De Bangladesh para Montenegro com toda a família

Imigrantes contam com a solidariedade de vizinhos para driblar as dificuldades na comunicação e se adptarem à cidade

O nome diferente já chama atenção e, em seguida, o sotaque e a dificuldade de comunicação em Português confirma que ele não é daqui. Abul Hussain, 49 anos, chegou ao Brasil há cerca de cinco anos e ainda não se familiarizou com o idioma, bem diferente do bengali ou bengalês falado em seu país de origem, Bangladesh, na Ásia.

Essa dificuldade, porém, não o impede de sentir-se em casa em Montenegro. Principalmente depois de ter conseguido trazer a família inteira no ano passado. O idioma e a cultura podem ser diferentes, mas Abul tem uma característica que lembra muito os gaúchos: sua hospitalidade. Com muita simpatia, suco e refrigerante gelado, além de frutas, ele recebeu a reportagem do Ibiá na casa onde mora com a esposa Anwara Begum, 39 anos, e os filhos, no bairro Rui Barbosa. Em uma manhã quente de sábado, a direção do ventilador era para as visitas.

Consciente de que a escrita dos nomes é bem diferentes para os brasileiros, Abul apresenta a esposa e filhos entregando os documentos de identificação de estrangeiro de cada um deles. Enquanto isso, a família se prepara para a fotografia de todos juntos. A pequena Bushra, 4 anos, resiste um pouco e só concorda em participar depois de um dos irmãos buscar seu tênis.

A garotinha ainda estava em gestação quando o pai mudou para o Brasil. Abul veio com uma “carta convite” de um amigo conterrâneo. No documento, aquele que convida se responsabiliza pelo convidado. Atualmente, porém, ele já tem visto permanente. Ser muçulmano o ajudou a conseguir trabalho como sangrador em uma empresa terceirizada pela JBS para fazer o abate de aves que são exportadas aos países onde sua religião é predominante.

Anwara estava grávida e a distância o impediu de ver a filha ainda bebê. Abul só conheceu Bushra pessoalmente em outubro do ano passado, quando toda a família mudou para Montenegro. Até então, a saudade era amenizada com o recurso da tecnologia. A internet continua ajudando o pai de família a conversar com parentes e amigos que estão em Bangladesh.

Mesmo distante, Abul e sua família mantêm a tradição religiosa de orar cinco vezes ao dia voltados para Meca. Ele acessa a internet pelo telefone celular para mostrar imagens da mesquita desta cidade, onde já esteve. Para os muçulmanos, a peregrinação a Meca deve ser feita pelo menos uma vez na vida.
A família também pratica o Ramadã, nono mês do calendário islâmico, no qual os muçulmanos fazem jejum durante o dia. Neste período de 30 dias, que varia de um ano para outro, eles só comem após o pôr do sol.

Diferenças culturais não preocupam Abul
O aparelho de telefone celular auxilia também a comunicação dos filhos com colegas na escola. Nadia Begum, 17 anos, confirma que algumas amigas utilizam um aplicativo para se entenderem e conversarem. Embora ela e os irmãos, Arif Hussain, 13, e Assif Hussain, 10, tenham dificuldades com o idioma, Abul Hussain observa que eles aprendem mais rápido, o que atribui à idade e à oportunidade de interagir proporcionada pela escola. Ele recorda que, no primeiro ano no Brasil, nada entendia de Português.

Sua esposa Anwara, no entanto, só fala bengalês e mantém a tradição de usar a cabeça coberta. Nadia, porém, não se veste desta forma. Abul observa que a filha é jovem, além de o clima ser quente. A influência que a cultura e costumes brasileiros terão na formação dos filhos não o preocupa. Sobre isso, responde que não vê problemas, pois acredita que a convivência com as diferenças é possível.

Próximo à porta de entrada, um fruto de cor verde, comprido, nascido em uma trepadeira que lembra um pé de xuxu, tem origem em Bangladesch. Quando a esposa e os filhos mudaram para o Brasil, trouxeram sementes da planta, comum no seu país. A bagagem incluiu ainda pacotes de chá. “O (chá) daqui não é bom”, compara Abul.

