EMEF Professora Valéria Maria Kirch completa 80 anos de história

Escola foi criada em 1939 e hoje é referência em Ensino Fundamental no município

Dois anos após concluir o curso de magistério rural do Colégio Imaculado Coração de Jesus, em São Sebastião do Caí, a professora Valéria Maria Bohn – adotaria o sobrenome Kirch ao se casar em 20 de janeiro de 1945 com Pedro Aloísio Kirch – iniciou sua carreira em 30 de junho de 1939, pela Prefeitura de Montenegro, fundando a Escola Municipal Felipe Camarão, na localidade de Dom Diogo Baixo. Aquela pequena escola que contava então com 41 alunos e foi construída através do seu esforço cresceu para se tornar a Escola Municipal de Ensino Fundamental Professora Valéria Maria Kirch, que celebra no domingo, dia 30, 80 anos de existência.

Café colonial foi uma das atrações da festa de 80 anos do educandário, que atraiu grande público

Hoje localizada em Dom Diogo Alto, na sede de São José do Sul, o educandário atende cerca de 130 alunos do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental num amplo espaço que recebe estudantes pela manhã e à tarde. Ao todo, atualmente, são 20 servidores – entre professores e funcionários – trabalhando no local. O que iniciou com uma construção de madeira transformou-se num prédio de alvenaria com cinco salas de aula, laboratório de informática, biblioteca, sala de artes, refeitório e sala para professores e direção compartilhada, além de uma amplo pátio e pracinha.

A escola teve sua transferência para Dom Diogo Alto em 1978. Dois anos depois, recebeu os alunos da Escola São Francisco de Salles. Em 1984, ocorreu a implantação da 6ª série no educandário, a 7ª série foi implantada em 1985 e, em 1986, formou-se a primeira 8ª série. Em 1988, o nome da escola foi alterado de Felipe Camarão para Professora Valéria Maria Kirch, uma homenagem à percussora da escola que faleceu em 4 de fevereiro de 1987.

Para recuperar toda essa história, a escola envolveu os alunos numa gincana. “Eles foram atrás de ex-diretores, ex-professores, onde as escolas funcionavam e fizeram maquetes das escolas”, conta a diretora Elisabete Terezinha Hartmann Jahn. O encerramento dessa atividade está programado para ocorrer na primeira semana de julho. A gestora salienta que as equipes foram formadas misturando alunos do 5º ao 9º ano.

Além disso, o aniversário de 80 anos foi lembrado por uma festa ocorrida no dia 23. Na ocasião, centenas de pessoas participaram do evento que contou com café colonial, homenagens às ex-diretoras, retrospectiva histórica e leilão de uma fogueira para retomar as grandes festas de São João que ocorriam antigamente na escola e que envolviam a comunidade.

Ex-aluna e hoje professora, Márcia diz
que foi emocionante começar a trabalhar na escola

“A gente vinha a pé, saía no escuro de manhã”, recorda professora
Das centenas de alunos que já passaram pela EMEF Professora Valéria Maria Kirch, alguns retornaram seja para educar as futuras gerações, seja para preparar o lanche dos alunos e deixar o ambiente limpo. A professora itinerante Márcia Helena Schu, 44 anos, é um exemplo disso. Hoje, ela atua na biblioteca da escola e também nas salas de aula quando outras docentes estão fazendo o planejamento das lições. De 1981 a 1988, ela foi aluna.

“Eu morava longe. Fazia quatro quilômetros e meio diariamente, na vinda e na ida”, recorda Márcia. Ela conta que vinha em grupo com outros estudantes que moravam em Dom Diogo Baixo. “A gente vinha a pé, saía no escuro de manhã”, reforça. A professora ainda guarda com carinho na lembrança as brincadeiras no pátio da escola “Nós improvisávamos brinquedos: a bola a gente fazia com saco”, revela.

