 anos
Dizem que, dos mortos, só se deve falar bem. Quando o velório é de um político, seguir a regra, às vezes, exige malabarismos semânticos e destreza para desviar de temas espinhosos. Não é o caso de Maria Madalena Bühler, que faleceu nesta segunda-feira, aos 70 anos, depois de sofrer um infarto na casa de repouso em que estava internada há alguns anos para tratar dos efeitos do Mal de Alzheimer. Primeira mulher com votos suficientes para exercer um mandato inteiro na Câmara, entre 1983 e 1988, foi também a única representante do sexo feminino que sentou na cadeira mais importante do Palácio Rio Branco, sede da Prefeitura, de 1997 a 2000.
Ontem, enquanto algumas pessoas se despediam dela e abraçavam os familiares, no curto e restrito velório imposto pela pandemia do novo coronavírus, as lembranças brotavam. Todas boas. Falavam da Madalena dona de casa, amiga de todos, sempre disposta a ajudar a quem precisava. Da Madalena carnavalesca, que nos anos 70 e 80 ajudou a sacudir Montenegro com os desfiles da escola de samba Acadêmicos da Santo Antônio. Da Madalena mãe e avó, protetora e conselheira. E, principalmente, da Madalena política, muito firme em suas convicções, honesta e sempre humilde.
Nascida em 1949, única mulher numa família de quatro irmãos, Madalena era filha de um ferroviário e de uma dona de casa. Aos 13 anos, já demonstrava pendor para a Política, ao entregar uma carta ao então governador Leonel Brizola pedindo melhores condições de trabalho para os encarregados dos trens e dos trilhos. Em 1970, casou-se com Rivo Bühler, já falecido, e dessa união vieram três filhos: Riviane, Rivana e Rivo Junior.
Acostumada a trabalhar nas campanhas eleitorais do marido, que já havia sido vereador, em 1982, Madalena decidiu ela mesma disputar uma vaga na Câmara. Eleita pelo PDT, notabilizou-se pela fiscalização dos atos do Executivo, o que lhe rendeu grande popularidade. Oito anos depois de deixar o Legislativo, voltou à Política novamente, desta vez elegendo-se prefeita com a maior votação proporcional da história. 60,1% dos eleitores apostaram nela para governar Montenegro.
Depois de exercer seu mandato, a ex-prefeita voltou “para casa”, como costumava dizer, mas atendeu a um novo chamado para concorrer em 2004. Então filiada ao PTB, não conseguiu repetir o desempenho da eleição de 1996 e acabou ficando em terceiro lugar. Em 2008, já apresentando os primeiros sintomas do Mal de Alzheimer, retirou-se da vida pública.
Lideranças e antigos assessores lamentam morte
Kadu Müller – prefeito municipal: “Um enorme sentimento de pesar sobrevoa o município de Montenegro. Maria Madalena Bühler não está na história da cidade apenas por ter sido a primeira prefeita eleita, mas por todo o seu legado que aprendemos e, com muito orgulho, seguimos, como homens de dignidade e de construção, buscando o melhor, como ela sempre fez.”
Neri de Mello Pena, o Cabelo – presidente da Câmara: “Madalena Bühler foi uma mulher à frente do seu tempo. Foi uma grande administradora, fazendo um equilíbrio nas contas da Prefeitura e trazendo indústrias. Ela deixa sua história de conquistas na nossa memória.”
José Breno da Cruz – ex-secretário geral: “A Madalena era um ser humano inigualável e uma das pessoas mais íntegras que conheci. Como prefeita, soube governar para todos. Sempre teve um olhar atento e carinhoso, capacidade de diálogo com o setor produtivo e visão de futuro. Resolveu problemas muito sérios (dívidas pendentes) que o município tinha com o INSS, a CEEE e o CURA, ao mesmo tempo, trazendo vários novos investimentos.”
Assis Vieira – ex-chefe de gabinete: “A Madalena ficará na memória dos montenegrinos não só por ter sido a primeira vereadora e prefeita mulher, mas também pela sua forte atuação na cultura, como no Carnaval, por exemplo. Somamos a tudo isto a sua compaixão pelos mais pobres. Ter sido seu chefe de gabinete foi uma honra muito grande, pois, além de todo o aprendizado, ela me proporcionou, de certa forma, fazer parte da sua bela história.”
Opinião
A dona de casa que quebrou a panelinha
Em 1996, Montenegro era governada há quase 30 anos pelo mesmo grupo político. Lideranças da antiga Arena e do seu sucessor, o PDS, exerciam o poder ininterruptamente. Descontentes com a situação e, principalmente, com a estagnação da cidade, diversas legendas uniram forças e criaram a União Montenegro Maior. Madalena Bühler e o então vereador Roberto Braatz foram recrutados para representar o grupo na disputa.
Embalada pelo refrão “pra quebrar a panelinha e Montenegro entrar na linha”, a dupla obteve a maior vitória já registrada na história, conquistando 60% dos votos. Terminada a contagem e promulgados os resultados, começaram as desavenças. Os partidos da coligação formaram um conselho político, que funcionaria como órgão de assessoramento da prefeita. E, como era de se esperar, começou uma grande disputa por cargos.
Num primeiro momento, a prefeita cedeu às pressões, mas tentou manter uma cota pessoal de indicações no primeiro e no segundo escalões. Madalena também tinha dificuldades de relacionamento com o vice, que logo apareceram. Na primeira vez em que ela saiu de férias, Braatz assumiu e demitiu o braço direito da prefeita, o então secretário-geral, José Breno da Cruz.
A relação com os partidos piorava mês a mês. Em 1998, Madalena foi expulsa do seu partido, o PDT, porque insistiu em apoiar o candidato do PMDB ao governo do Estado, Antônio Britto, que buscava a reeleição. A União Montenegro Maior foi dissolvida e a prefeita fez grandes mudanças no secretariado. Inclusive, chamou de volta ao governo integrantes das gestões anteriores, da chamada “panelinha” que havia sido quebrada dois anos antes.
Se, do ponto de vista político, o governo Madalena foi turbulento, na gestão do Município, ela provou ser habilidosa. Muitas vezes atacada por ser uma “dona de casa”, a prefeita aproveitou conceitos de economia doméstica na Administração. Primeiro, arrumou a casa, renegociou dívidas que o Município tinha com a CEEE, o INSS e o governo do Estado por conta do projeto Cura, tirando a cidade do Cadastro de Inadimplentes. Depois, passou a oferecer incentivos para atrair indústrias e gerar empregos e, no último ano, asfaltou dezenas de ruas, em quase todos os bairros da cidade.
Quando deixou o governo, Madalena já não tinha a popularidade de que gozava antes da eleição, mas seu trabalho de saneamento das contas públicas e atração de investidores é lembrado até hoje. Graças a isso, seus sucessores puderam investir em máquinas e equipamentos, realizar novas obras e multiplicar o orçamento. Madalena Bühler entra para a história por provar que a coragem, a disposição, o trabalho sério e honesto podem mudar a realidade. Para melhor!
Márcio Reinheimer – jornalista