Empresa tem licença para se instalar no Paquete, interior do município, mas moradores temem que atividade gere poluição
A instalação de uma Central de Tratamento de Efluentes está preocupando moradores da localidade de Paquete, interior de Capela de Santana. O receio é que a atividade mude as características do local, que é tomado pelo verde dos campos e das matas, onde predomina a agricultura e o sossego.
Morador de Paquete desde sempre, Luiz Fernando Kroeff preocupa-se com o impacto da atividade na qualidade de vida do lugar. Ele teme que os resíduos a serem tratados contaminem o meio ambiente e prejudiquem as atividades desenvolvidas pelos moradores. Kroeff lembra que, até dois anos atrás, não havia permissão legal para instalação desse tipo de empresa na localidade. “A lei foi alterada e a comunidade não soube disso”, afirma. O morador observa a proximidade do Rio Caí e receia que os efluentes contaminem as águas.
Outra moradora, a vereadora Loreni Domingas de Paris, ressalta que a agricultura mantém as famílias do lugar, que há plantação de arroz, moranguinhos e hortifrutigranjeiros sem agrotóxicos. “A gente busca uma qualidade de vida para os moradores e não queremos a instalação dessa empresa”, afirma. Ela observa a importância em atrair empresas para o desenvolvimento do município, mas receia que uma central de tratamento de resíduos possa gerar impacto negativo ao ambiente.
“A área aqui é boa, livre de tudo, e a gente acha que o trabalho dessa empresa vai dar cheiro ruim e pode contaminar a água”, imagina Vera Ternes, moradora da localidade. “E com os caminhões trazendo material, vai ter muito barulho, a gente não vai poder nem dormir”, acrescenta Lília Amália Metzen. Djalma Hensel chama atenção para outro aspecto em relação ao transporte. Na opinião dele, nos deslocamentos, o caminhão pode transportar junto insetos transmissores de doenças, como o Aedes aegypti. “Há compartimentos no caminhão que são ocos, formam ‘conchas’ que podem trazer mosquitos e despejar aqui, não só aqui, mas em toda a extensão até chegar a Capela”, opina.
Secretário da Agricultra aponta desinformação sobre a atividade
O secretário municipal da Agricultura, Auri Patuzzi, observa que a preocupação dos moradores se justifica. “Primeiro, porque não temos maiores informações sobre o funcionamento da empresa, mas uma vez que trabalha com produtos líquidos, a gente tem receio”, afirma. Ele acrescenta que, se for tratado material orgânico, há preocupação se haverá odor, já que existem moradores nas proximidades.
Em relação à possibilidade de a atividade incluir efluentes químicos, o secretário observa que o solo é muito permeável, além de ser um lugar baixo que inunda a cada cheia do Rio Caí. Patuzzi reforça ainda que há muitos agricultores com produção orgânica na região. “Então (a situação) nos preocupa, e procede, sim, o temor dos moradores”, resume.
Ele menciona a importância da atração de empresas para aumentar a arrecadação tributária do município, mas afirma que essa meta não deve se sobrepor aos interesses dos moradores. “Tudo tem um preço e sempre prevalece o bem-estar da família, dos habitantes”, conclui o secretário da Agricultura.
“Os moradores podem ficar tranquilos”
Diante das manifestações dos moradores de Paquete, preocupados com a instalação da central de tratamento de efluentes, a bióloga Nádia Caldeira afirma que a comunidade pode ficar tanquila. Ela é mestre em Avaliação de Impactos Ambientais, com 15 anos de atuação na área, e coordenou o processo de licenciamento ambiental do empreendimento a ser instalado no interior de Capela de Santana.
“Os moradores de Paquete podem ficar tranquilos com relação ao empreendimento”, afirma a especialista. “Foram realizados todos os estudos sobre fauna, flora e meio físico da área e do entorno”, acrescenta. Ela observa que, sem esses levantamentos, não existiria viabilidade para o empreendimento. “A Fepam só aprova o licenciamento ambiental se o empreendedor cumprir todos os quesitos técnicos e legais para implantação de um empreendimento”, reforça.
Nádia afirma também que a predominância da agricultura na localidade foi considerada nos estudos e diz que não haverá impacto algum ao solo. Segundo ela, o tratamento de efluentes líquidos não terá contato com o solo ou a água. “As lagoas são isoladas por geomembranas. É tudo tubulado, controlado, com monitoramento constante”, explica. A bióloga diz ainda que não há odores ou qualquer ou qualquer tipo de contaminação na tecnologia adotada para o empreendimento. “Ainda, tem a questão ambiental de devolver água purificada, que é um dos maiores problemas da humanidade atualmente e para o futuro”, acrescenta.
Nádia afirma que a atividade será desenvolvida conforme amplo projeto tecnológico e ambiental. “Dotados das melhores e mais atuais metodologias de tratamento”, acrescenta. E reforça que tudo foi devidamente licenciado pela Fepam, mencionando que o órgão é bastante exigente quanto a garantias de conservação ambiental.
A bióloga observa ainda que todo o processo de licenciamento e o projeto do empreendimento foi concebido por equipe técnica multidisciplinar, apresentado e discutido com a Fepam, até obtenção da Licença Prévia. “Que é a licença que informa se o empreendimento é viável ou não”, explica. E, depois, passou por todo detalhamento que exige a fase de licença de instalação, que também foi emitida pela Fepam.