Maria observou a escola crescer como aluna e também como funcionária da instituição de ensino

As recordações vão além e emocionam Márcia, que tinha o sonho de ser professora e de lecionar na EMEF Professora Valéria Maria Kirch. “Foi uma emoção bem grande. Eu ia para casa e chorava: ‘Será que eu estou lá mesmo?’”, diz sobre quando começou a trabalhar no educandário da sua infância.
Quem também guarda boas lembranças da década de 1980 é a merendeira Maria Marinês Ertel, 51 anos. Em 1981, ela cursou a quinta série do Ensino Fundamental na instituição. “A cozinha era onde é o banheiro dos professores, era uma cozinha pequena. Os banheiros eram atrás e tinha duas salas de aula”, diz comparando a estrutura de antigamente com a atual. Assim como Márcia, ela ia a pé para a aula.

Na época, Marinês morava em Linha Lerner. “(Vinha) Com uma vizinha que era aluna do quinto ano. Nós duas vínhamos junto. Hoje, os alunos vêm de ônibus”, compara. Na memória, a merendeira ainda guarda detalhes daquela turma: a professora era Imelda Gabbardo e dos 22 alunos apenas três eram mulheres. “A gente jogava bola com os guris, com os pés descalços. Era muito bom”, conta.

Diretora salienta importância também dos pais
estarem presentes na formação cidadã dos filhos

Busca por formação de cidadãos conscientes
A diretora Elisabete Terezinha Hartmann Jahn diz que a EMEF Valéria Maria Kirch busca trabalhar de uma forma que o aluno não vá para escola apenas para adquirir conhecimentos. “Ele (o aluno) tem que saber conviver e saber utilizar aquele conhecimento. Queremos que ele consiga passar isso adiante”, afirma. “A escola tem que fazer isso: não só transmitir, mas fazer com que o aluno consiga entender aquilo (conhecimento) na vida dele como cidadão”, reforça.

Como parte dessa formação, a escola conta com atividades no contraturno para alunos do 1º ao 3º ano. Essas ações ocorrem nas dependências da Escola Municipal de Ensino Fundamental João Lerner, na Linha Lerner, que transformou-se num centro de contraturno no município. Lá, os estudantes contam com oficinas de música, futebol e teatro. “Os nossos alunos são bastante envolvidos. A gente tem alunos que participam do Grupo Instrumental, tem alunos que participam do teatro e a gente tem alunos que fazem escolinha (de futebol) com o Fera”, destaca a diretora.

A gestora salienta que a própria escola promove atividades culturais. Algumas, como a festa de São João, são apenas para os alunos e outras, como a tradicional Noite Gaudéria durante a Semana Farroupilha, são abertas ao público. Há ainda a Escolha do Garoto e da Garota EMEF Professora Valéria Maria Kirch.

Para Elisabete, o principal desafio é fazer com os pais entendam a importância deles na educação dos filhos. “Muitas vezes a gente conversa com os pais e eles dizem: ‘eu não sei ajudar’. Mas é só ficar junto com o filho e mostrar interesse para eles”, comenta.

Tatieli Schütz, Maria Alzira Bohn Schommer e Sirlei Schommer: neta, avó e filha estudaram na mesma escola e contam com muitas recordações do período

Escola e famílias têm histórias que se entrelaçam
Com tantos anos de existência, muitas pessoas já passaram pela “Escola Valéria”, como foi carinhosamente apelidada a instituição de ensino. E não são raros os casos por São José do Sul afora em que avós, pais, filhas e netos de uma mesma família tiveram sua formação na educação básica feita no educandário aniversariante.

É o caso dos Schommer. Dona Maria Alzira, hoje com 66 anos de idade, começou os estudos por lá quando tinha apenas seis. A “Valéria” era diferente. Apenas uma escolinha de madeira onde a, então, menina estudou até o quinto ano do Ensino Fundamental. Para a mesma escola, anos depois, foram as filhas dela: Sintia Beatriz Schommer, hoje com 41 anos de idade, e Sirlei Schommer, com 38.

Sintia ainda lembra que, em sua época, a “Valéria” oferecia aulas de atividades agrícolas, que hoje já não são dadas. “Muitas das árvores que hoje estão lá, foi nós que plantamos”, declara, orgulhosa. Sirlei se emociona ao lembrar que, de certa forma, seguiu os passos da mãe ao compartilhar a mesma instituição de ensino. “Sem educação, a gente não é nada na vida”, reflete.

