Há 180 anos, Bento Gonçalves passou de preso a presidente da República Rio-grandense

Há 180 anos. Após fugir de uma das prisões mais seguras do Império, Bento Gonçalves foi empossado em Piratini

Há exatos 180 anos, Bento Gonçalves cumpriu a façanha de fugir de uma das prisões mais “seguras” do período imperial: o Forte de São Marcelo, também conhecido como Forte do Mar, ou Forte de Nossa Senhora do Pópulo. A fortaleza fica na Bahia, e a prisão do general Farroupilha aconteceu após os Farrapos serem pegos em uma emboscada na Ilha do Fanfa, em Triunfo. De acordo com o historiador e tradicionalista Flávio Patrício Vargas, os revolucionários entraram em uma verdadeira arapuca naquele outubro de 1836.

Não se sabe em qual das 11 celas exatamente Bento Gonçalves ficou preso

Os imperiais souberam da tentativa de os revolucionários atravessar a Ilha do Fanfa e se posicionaram com um navio de guerra pelo Guaíba e pelo Jacuí, com as luzes apagadas. Em apoio havia uma tropa da cavalaria sob o comando de Bento Manoel Ribeiro – o vira-casaca – para cercar a ilha por terra. A Batalha do Fanfa foi uma das mais sangrentas da Revolução Farroupilha. “O tiroteio foi intenso. Conta a história que árvores acima de dois metros de altura foram podadas a bala”.

Com isso, o general foi preso e encaminhado para o Rio de Janeiro, onde ficou até março de 1837. Lá, uma tentativa de fuga libertou Onofre Pires e o coronel Corte Real. Pedro Boticário não conseguiu fugir por ser muito gordo, e Bento Gonçalves desistiu da fuga em solidariedade. Como retaliação, o líder Farroupilha foi levado à Bahia, e preso no Forte de São Marcelo, que não tem acesso por terra, somente pelo mar.

Não se sabe exatamente qual das 11 celas o abrigou até 10 de setembro, data da fuga. A única certeza que há, de acordo com o arquiteto e professor de Conservação e Restauração de Monumentos e Conjuntos Históricos na Universidade Federal da Bahia, Francisco Senna (Chico), é que o general não ficou na única solitária existente no conjunto. “Ele foi um preso considerado com boa conduta e, se tivesse ficado na solitária, não teria condições para fugir”, explica. Isso porque, a prisão solitária tem o formato parecido ao de um forno de pedra, capaz de abrigar um adulto sentado. Não tem janelas, nem contato para o lado externo da prisão, também não há possibilidade de ficar em pé na cela.

A fuga ocorreu com a ajuda da Maçonaria. Bento nadou cerca de 100 metros até um barco. “A Maçonaria era contrária ao Império. Então eles apoiavam as revoluções republicanas”, conta Chico. A partir disso, o general foi levado até a ilha de Itaparica, uma viagem de cerca de 50 minutos a partir do Forte. Lá, ele se disfarçou de civil e seguiu até a cidade de Florianópolis, de onde veio a cavalo para o Rio Grande do Sul. Aqui, logo tomou posse como presidente.

O retorno triunfante de Bento
Ainda enquanto Bento Gonçalves estava preso no Rio de Janeiro, foi proclamada a República de Piratini, em 6 de novembro de 1836, pelo general Antônio de Souza Netto, o general Neto.

O líder revolucionário foi aclamado presidente, mesmo ausente. A posse de Bento ocorreu mais de um ano depois, em 16 de dezembro de 1837, quando chegou da prisão na Bahia. Ele foi empossado em Piratini, que nessa época era uma vila, mas se tornou sede do governo republicano, sendo assim a primeira capital da República Rio-grandense.

Prisão de revolucionários e defensor da costa brasileira

O Forte está localizado entre a cidade de Salvador e a Ilha de Itaparica

O Forte de São Marcelo, também conhecido como Forte do Mar, está localizado a uma distância de 300 metros da costa, em Salvador, Bahia. Ele destaca-se por ser o único forte de planta circular no Brasil e encontra-se dentro das águas. A construção foi feita sobre um banco de areia. De um lado, pode-se enxergar a Bahia de Todos os Santos e, de outro, tem-se a visão da Ilha de Itaparica.

A construção foi finalizada em 1623 e chegou a ser conquistado pelos holandeses já em 1624, mas eles logo foram expulsos. Além de defender a região de Salvador de invasões como a Holandesa e Francesa, o Forte serviu como prisão de pessoas contrárias à coroa. “Além de Bento Gonçalves, os prisioneiros do Forte eram políticos rebeldes à Monarquia, como Bento Xavier, Cipriano Barata, outros militares e até estudantes relapsos”. O Forte também era responsável por dar salvas de tiros para anunciar horas importantes como meio-dia e 18h.

A velhinha e seu cavalo
Segundo as lendas farroupilhas, durante o retorno para o Rio Grande do Sul, Bento Gonçalves teria chegado em uma estância, entre o Paraná e Santa Catarina e pediu um cavalo. Ele precisava trocar o animal porque a viagem era longa. A dona da estância, uma velhinha, disse “eu só tenho um cavalo escondido que me resta, porque meus bois, meus cavalos e até meu marido foi levado pela Revolução. Eu só daria meu cavalo se fosse pessoalmente para o general Bento Gonçalves”. Daí ele disse “Minha senhora, eu sou Bento Gonçalves”. Essa história é contada como uma coincidência, mas Flávio Patrício Vargas desmente a versão. “Essa velhinha era descendente de maçons que estavam dando cobertura para a fuga de Bento Gonçalves e essa história era uma senha”, relata. “Eles chegaram ali sabendo onde chegar. Não foi nada de coincidência”, afirma o historiador.

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