Flávio Kern desafia a si próprio e mostra que há tempo para fazer tudo que se deseja. Para ele, não existem limites
Você trabalha, estuda, frequenta a academia, sente-se sobrecarregado e acha que não está sobrando tempo para fazer mais nada? Conheça a história do Flávio Pinheiro Machado Kern, de 35 anos. Apesar dos problemas de déficit cognitivo, ele mostra que é possível aproveitar bem cada minuto das 24 horas do seu dia. O jovem supera seus próprios limites e, a cada ano, busca novos conhecimentos. Além disso, ainda divide o que aprende com seus amigos.
Flávio acorda cedo. Às 6h da manhã, ele já está pronto para trabalhar. Sua rotina é como a da maioria dos cidadãos, de segunda a sexta-feira, oito horas por dia. Há sete anos, ele conquistou a independência financeira, quando começou a trabalhar no projeto Tanagro, uma iniciativa da empresa Tanac em parceria com a Apae de Montenegro.
Depois de cumprir o expediente, Flávio retorna ansioso para casa. Mas não se engane: com ele, nada de descansar e assistir televisão, como a maioria dos trabalhadores faz no retorno ao lar. Chegar em casa é só mais uma etapa de sua movimentada rotina.
Membro atuante da Associação Ciclística Montenegrina (Aciclomont), todas as quartas-feiras ele tem encontro marcado com a turma de ciclistas para dar um passeio pela cidade. A paixão pelo ciclismo é tão grande que a família precisou entrar em acordo com ele para limitar o número de bicicletas na casa. Atualmente, Flávio tem três bikes.
Quando não está trabalhando ou pedalando, Kern busca aprender coisas novas. A arte é uma das áreas que mais o encanta. Ele é aluno do Curso de Atelier Livre da Fundação Municipal de Artes de Montenegro (Fundarte). Compor trabalhos com mosaico é um de seus hobbies favoritos. Por isso, eles estão por toda parte, desde a personalização de uma das bicicletas até nos quadros decorativos da casa. A figura favorita do artista é a tulipa. A flor é representada por ele em vários trabalhos.
E levando em conta a frase que diz “tudo que é belo é para ser mostrado”, Flávio expõe e vende suas obras no Brique da Estação, evento realizado em dois domingos de cada mês no complexo da Estação da Cultura. Ele orgulha-se em fazer parte dos briqueiros e participa com um largo sorriso no rosto. Está achando que essa história acaba por aqui? Saiba que ainda tem mais.
“Ele é um exemplo à sociedade”, diz a mãe
Celina Amélia Pinheiro Machado, 62, é mãe de cinco filhos. Flávio é o caçula da família. Para a mãe, ele é motivo de orgulho e um exemplo de superação de limites.
Quando criança, médicos o diagnosticaram com autismo. Porém, mais tarde, foi descoberto que não se tratava desse transtorno. Segundo Celina, foi constatado que Flávio apresentava um tipo de déficit cognitivo, ou seja, uma alteração na maneira como o indivíduo processa uma informação. Por isso, ele teria dificuldades no aprendizado formal.
Porém, ainda criança, o garoto mostrou que não se renderia às limitações que o destino havia lhe imposto. A mãe conta que ele desenvolveu técnicas e habilidades compensatórias que o ajudaram a levar uma vida praticamente normal. O processo de alfabetização não foi como esperado, mas sentidos como o olfato ajudaram o menino a identificar, por exemplo, que o cheiro da tinta fresca do jornal significava que este era atual. Assim, o menino levava as notícias diárias para serem lidas pela mãe.
Ter permitido ao filho se integrar no convívio social foi fundamental para que se tornasse a pessoa feliz que é hoje, acredita Celina. De acordo com ela, Flávio é produtivo e vem fazendo a diferença por onde passa. “Ele é auto-suficiente, não um peso na sociedade, ao contrário. Isso deve ser exemplo para todos, pois a maioria das famílias esconde seus diferentes”, comenta. “Eles também têm direitos”, conclui.
Flávio gosta de praticar atividades físicas. Até o ano passado, frequentava a academia regularmante e logo pretende voltar a fazê-lo.
Como escoteiro, Flávio divide conhecimento
Flávio é membro do Grupo de Escoteiros Acácia Negra. Ele é um dos chefes dos lobinhos, denominação dada aos jovens escotistas.
Fazer parte do grupo é motivo de muita alegria para ele. E, por isso, mesmo quando poderia estar de folga, descansando, prefere ficar com os amigos e lhes ensinar um pouco daquilo que aprendeu nos cursos já realizados.
Por meio de oficinas, o chefe dos escoteiros compartilha as técnicas que dão base ao trabalho com mosaico. O objetivo é fazer com que seus “discípulos” sintam o mesmo prazer e satisfação que ele sente a cada obra concluída.