Três gerações da família Schuh também passaram pela EMEF Valéria Maria Kirch

Adolescentes, Bruna, filha de Sintia, e Tatieli, filha de Sirlei, seguem os passos das mães e da avó, também na mesma escola. “Eu me sinto muito feliz por poder estudar no mesmo lugar que elas”, aponta Tatieli, hoje aluna do oitavo ano. A prima já está no nono.

Realidade parecida é a da família Schuh. A avó, neste caso, além de aluna, também foi professora no que viria ser a “Escola Valéria”. Jussara Maria, hoje com 58 anos de idade, iniciou os estudos por ali em meados dos anos 70, na antiga São Francisco de Salles, antes da união das instituições.
Virou professora em 1981, trabalhando na escola, e se aposentou no ano passado, após ter lecionado Português, inclusive, para sua filha e sua neta.
“Eu, praticamente, passei a minha vida nessa escola. A profissional, eu comecei, desenvolvi e terminei aqui. E ela também foi muito importante na vida dos meus três filhos e da minha neta”, ressalta, cheia de carinho.

Uma das filhas, Jordana Schuh Brochier, entrou na “Valéria” em 1989, com quatro anos de idade. Hoje, com 34, ela admite com bom humor que não é fácil para ninguém ter a mãe como professora, mas classifica os anos na escola como os melhores de sua vida. “Era muito bom. Nossa turma se manteve junta do pré até o nono ano, tanto que temos contato até hoje. Era muito familiar”, recorda.

Atualmente, sua filha, Giovana, de 13 anos, vive o mesmo na instituição. “É onde eu aprendo coisas que eu vou usar para a minha vida toda”, reflete a jovem, sobre o papel da escola, já tão fortemente marcada na história de sua família.

Valéria Maria foi bastante ativa na comunidade

Quem era Valéria Maria?
Última dos 13 filhos do casal Carlos e Ana Catarina Bohn, Valéria Maria nasceu em 10 de dezembro de 1921, no distrito de Salvador do Sul, que então pertencia ao Município de Montenegro. Perdeu o pai aos seis anos de idade e dedicou sua infância a auxiliar a mãe em casa. Em 1937, concluiu o curso específico para o magistério rural no Colégio Imaculado Coração de Jesus, em São Sebastião do Caí. A escola era mantida pelas irmãs da Ordem de Santa Catarina.

Em 1939, fundou a Escola Municipal Felipe Camarão, em Dom Diogo Baixo, após realizar um trabalho comunitário e visitar as famílias para fazer o levantamento e matrícula dos alunos. Providenciou, ainda, material para a construção do prédio onde seriam dadas as aulas. Em 1943, fez curso de socorrista de emergência da Cruz Vermelha. Com os conhecimentos adquiridos, dedicou-se à comunidade atendendo partos, realizando primeiros socorros e aplicando injeções. Valéria Maria casou-se em 20 de janeiro de 1945 com Pedro Aloísio Kirch, com quem teve 10 filhos.

A professora manteve-se ativa na comunidade organizando grupos de estudo para mãe e incentivando apresentações artísticas e teatrais na comunidade. Em 1960, participou da criação do Grupo Aurora. Em 1969, após 30 anos de dedicação à carreira de professora, recebeu a aposentadoria, mas não se afastou da vida em comunidade.

Juntamente com o esposo, então vice-presidente da diretoria da igreja São Francisco de Salles, realizou campanhas e festas para a construção da torre do tempo, que foi concluída em 1986.

Nos últimos anos de vida, liderou campanha natalina para a aposentadoria de deficientes físicos da comunidade.
Valéria Maria faleceu aos 66 anos de idade, em 4 de fevereiro de 1987, em decorrência de um infarto após quatro dias internada no Instituto de Cardiologia, em Porto Alegre. Seu corpo foi enterrado no cemitério da igreja São Francisco de Salles.

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