E o que leva alguém a mudar para um país que, além de distante, tem idioma, costumes e cultura bem diferente do seu? Naturalmente, a resposta não é objetiva. Em Bangladesh, por conta do trabalho em vendas, Abul afirma que via pouco a família, pois não moravam na mesma cidade. Além disso, ao vir visitar o Brasil, gostou do que viu e, ao conseguir trabalho, decidiu ficar e juntar dinheiro para trazer a esposa e filhos. Ele afirma que os gastos com passagem superaram R$ 20 mil. Seus planos são permancer em Montenegro. “Voltar (a Bangladesh) só para passear”, resume.

Jovem aprende a costurar com uma vizinha

A receptividade dos brasileiros auxilia a adaptação de estrangeiros como Abul Hussain e sua família. Morando no bairro Rui Barbosa desde que chegou, ele se aproximou ainda mais dos vizinhos após a vinda da família e conta com a solidariedade de pessoas como a servidora pública aposentada Susane Ferreira.

Ela tem auxiliado na adaptação. A barreira da comunicação é vencida pela força de vontade de ajudar. Inicialmente era só com gestos, mas, com a convivência, já conseguem se entender melhor. Susana, inclusive, foi fundamental para a realização dessa reportagem, intermediando a conversa.

A adolescente Nadia Begun tem recebido ajuda de outra vizinha, a empresária aposentada Lira Lottermann, que a está ensinando a costurar. “Sem nenhuma conversação, o jeito foi improvisar com os braços, demonstrando as situações”, acrescenta Susana. Em outubro do ano passado, quando a família chegou, as duas vizinhas procuraram escolas para a adolescente e as crianças. Nadia foi recebida no Colégio A.J. Renner; os dois meninos na Escola Municipal Walter Belian. A caçula frequentou a creche do bairro Panorama, mas, neste ano, também mudará para a Walter Belian.

Susane explica que inicialmente foram inseridos de acordo com a idade, sem preocupação com a série, pois a equivalência de ensino entre Brasil e Bangladesh ainda está sendo avaliada. O papel das escolas, neste momento, é fundamental para a adaptação e o entrosamento da família. “São pessoas num mundo novo, real, certamente para toda a vida”, resume.

Seu desejo agora é inserir Nadia no mercado de trabalho, como jovem aprendiz. “O que posso dizer é que mesmo com dificuldades na língua, ela já entende muito e realiza o trabalho nas costuras com perfeição”, afirma. Para Susane, deveria haver algum núcleo ou setor público que auxiliasse na acolhida a estrangeiros na cidade. Sua sugestão não é criar uma grande estrutura, mas incluir o serviço em algum núcleo já existente, com pessoas que saibam e gostem de orientar essas pessoas.

Bangladesh
Bangladesh está localizado no continente asiático. O país faz fronteiras com a Índia, e um pequeno trecho com Mianmar.

A maioria da população é mulçumana (85%), há também uma fatia expressiva de hinduístas (12%), mas as relações entre ambas as comunidades é pacífica.
O país registra altos índices de pobreza e desnutrição, e está entre os mais povoados do mundo, com 162.220.762 habitantes. Mais de 70% destas pessoas mora em área rural. A expectativa de vida é de 63,5 anos.

Bangladesh teve sua independência reconhecida em 1972, após vários anos de confrontos com o Paquistão.
Atualmente, o país é governado pelo presidente Iajuddin Ahmeda e pelo primeiro-ministro Fakhruddin Ahmed. Sua capital é Daca; o idioma é o bengali, também conhecido como bengalês.

Fonte: Equipe Brasil Escola – www.brasilescola.uol.com.br

Saiba Mais
Uma exigência de boa parte dos compradores da JBS é que o abate de frangos seja realizado por um muçulmano. Essa exigência tem motivado a vinda de muçulmanos para Montenegro, contratados por uma empresa terceirizada que presta serviço à indústria.

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