Vencedores da última eleição para prefeito teriam fraudado a prestação de contas da campanha
Depois de escapar da abertura de um processo de Impeachment na Câmara, há menos de um mês, o prefeito Kadu Müller tem outro problema para lhe roubar o sono. O delegado da Polícia Federal João Luiz Correa da Rocha concluiu um inquérito que apurava irregularidades na prestação de contas da coligação que elegeu Luiz Américo Aldana e Kadu prefeito e vice nas eleições de 2016. Após ouvir dezenas de testemunhas, ele propôs o indiciamento da dupla por crime eleitoral e de falsidade ideológica.
As acusações são baseadas na constatação de que várias pessoas, cujos nomes e CPFs constam na lista de doadores de campanha, na verdade, não contribuíram com a coligação PSB/PRB/SD. Na prática, significa que elas tiveram seus dados usados para “esquentar” doações com outra origem, não declarada, o que constitui crime. Algumas, inclusive, por serem de baixa renda, eram beneficiárias do programa Bolsa Família.
As denúncias foram apresentadas logo após o pleito e, embora na época o Ministério Público não tenha se oposto à diplomação dos vencedores, recomendou que tudo fosse apurado. Este trabalho foi concluído em maio e remetido ao Cartório Eleitoral de Montenegro nesta semana. Nos próximos dias, o chefe da unidade, Diego Bonato Coitinho, repassará a documentação à juíza eleitoral Priscila Gomes Palmeiro, que deve dar vistas ao Ministério Público antes tomar qualquer decisão.
Segundo o delegado, durante as investigações, foram colhidos os depoimentos de 23 pessoas sobre as quais pairavam dúvidas. Destas, pelo menos 15 asseguraram que não fizeram doações a Aldana e Kadu. Suas assinaturas também não conferem com as que estão nos recibos e elas não exercem as profissões que foram apontadas na documentação.
Em seu depoimento à Polícia Federal, o ex-prefeito Aldana, cassado em agosto de 2017 por irregularidades em licitações, admitiu que assessores lhe informaram, entre a eleição e a posse, que uma pessoa, indicada como doadora, estava desmentindo a colaboração. Ele disse que, na época, sugeriu que ela deveria procurar as autoridades. Garantiu também que não se envolveu com a captação de recursos para a campanha e nem com a prestação de contas.
Na mesma linha, Kadu Müller informou que soube das supostas irregularidades poucos dias antes de prestar depoimento, quando foi intimado. E, assim como Aldana, assegurou que não pediu ajuda financeira a ninguém durante a disputa eleitoral.
Prefeito pode perder o mandato?
O indiciamento proposto pela Polícia Federal levantou uma pergunta importante entre os montenegrinos: afinal, Kadu Müller pode perder o mandato de prefeito por causa disso? A resposta é “sim”, mas dificilmente no curto prazo.
De acordo com advogados consultados pelo Jornal Ibiá nesta sexta-feira, tudo vai depender do Ministério Público. Primeiro, a Promotoria deve analisar os elementos apresentados pela PF para decidir se formaliza ou não uma denúncia contra Kadu e Aldana. Se isso ocorrer e houver condenação à prisão, o prefeito perderá os direitos políticos e não poderá continuar governando. Entretanto, será uma decisão de primeiro grau, que certamente seria alvo de recursos nas instâncias superiores. A perda do cargo ou função pública está condicionada ao trânsito em julgado da sentença, o que arrastaria o desfecho para depois do fim do atual mandato.
Quanto aos efeitos do processo sobre as próximas eleições, em outubro do ano que vem, em caso de ação e de posterior condenação, ela teria de ser, pelo menos, confirmada em segundo grau. Nestas circunstâncias, o atual prefeito estaria impedido de participar da disputa de 2020 por causa da chamada Lei da Ficha Limpa.
O que diz a legislação?
Se, a partir do inquérito da Polícia Federal, o Ministério Público oferecer uma denúncia contra o atual e o ex-prefeito, ambos podem ser processados com base no Código Eleitoral.
– O artigo 350 prevê que é crime “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”.
– A pena, neste caso, é de reclusão por até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa, se o documento é público; e de reclusão por até três anos e pagamento de três a 10 dias-multa se o documento é particular.
– Se o agente da falsidade documental é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo ou se a falsificação ou alteração é de assentamentos de registro civil, a pena é agravada.
– Além disso, o artigo 349 do Código Eleitoral também considera crime “falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro, para fins eleitorais”. Neste caso, a pena é de reclusão por até cinco anos e pagamento de três a 10 dias-multa.