Propícios à proliferação de fungos e de bactérias, a principal preocupação é com o volume do áudio utilizado
Desde os antigos estetoscópios de 1850, passando pelo bi-telephone de 1891 e os primeiros headphones de 1910, os fones de ouvido estão na “cabeça do povo”. Empregados por profissionais como telefonistas, atendentes e músicos, seu uso recreativo tem sido crescente nas últimas décadas e, com o “boom” dos smartphones, tem muita gente que, hoje, já passa o dia todo com eles.
Esse é o caso do vendedor de loja Douglas Eduardo Araújo da Costa. Aos 20 anos de idade, ele admite que passa “horas e horas no fone”. “E nem sempre tem música. Às vezes, eu tô com o fone do ouvido na cabeça e ele está até desligado”, coloca. Douglas conta que faz uso do equipamento diariamente desde que adquiriu o seu primeiro celular. As horas de deslocamento no transporte público e durante o intervalo do trabalho são os principais momentos de utilização.
Comportamento parecido tem o atendente de farmácia César Roveda Coelho, 19 anos. Morador de São Leopoldo, ele vem diariamente para Montenegro de ônibus, utilizando os fones de ouvido. “É todo o santo dia e sempre ouvindo música”, relata. “Eu comecei a ouvir quando eu tinha os meus 14 anos e eles estão sempre no volume máximo para bloquear o som de fora.”
Com tanta utilização, a preocupação com o correto manuseio dos equipamentos também tem crescido. Questionamentos quanto ao volume ideal do som, com um limite que não prejudique a audição do usuário; e à boa higienização dos fones, para a não proliferação de fungos e bactérias, têm sido base para diferentes pesquisas especializadas.
Em uma delas – feita pela Universidade de Campinas e amplamente divulgada no ano passado – apontou-se que mais de 10 mil fungos e bactérias podem ser encontrados nos aparelhos. Alguns até responsáveis por infecções de pele, como o furúnculo e o impetigo, e por abcessos. Apesar da possibilidade, o médico otorrino Gustavo Faller destaca que tais doenças são incomuns e que a principal preocupação deve ser com o volume do som.
Afinal, qual é o volume ideal para usar?
Enquanto o atendente de farmácia César Coelho admite que utiliza o volume máximo para não ouvir o som de fora, o vendedor Douglas Araújo da Costa é mais cauteloso e usa a própria tecnologia de seu smartphone para não arriscar sua saúde auditiva. “Eu não costumo deixar tão alto. O meu celular manda uma notificação quando o volume chega em uma posição que pode trazer risco, então eu me preocupo”, afirma.
Para o médico otorrinolaringologista montenegrino Gustavo Faller, a relação entre a exposição ao ruído com os fones e a perda auditiva é direta. “Já existem alguns estudos relacionando o uso de fones de ouvido para fim recreativo com lesão nas células da parte interna do órgão da audição. Dependendo do tempo de exposição e do “volume” essas lesões se tornam irreversíveis, traduzindo-se em perda auditiva e zumbido”, aponta.
O especialista indica que é padrão internacional a recomendação de que as pessoas não sejam expostas a ruídos superiores a 85 decibéis por mais de oito horas diárias. Os fones de ouvido intra-auriculares, que entram no ouvido, são capazes de produzir uma pressão de até 120 decibéis; e os em formato de concha vão até 107 decibéis. “Alcances muito superiores aos ‘até’ 85 recomendados”, destaca o médico.
“Quanto ao que seriam 85 decibéis, é muito difícil definir. Uma furadeira produz 80; um secador, 90; 85 é mais próximo de uma festa relativamente barulhenta”, indica. Faller aponta que existem estudos indicando que, entre 15 e 25% dos usuários de fone usam um volume superior ao recomendado. Ele sugere, neste sentido, o uso de aplicativos de segurança que façam a limitação do som, alertando o usuário; e também que sejam preferidos equipamentos em formato que ajude a bloquear o som ambiente.
E a limpeza? Os equipamentos oferecem riscos?
Apesar da pesquisa da Universidade de Campinas indicar a proliferação de fungos e bactérias nos fones de ouvido, Gustavo Faller garante que não há razão para pânico. “Como qualquer objeto que existe, os fones podem ser colonizados por fungos e bactérias. Normalmente, os mesmos já existentes em nossa pele”, coloca. “Entre a existência destes microorganismos no fone ou na nossa orelha e o desenvolvimento de uma infecção, existe um longo caminho, tanto que não há relato de infecção secundária ao seu uso.”
A higienização, claro, é recomendada, como a todos os objetos de uso. O médico indica que, por se tratar de um equipamento eletrônico, os fones devem ser limpos com álcool isopropílico, e não comum, sempre seguindo as orientações dos fabricantes. “O uso de sabão não é recomendado, pois, além de danificar o fone, ele pode causar irritação na pele da orelha e, inclusive, causar alergias”, ensina. De uso pessoal, os aparelhos não devem ser compartilhados.