As eleições municipais no Brasil já decolaram, e ao seu lado as mentiras ou distorções a respeito de fatos. Circula agora nas redes sociais, vídeo denunciando lei que provocaria ‘uma verdadeira ‘caçada’ aos cristãos’. Em seguida, uma mulher identifica como advogada Lenice Moura afirma que foi ‘inventado o crime de abuso de poder religioso’, e alerta ainda que candidatos ligados a igrejas que forem eleitos serão cassados, como forma de ‘tirar Deus da Democracia Brasileira’. O que ocorreu foi apenas uma avaliação sobre enquadrar ou não um caso isolado de abuso religioso no rol de modalidades de abuso do poder econômico ou do poder de autoridade (Artigo 22 da LC 64/900).
O Chefe de Cartório da 31ª Zona Eleitoral, Diego Bonato Coitinho, esclarece, antes de tudo, que há uma vedação para o uso das igrejas como local de propaganda eleitoral, com previsão de multa em caso de descumprimento. Já o que houve no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), semana passada, foi o julgamento prevendo a hipótese de cassação de registro, ou do diploma, de uma candidata beneficiado pela propaganda irregular (que hoje não possui previsão expressa na Legislação), a qual não prosperou. Ninguém falou em derrubar eleitos simplesmente por serem pastoras ou pastores.
O órgão decidiu, por maioria, rejeitar a possibilidade de a apuração de ‘abuso do poder por parte de autoridade religiosa’ ocorrer no âmbito das Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) a partir das Eleições Municipais de 2020. A ação se referia ao pleito de 2016, onde uma vereadora teve seu mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO). Filha de pastor, teria pedido votos durante uma reunião com jovens dentro do templo.
Os magistrados concluíram que a legislação já dispõe de normas para punir excessos de entidade religiosa na seara política, sem precisar apurar eventual abuso de poder religioso de forma autônoma. A interpretação foi reforçada pelo presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, que assinalou que a legislação eleitoral já prevê, de forma expressa, o abuso de poder religioso, ao vedar doações a candidatos e partidos por instituições religiosas e propaganda política em templos.
Coitinho reitera que igrejas são consideradas bens de uso comum, por tanto, espaço que a legislação veda a propaganda eleitoral (Parágrafo 4º do artigo 37 da Lei 9.504/97). A lei define bens comuns como espaços em que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada.