Montenegrinas acreditam que investimento e valorização na educação, mais do que nunca, são essenciais
“Para mim uma das maiores dificuldades foi a falta do contato com os colegas e professores. Porque, querendo ou não, isso ajudava muito a gente a aprender”, diz a estudante Laura Weschenfelder. Essa é uma das situações reais citadas pelas estudantes montenegrinas em debate realizado na Rádio Ibiá nessa quarta-feira, 11.
Que a educação foi uma das diversas esferas da sociedade afetadas pela pandemia da Covid-19 não é novidade. Porém nesse Dia do Estudante, comemorado nacionalmente no dia 11 de agosto, alunas da cidade tiveram a oportunidade de apontar quais impactos na educação foram mais notados, a partir das suas percepções pessoais.
Com início em março de 2020 no Brasil – abertura do período escolar – a pandemia pegou de surpresa a todos. “Nos primeiros quinze dias que eles (direção) tinham feito a suspensão todo mundo achou que iria ser férias, mas na verdade acabou sendo um pesadelo”, cita Ingrid Lutckmeier, estudante do 3° ano do Ensino Médio da Escola São João Batista.
Ela relata que logo no início foram criados e-mails para cada turma, onde os professores encaminhavam as atividades, entretanto o sistema não era o mais adequado por todos os alunos terem acesso. “Foi meio confuso até a gente começar a usar o Google Class”, fala.
Assim como no São João Batista, na Escola Walter Belian o início das atividades remotas também foi confuso para os alunos. “Foi meio complicado, porque ninguém estava preparado para essa situação. Então no começo eles (professores) mandavam atividades pelo whatsapp e a gente enviava as atividades prontas também por ali”, diz a estudante do 9º ano, Laura Weschenfelder. De acordo com Laura, neste ano que a sua turma está conseguindo se adaptar melhor, com a ajuda da plataforma Google Classoom e o apoio presencial dos professores.
Para as jovens, uma das grandes dificuldades no ensino remoto foi em manter a autodisciplina no momento do estudo. “Foi difícil também separar o lazer do dever; a hora de estudar e a hora de descansar e tudo mais. Para mim o principal desafio foi a autodisciplina mesmo”, conta a estudante do 3° ano do Ensino Médio do Colégio Sinodal Progresso, Carolina Schmitt.
O problema com a disciplina não é exclusivo das mais jovens. Estudante do 9° período de Direito, na Ulbra, Eduarda Flores conta que demorou para entrar no ritmo. “Para mim foi a autodisciplina também. No primeiro semestre remoto eu não tinha nada de autodisciplina, depois tu vai começando a implementar aquilo e tem que ter aquele horário para estudar”, diz.
Apesar dessa dificuldade, Eduarda acredita que de certo modo foi bom não precisar ter aula presencial. “Pra mim foi bom, não precisava mais gastar com transporte, não precisava ter que sair do meu trabalho e ir direto para a faculdade”, comenta. Segundo ela, pouco antes do início da pandemia a sua universidade havia implementado um sistema online de estudo.
Saúde mental afetada
Para as jovens outro problema potencializado durante a pandemia do novo coronavírus foi o transtornos na saúde mental. “A saúde mental foi totalmente afetada, porque a gente foi vetado de poder sair, ver os amigos, que era uma válvula de escape. Tu passa a semana toda estudando, no final de semana tu quer sair, quer ver os teus amigos, tu quer ir em uma festa, em um pub, então a questão da pandemia afetou totalmente”, fala Eduarda.
Ela ressalta que pela necessidade de ficar isolada em casa com medo de um vírus que nem se conhecia, problemas com ansiedade e depressão foram inevitáveis. “Só que eu sou privilegiada e eu iniciei na terapia, mas fico imaginando quem não teve esse acesso, como está lidando com isso durante a pandemia”, indaga.
Para Laura, do Ensino Fundamental, e reclusão também afetou o emocional. “É que o nosso escape da escola era sair com os amigos, viajar, viver o mundo exterior”. Já Ana Carolina Heinz, aluna do 3° ano do Ensino Médio do Colégio Sinodal, declara que ela e suas amigas tiveram muita ansiedade, por conta da preparação para o vestibular. “Começou (a pandemia) nada estava certo se ia ter Enem, se ia ter os vestibulares do Rio Grande do Sul, nada estava com certeza, aí tu estava cegamente estudando para uma coisa que tu não sabe o que vai vir. […] E tu está preso em casa, 24h onde tu estuda; onde tu dorme; o teu lugar de lazer, é tudo ali”, concluí.
Estudo híbrido
No final de 2020 o ensino híbrido – em que os alunos vão à escola e fazem as atividades on-line – começou a ser aplicado por algumas instituições de ensino privado e público. “Ano passado tinha uma quantidade muito menor do que esse ano de alunos. Eu acho que com o andamento da vacinação as pessoas começaram a ter mais coragem para voltar para o presencial, agora está praticamente normal, pelo menos na minha turma”, diz Carolina.
Para as estudantes a vacinação e os cuidados de prevenção à Covid-19 foram essenciais para o retorno. “Ano passado o São João também retornou quando foi liberado e eu me senti muito confortável, porque a gente estava tomando todas as precauções, tudo que precisava. Esse ano eu também retornei no ensino híbrido, e eu acho que foi bem, não tenho reclamações sobre”, reflete Ingrid.
Laura também se diz segura com a volta às aulas presenciais. “Até porque as escolas estão tomando todas as medidas possíveis, então é um dos lugares que a gente se sente mais confortável”, expõe.
