Justiça eleitoral avalia casos como indícios de irregularidades no recebimento do benefício
O processamento das contas dos candidatos nas últimas eleições, feito pela Justiça Eleitoral, apontou suposta irregularidade em uma doação recebida pelo prefeito eleito, Gustavo Zanatta (PTB). Em 27 de outubro, a campanha recebeu R$ 2 mil de uma doadora que, nos meses de julho e agosto, havia feito uso do auxílio emergencial do governo federal, recebendo um total de R$ 1,2 mil como benefício.
O auxílio foi criado em meio a pandemia para ajudar trabalhadores informais, MEIs, autônomos e desempregados pertencentes a famílias com renda mensal per capta de até meio salário mínimo (R$ 522,50); ou cuja renda familiar total fosse de até três salários (R$ 3.135,00). Foi focado em quem estava passando por dificuldades e, no entendimento dos analistas das contas eleitorais, deveria indicar que o beneficiário não teria condições de fazer uma doação a políticos.
Situação semelhante foi verificada nas contas do vereador Paulo Azeredo (PDT). Três beneficiários do auxílio emergencial doaram para a campanha; R$ 1 mil cada. Eles haviam recebido, pelo menos, três parcelas de R$ 600,00 para auxílio e complemento de renda.
A juíza eleitoral substituta, Deise Fabiana Lange Vicente, garante que essas situações serão levadas aos órgãos competentes para verificação. “Para, justamente, ser avaliada eventual fraude nos benefícios”, explica. Em todo o país, o Tribunal Superior Eleitoral identificou quase 64 mil beneficiários do auxílio emergencial que aparecem como doadores de campanha e que também serão investigados. A informação é obtida através do cruzamento dos dados de diversos órgãos federais.
O prefeito Zanatta foi contatado sobre o caso e optou por não comentar a situação. Em mãos dos primeiros apontamentos das análises de prestação de contas, sua equipe fez as necessárias correções e, dentre os documentos entregues, comprovou que a doação em nome da beneficiária do auxílio emergencial efetivamente ocorreu. Ele aguarda, agora, o julgamento das informações; mas não tende a haver desaprovação.
Em situações do tipo pelo país – e apesar dos apontamentos serem marcados como indícios de recursos de origem não verificada – os juízes eleitorais têm tido o entendimento de que os candidatos não devem ser responsabilizados por doações de beneficiários do auxílio governamental. Isso porque eles não teriam como ter conhecimento de que o doador tenha feito uso do auxílio. As contas do prefeito devem ser julgadas, no máximo, até o dia 12.
Já no caso do vereador Paulo Azeredo, o julgamento ocorreu e a avaliação foi, justamente, a de que ele não teria como ter conhecimento do benefício. Não por esse, porém, mas por outros apontamentos, as contas do legislador foram desaprovadas. À reportagem, ele confirmou a situação e lamentou não ter tido o tempo hábil para devolver a doação após saber da irregularidade.
Maioria dos vereadores teve contas desaprovadas
Ao contrário do prefeito, que ainda não passou pelo julgamento, todos os dez vereadores de Montenegro já tiveram as suas contas julgadas pela Justiça Eleitoral. Seis deles, a maioria, tiveram as prestações desaprovadas. Como punição, foram sentenciados a pagar valores ao Tesouro Nacional de acordo com cada irregularidade verificada.
Dos dez, apenas o vereador Valdeci Alves de Castro, do Republicanos, teve as contas plenamente aprovadas. Camila Carolina de Oliveira, do mesmo partido; Gustavo Oliveira, do PP; e Sérgio Souza, do PSB, foram aprovados com ressalvas. Os demais não passaram.
De acordo com a juíza eleitoral substituta, Deise Fabiana Lange Vicente, a quantidade surpreendeu. “Foi maior, em comparação aos pleitos anteriores”, disse. “Algumas falhas surgem em maior quantidade, como o atraso em certos procedimentos, como no envio de relatórios que possuem prazo de 72 horas após o recebimento da doação. Igualmente, o atraso na abertura da conta bancária de campanha é uma falha comum.” São os atrasos, justamente, que representam as ressalvas entre os três aprovados.
Sobre a desaprovação, a juíza explica que, embora acarrete na obrigação de recolhimento de valores ao Tesouro na maioria dos casos, ela não chega ao extremo de implicar em perda de mandato do eleitos. “Contudo, independentemente do resultado do julgamento da prestação de contas, este expediente pode instruir uma ação específica para apurar eventual fraude ou abuso de poder econômico que, caso julgado procedente, pode acarretar perda”, salienta.
Sentenças salgadas
Dentre os que tiveram suas contas de campanha desaprovadas, a vereadora Ana Paula Machado, do PTB, foi a que recebeu a sentença mais dura. A juíza eleitoral determinou que ela recolha R$ 14.150,00 ao Tesouro Nacional. O montante se refere, em parte, a despesas com combustível, que são consideradas como de natureza pessoal, não podendo ser pagas com as doações de campanha; e também a um total de R$ 13,6 mil em despesas que não teriam sido comprovadas adequadamente, mesmo após ter sido oferecido prazo para isso. A vereadora recorreu e aguarda posicionamento da justiça.
No caso do vereador Paulo Azeredo, a sentença foi pelo recolhimento de R$ R$ 6.829,30 ao Tesouro; referente a duas doações em espécie feitas num mesmo dia e que excederam o limite legal, que é de R$ 1.064,10; e a valores informados envolvendo impulsionamento de conteúdos em redes sociais que tiveram a forma como foram declarados julgadas irregulares. Azeredo também tem que pagar multa de R$ 12,39 por ter extrapolado o limite de recursos próprios passíveis de serem gastos em campanha. O vereador informou que seu advogado estava de férias, por isso perdeu o tempo de recurso. Ele negociou para quitar o valor de forma parcelada.
Também sem aprovação, Ari Müller, do PP, foi sentenciado a recolher 2.033,00 ao Tesouro Nacional. Já pagou. A irregularidade foi um depósito de R$ 2 mil que, pelo valor, não poderia ter sido feito em espécie. Ainda, uma despesa no valor de R$ 33,00 que, conforme a informação, não foi paga diretamente a empresa fornecedora. Com o débito quitado, o vereador reforçou que ambos os apontamentos foram devidamente esclarecidos.
Ao vereador Felipe Kinn (MDB), a sentença foi menor, para um pagamento de R$ 1.250,00. Ele teve as contas desaprovadas devido a dois depósitos em espécie feitos no mesmo dia e que ultrapassaram o limite legal. Chegou a recorrer da decisão, mas a juíza eleitoral manteve a sentença. Já Talis Ferreira (PP) foi sentenciado a pagar R$ 2.340,00 também por causa do limite de doação em espécie num mesmo dia; além de multa no valor de R$ 44,92 por ter extrapolado o limite de gastos de recursos próprios. O débito já foi quitado.
Para o vereador Juarez Vieira da Silva (PTB), a sentença foi de R$ 4.309,00 a serem recolhidos ao Tesouro Nacional. O montante é resultado de R$ 2.309,00 gastos com combustível e que não poderiam ser declarados como despesa eleitoral; e outros R$ 2 mil referente a uma doação advinda de pessoa física permissionária de serviço público e que, por isso, não poderia doar a candidatos. Juarez disse que sua contabilidade e jurídico estão cuidando da questão.