Comunidade de apoio Ibiá auxilia alcoolistas montenegrinos há quatro décadas
Estar livre de um vício é um grande passo para o dependente. Começa com o despertar da consciência de que é usuário, e que necessita de ajuda de familiares e de instituições que possam dar todo o aporte psicológico para se deixar o vício. O álcool é uma destas várias dependências. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, só no Brasil existem 4 milhões de alcoólatras. São pessoas que não conseguem controlar a vontade de beber. Para ajudar quem quer sair da dependência do álcool, existem locais chamados de Alcoólicos Anônimos (AA), comunidades com caráter voluntário, de homens e mulheres, que se reúnem para alcançar e manter a sobriedade, de forma a manter-se em abstinência de qualquer bebida com teor alcoólico.
Em Montenegro, o Grupo Ibiá é o mais antigo da cidade, e um dos mais antigos do Estado. Criado em 1979 por meio de um grupo de Porto Alegre que demonstrou interesse em criar uma comunidade na cidade, e contou com o apoio de Eloci Garcia da Motta e Irmã Maria Enilda Dambroz. Cerca de cinco pessoas participaram dos primeiros encontros que aconteceram na Igreja Episcopal, solidificando a comunidade em chão montenegrino. Atualmente, são pelo menos 20 pessoas envolvidas nas atividades do grupo, que busca a recuperação e sobriedade de seus membros. Os encontros acontecem toda segunda-feira, das 20h às 22h, no Sindicato dos Metalúrgicos.
A recuperação dos alcoólatras é feita através de um programa de testemunhos e relatos de outros membros do grupo. O objetivo é o compartilhamento de experiências de quem está sóbrio há algum tempo e tenta ajudar quem ainda não consegue ficar longe da bebida. Para que isso aconteça, o próprio dependente precisa reconhecer que é impotente perante o álcool. Quase sempre quem vai aos encontros e se identifica com os relatos é alcoólatra.
Para quem quer se livrar do vício do álcool, procurar ajuda é a forma mais fácil de iniciar o processo de recuperação. A pessoa será recebida por algum membro antes da reunião, fazendo uma primeira conversa e o deixando a vontade. Quando se tem uma pessoa nova no grupo, a reunião é voltada a ajudá-lo, visando à ajuda completa. Quase sempre quem vai até os encontros e se identifica é alcoólatra. O anonimato é irrestrito e um direito de quem é membro do grupo. O que é dito no grupo, fica no grupo.
Para comemorar os 40 anos do Grupo Ibiá, nesta segunda-feira, 30, ocorrerá um evento aberto à comunidade. A reunião ocorrerá das 20 às 21h, e a partir das 21h uma confraternização em celebração das quatro décadas de funcionamento do Grupo. Para participar, basta ir ao Sindicato dos Metalúrgicos, que fica na rua Fernando Ferrari, 1121, bairro Industrial.
“O AA salvou a minha vida”
Nos últimos 40 anos, o Grupo Ibiá vem ajudando pessoas a se livrarem do vício do álcool. É o caso de Renato, nome fictício usado para preservar a sua identidade. Usuário de bebida alcoólica desde os 14 anos, ele relata que a influência familiar foi o início de sua vida alcoólica. “Eu comecei fazer uso da bebida alcoólica no açúcar da caipira que meu pai e avô deixavam no copo. Lembro que com essa idade fui a uma festa de casamento e a gente pegava os copos que sobravam nas mesas e bebia. Eu fui pra casa carregado, totalmente embriagado. Eu chegava com o meu pai no bar, ele pedia um martelinho de cachaça e me oferecia. Para provar que ele tava criando um filho homem. Aquilo era amargo, ruim. Mas os outros ficavam faceiros, “tá criando um machão”. Mas na cabeça dele ele nunca ia imaginar que estava criando um alcoólatra com aquilo ali.”
Sóbrio há sete anos, ele afirma que relutou em aceitar que era um doente alcoólico, até realmente saber que é uma doença. “Eu custei muito. Tive muita dificuldade pra aceitar a definição que eu era um alcoólatra porque eu não aceitava que eu tinha problema com bebida. Mas quando me disseram que era uma doença, eu fiquei surpreso. É uma doença e precisa ser tratada.”
Renato enfatiza dizendo que o grupo de Alcoólicos Anônimos foi o responsável por sua recuperação. “O AA salvou a minha vida, a minha família. Eu estava em um ponto em que eu parava ou eu perdia tudo que ainda restava pra mim. Um pouquinho de dignidade, de humanidade.”
Para Renato, é a vontade de que tudo se resolva rapidamente que leva muita gente à recaída. “Hoje eu tenho para mim que a única coisa que mantém a pessoa limpa é a frequência nas reuniões. Porque você chega na sala e fica sabendo que tem um companheiro que está há 35 anos sem beber, e está lá na reunião. Os mais velhos darem o depoimento sempre faz com que os mais novos se identifiquem. As pessoas se decepcionam se não acontecer muito rápido. O AA não é uma entidade pra você parar de beber. Você vai frequentar o AA para você não voltar a beber. Esse é o fundamento do AA.”