Prefeitura suspende alvará de construção
O prefeito de Capela de Santana, José Alfredo Machado, afirma que soube há pouco tempo que estava sendo instalada uma estação de tratamento de efluentes no município pela NW Soluções Ambientais. Ele conta que a área, em Paquete, foi adquirida em 2013, e que, até 2016, não era possível a instalação de empresas de tratamento de resíduos ou indústrias com potencial poluidor em zona rural. Em dezembro daquele ano, porém, ainda na gestão anterior, houve uma mudança no Plano Diretor do Município e essas atividades passaram a ser aceitas.
Machado assumiu o governo em 2017 e recentemente soube que essa mudança no Plano Diretor não atendeu a um requisito legal: o de haver uma audiência pública com os moradores sobre a proposta de alteração. Com base nisso, em outubro, ele suspendeu o alvará de construção que havia sido emitido em favor da NW Soluções Ambientais, para um imóvel na área da estação de tratamento de efluentes. Machado explica que a situação da empresa é legal, pois ela obteve as Licenças Prévia (LP) e de Instalação (LI) junto à Fepam. Por isso, não tem ideia de como a situação será resolvida, lembrando que o alvará de construção foi suspenso, mas não revogado.
O problema veio à tona com as queixas de moradores que souberam da instalação da empresa com o começo dos trabalhos de terraplanagem. Diante das reclamações, o prefeito promoveu uma reunião com a comunidade, que reforçou ainda mais a rejeição à instalação. Machado afirma que a Prefeitura foi intimada a relatar o caso no Ministério Público, que fora acionado por um grupo de moradores.
O prefeito observa que, se a mudança no Plano Diretor for anulada, fica a dúvida se terá efeito retroativo, impedindo essa empresa de se instalar. Nesse caso, ele questiona ainda se a Prefeitura terá que ressarcir investimentos já realizados, uma vez que as licenças ambientais foram concedidas e, em princípio, a empresa supriu as necessidades legais. Ele aguarda uma posição do Ministério Público sobre o caso.
Conselho Agropecuário é contra a instalação
Diante da polêmica, o prefeito José Alfredo Machado pediu um parecer ao Conselho de Desenvolvimento Agropecuário Capelense (Comdac). Em reunião realizada no dia 22 de outubro, os conselheiros foram, por unanimidade, contrários à instalação da empresa no Paquete.
No parecer, o Comdac menciona a possibilidade de contaminação do lençol freático, do leito do Rio Caí, da poluição do ar, e a proximidade de outras propriedades, nas quais são cultivados produtos vendidos à merenda escolar e na Feira da Praça, e a existência de uma escola na localidade. A posição dos conselheiros também será colocada na resposta da Prefeitura ao Ministério Público.
Medida precipitada e falta de informação
Sobre a necessidade de uma audiência pública para mudança no Plano Diretor, que permitiu a instalação de empresas como a central de tratamento de efluentes líquidos, a bióloga Nádia Caldeira diz que a empresa não tem conhecimento dos trâmites internos da Câmara Municipal e que o processo é anterior a 2016. No seu entendimento, na suspensão do alvará de construção do prédio, a Prefeitura foi precipitada, pela pressão dos vizinhos. “É visto que alguns possuíam informações equivocadas quanto à instalação do empreendimento”, observa.
Ela acrescenta que a empresa está tomando as atitudes necessárias administrativamente e judicialmente em relação ao alvará. A bióloga diz ainda que a empresa compreende essa ansiedade da comunidade local quanto ao empreendimento e, por isso, está à disposição para expor o projeto. “A equipe toda conhece bem essa realidade, e não se envolveria em empreendimentos polêmicos, visto os riscos jurídicos que decorrem deste tipo de situação”, afirma. “Ainda, além disto, tem a questão de benefício na geração de empregos locais, aumento da receita para o município, segurança do entorno e manutenção das vias”, completa.
O que diz a licença de instalação, emitida pela fepam
Autoriza, à NW Soluções Ambientais, a implantação da atividade de Central de Tratamento de Efluentes Líquidos Industriais, visando uma capacidade diária de tratamento de 250 metros cúbicos de efluentes industriais provenientes de:
– percolado das valas de aterros industriais e urbanos ou centrais de resíduos sólidos;
– efluente gerado na lavagem da matéria-prima couro wet blue ou atanado de indústrias de acabamento de couros;
– indústrias alimentícias;
– fossas sépticas;
– laboratórios e controles de qualidade, exceto soluções analíticas vencidas;
– indústrias químicas e de plásticos e borrachas;
– indústrias metal mecânicas, inclusive galvanoplastias;
– indústria fumageira (neutralização de fosfina).
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Entre os efluentes mencionados na Licença de Instalação, a central tratará todos, ou somente alguns? Quais?
Nádia – Os efluentes a serem tratados serão somente os permitidos no devido licenciamento ambiental, não sendo permitidos óleos emulsionados e efluentes contendo cianetos, como já havia sido um dos pressupostos do projeto, antes mesmo de iniciar a fase de licenciamento. A empresa, desde que reuniu a equipe e deu start para detalhar projeto e licenciar o empreendimento, já havia definido, na fase de concepção, o que desejaria tratar, até mesmo por ser importante definir isso antes de buscar as tecnologias adequadas para tal.
A empresa pretende reunir os moradores para explicar sobre a atividade que será instalada?
Nádia – Apesar da legislação ambiental não prever audiência pública para este tipo de empreendimento, conforme a Resolução Comana nº 01/86, se for da vontade das pessoas da comunidade ter conhecimento sobre o projeto a ser implantado no Paquete, poderão contatar a empresa, que se coloca à disposição para esclarecer qualquer dúvida e expor dados técnicos da central.