MENINAS de sete e de 12 anos também se tornaram vítima do estuprador
Uma jovem esperou atingir a maioridade para denunciar os abusos sofridos do pai. O caso, que chegou ao conhecimento do Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil, nesta semana ilustra o sofrimento enfrentado por milhares de outras meninas e meninos Brasil afora.
Para preservar as vítimas, a garota será identificada apenas como Maria. Aos 12 anos, ela passou a ser estuprada pelo próprio pai. Não foi uma nem duas vezes que o homem atacou a menina. Foram seis anos de sofrimento físico e psicológico.
A mãe da vítima trabalhava fora e cabia ao pai passar a maior parte do tempo com ela e suas irmãs. Ao que se sabe, a esposa não desconfiava da atitude do marido. E a filha não contava nada por medo. O agressor chegou a ameaçá-la de morte várias vezes caso “abrisse a boca”.
Mas o tempo foi passando e a situação ficou pior. A menina, já virando mocinha, viu que o pai também estuprava as irmãs dela, uma de sete e outra de 12 anos de idade. Com medo de denunciar o crime, a jovem traçou um plano para livrar a si própria e as irmãs daquele sofrimento. Ela esperou completar 18 anos para poder entregar o pai às autoridades e pedir a guarda das irmãs. E assim o fez.
Atualmente o abusador está preso. Sobre como estão e o que fazem as vítimas, não foram divulgadas maiores informações. A história chegou nesta semana ao conhecimento do Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil de Montenegro.
A reportagem poderia apresentar somente estatísticas desse tipo de violência, mas números por si só não revelam o sofrimento por trás de cada registro. O assunto ainda é tabu, poucas pessoas expõem uma violência sofrida, até por que “cutucar” a ferida faz com que volte a doer. Contudo, ficar calado significa abafar a dor, que continuará machucando.
Para o coordenador do Conselho Tutelar de Montenegro, Marcos Gehlen, o Tuco, o abuso sexual é um mal inadmissível que, infelizmente, tem se mantido ao longo dos séculos. “Acho que isso é uma praga na humanidade. É uma doença, uma patologia. Veja que no século XXI a gente ainda enfrenta essa situação”, analisa o conselheiro.
Apoio ao enfrentamento à violência sexual Infanto-juvenil
Atos de violência sexual contra crianças e adolescentes devem ser denunciados à Polícia. Em Montenegro, há uma unidade especializada nesse tipo ocorrência. Ela está instalada junto à Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), na Central de Polícia do Vale do Caí. O endereço é Avenida Júlio Renner, 3605, no bairro Santa Rita. O telefone de contato é o 3649 0000, ramal 3.
Outras ferramentas oferecidas para quem precisa de ajuda são o Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil e o Conselho Tutelar. O comitê trabalha a prevenção e o empoderamento das vítimas para a denúncia. Ambas as entidades promovem ações articuladas com escolas e com a comunidade, com o objetivo de alertar sobre o risco que pode estar rondando, ou já ter se instalado, nas casas. “Na maioria dos casos, o abusador está dentro de casa. Quem deveria proteger é que está cometendo o crime”, diz a coordenadora do Centro de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS), Vera Scherer.
A delegacia não forneceu números de casos registrados. O Comitê apresentou dados da violência sexual referentes aos meses de janeiro e fevereiro de 2019 e do mesmo período deste ano. Nos dois primeiros meses do ano passado, foram sete casos atendidos. Neste ano, houve três a mais, totalizando 10 vítimas. “Entendemos que esse crescimento se deve justamente ao trabalho de fortalecimento das vítimas para a denúncia”, comenta Vera.
Como o Comitê pode ser acionado?
O Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil deve ser procurado sempre que necessário, através da Coordenação junto ao CREAS, rua São João, 1.065, ou pelo telefone 3649 1480.
Isolamento social impacta sobre as denúncias
No começo deste ano, o Conselho Tutelar lançou um projeto chamado De Mãos Dadas com a Escola. A iniciativa visa promover palestras e orientar sobre crimes, direitos e deveres. Contudo, a interrupção das aulas, por conta do coronavírus, adiou o projeto.
“A pandemia prejudicou a comunicação dos educandários com o conselho tutelar, em qualquer nível, não só na questão do abuso sexual”, observa o conselheiro tutelar Marcos Gehlen. O número de casos de violência relatados ao conselho teve queda, principalmente, com a suspensão dos atendimentos presenciais, conforme determinado por decreto do Município. Os serviços na sede já foram retomados, mas a procura ainda é tímida.
No primeiro trimestre de 2019 o conselho tutelar de Montenegro prestou 362 atendimentos. No mesmo período de 2020, foram atendidos 114 casos a mais, chegando a 476 atendimentos. Contudo, em abril, a demanda caiu significativamente, como consequência da pandemia, mas os números não foram informados. Os atendimentos incluem casos de abuso sexual, violência, falta de vaga na educação, drogadição, conflito familiar, orientação, e outros. Os casos de conflito familiar são os que possuem maior incidência na atual gestão, 2020/2023.
Ações em alusão ao Dia Nacional de Combate ao Abuso Sexual
A próxima segunda-feira, dia 18 de maio, marca os 20 anos da Lei Federal nº 9.970/2000, que institui como crime a violência sexual contra crianças e adolescentes. Devido à pandemia do novo coronavírus, em Montenegro, este ano não haverá programação alusiva à data. Mas o Conselho Tutelar programou três iniciativas para marcar a ocasião.
A primeira delas é uma boa notícia para os conselheiros e também aos usuários do órgão. A partir desta segunda, a sede estará em novo endereço, na rua Coronel Antônio Inácio, 57, próximo à Praça da Matriz. “Para o atendimento, vai ser muito melhor. Melhora as condições de trabalho pra nós e também para os usuários”, diz o coordenador.
Conforme Tuco, uma negociação com a proprietária do imóvel, que também é dona da casa onde o conselho estava instalado até então, na rua João Pessoa, tornou possível manter o mesmo valor pago no atual endereço. “O valor que ela queria era maior, mas nós conseguimos fazer com que a locação de um prédio muito melhor saísse pelo mesmo valor. Não vai aumentar em nada os gastos para o município, que paga R$ 2.170,00 pelo aluguel”, acrescenta Tuco.
A inauguração do espaço ocorre às 9h. Representantes de outros setores da gestão municipal poderão realizar visitas ao longo do dia, sem aglomerações. “O novo endereço possui salas amplas, climatizadas, prédio de alvenaria, com acessibilidade, em um local discreto. Era uma demanda antiga das demais gestões do conselho”, comemora o Marcos Gehlen.
No dia também será publicado, no Facebook do conselho, um vídeo com depoimentos de convidados falando sobre o tema da violência sexual contra crianças e adolescentes. Na data, a praça em frente ao conselho será cercada por cartazes, feitos por alunos da rede municipal de ensino durante a quarentena. “É uma forma de envolver as escolas e todos os alunos”, diz Tuco.
Sobre o dia
18 de maio é o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infantil (Lei 9.970/00)
Esta data foi escolhida em virtude do crime cometido contra Araceli Cabrera Sanches Crespo, uma menina de apenas 8 anos de idade, abusada sexualmente e brutalmente assassinada em 18 de maio de 1973.
O Dia simboliza uma conquista na luta pelos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes no território brasileiro.