Abandono escolar
De acordo com dados do Conselho Tutelar de Montenegro, em 2020, 321 crianças e adolescentes abandonaram as suas atividades escolares. Após contato e notificação do órgão, 226 retornaram às tarefas, entretanto 95 tiveram seus casos encaminhados ao Ministério Público de Montenegro por abandono escolar. Esse fenômeno também se repetiu no restante do País.
“Eu nunca pensei em abandonar as atividades, eu sempre fui acompanhando como estava sendo colocado, mas eu conheço gente que abandonou. Colegas que pararam de fazer, e agora pararam de ir no híbrido também”, declara a estudante do Walter Belian. Segundo ela, alguns colegas não tinham acesso à internet ou como ir até à escola buscar as atividades.
Eduarda conta um pouco da realidade no Ensino Superior. “Na faculdade tem a questão que muita gente não conseguiu continuar pagando. […] Tem gente que é mãe, tava em casa e tinha que cuidar de filho, tinha que cuidar da casa. Teve gente que pegou mais um serviço de noite para poder pagar as contas por conta da pandemia. Eu conheço gente que chegou até a ser entubado por causa do Covid, então teve que parar os estudos”, completa.
No Ensino Médio privado a situação é considerada desigual comparada com a rede pública. “Com certeza entre a rede pública e a rede privada teve uma desigualdade imensa. Porque eu vejo que muitas crianças simplesmente não tiveram o ano passado de aula, recebiam atividades às vezes duas vezes por mês e era isso, enquanto o Sinodal teve as aulas remotas pelo Meet todos os dias com a carga horária normal”, fala Carolina.
Preparação ao Enem
Em 2021, o número de inscritos (3,1 milhões) no Enem teve o índice mais baixo dos últimos 16 anos. O exame chegou a ter 8,7 milhões de inscritos em 2014. Ingrid ressalta a informação como exemplo de que o estudo foi muito prejudicado no último ano. “E essa preparação para o Enem e o vestibular, é um pouco complicada, mas é mais de autodidata, tu tem que pesquisar, há pessoas que compraram cursinhos on-line, plataformas”, fala.
Também estudando para a realização da prova, Ana Carolina destaca o papel importante da pesquisa on-line. “Inclusive tem gente que está tentando se virar pelas videoaulas no Youtube. Isso é uma ferramenta muito boa, porque às vezes não ficou muito claro pra ti na aula e tu pode dar uma olhada no Youtube. […] Eu acho que está todo mundo se virando como pode”, expressa.
Defasagem idade-série
De acordo com especialistas, uma das consequências da pandemia do novo coronavírus é a defasagem idade-série. Para Ingrid, através da plataforma Google Class ocorreu um bom diálogo entre aluno e professor, e isso foi de grande ajuda. “Eu não sei se a gente cumpriu todo o planejamento curricular que tem do Estado, isso eu não posso dizer, mas depois do Class foi tudo pra melhor”, fala.
Ela ainda comenta que neste ano os professores realizaram durante um mês uma revisão dos conteúdos do último ano. “A gente entrou o ano com o pé direito, e essa revisão foi o melhor método na minha opinião”, afirma. Já Laura declara que no início o aprendizado foi mais difícil, porém com a nova plataforma os conteúdos estão sendo mais bem trabalhados.
Desigualdades no ensino
Para as montenegrinas, com a pandemia também foi notável a desigualdade que existe na educação. “Eu acho que sou uma pessoa privilegiada, porque eu tenho acesso à internet, tenho estrutura física em casa e eu também consigo me autodisciplinar. Eu não tenho filhos que dependam de mim; eu consigo parar e estudar, mas tem muita gente, até no Ensino Fundamental e Ensino Médio, que não têm essa estrutura”, fala Eduarda, estudante de Direito.
Dentre outros fatores citados por ela, a alimentação foi ressaltada. “Tinha gente que ia para a escola para comer, contava com aquela refeição, e chegou a pandemia, não tinha mais aquilo”, fala.
Já Ingrid, fala sobre o apoio e a estrutura em casa para a realização das atividades. “Eu não sou parâmetro, porque eu acho que cada um tem a sua realidade. A minha eu tinha, mas eu conheço muitas pessoas que não tinham (apoio) e era realmente muito triste”, comenta.
Impactos no pós-pandemia
Com a vacinação em massa e as medidas de prevenção sendo mantidas, a população já enxerga um futuro pós-pandemia. Na opinião de Ingrid, um dos impactos na educação será no seguimento de utilização de plataformas on-line, como apoio. “Eu acho que isso foi uma coisa boa, a gente teve um avanço tecnológico nos meios de ensino”, declara.
Entretanto, Ana Carolina Heinz rebate que muitos serão os pontos negativos. Através de um trabalho realizado na sua classe, os alunos foram postos a refletir sobre o assunto. “Eu acho que não teria como ter outro resultado, mas as pessoas sim perceberem que teve um decaimento de performance”, fala.
Esperanças para a educação
Apesar de refletirem sobre o passado e o presente, as jovens já inspiram evolução para o futuro. Ana Carolina destaca o papel da educação neste momento. “Eu acho que a educação, todo mundo sabe que é a base de tudo, mas ela se provou, porque sem a pesquisa, por exemplo, a gente não ia ter vacina, não ia saber nada sobre a Covid, então só por isso ela já mostrou a super importância dela”, salienta.
Já Eduarda espera mais investimento na educação. “Eu espero mais investimento na educação e na questão social, para que haja mais estudantes. Que a vida continue pós Ensino Médio também; que as pessoas tenham mais oportunidades”, emite.