É crescente o número de idosos que escolhem viver nestas moradias em busca de mais conforto
“Eu gosto e me sinto bem com as pessoas daqui. É como uma grande família”, disse o aposentado Ruben Herrmann, 67, que decidiu morar em uma casa de repouso após sofrer nove Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC). Assim como ele, outros idosos também têm escolhido viver em moradias para a terceira idade pelos inúmeros benefícios que elas oferecem em termos de socialização e cuidados específicos. Isso acaba por desmitificar a imagem negativa que historicamente esse tipo de instituição carrega.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) o número de pessoas com idade superior a 60 anos chegará a 2 bilhões até 2050, o que representará um quinto da população mundial. No Brasil, conforme dados do Ministério da Saúde, em 2016 havia a quinta maior população idosa do mundo, e, em 2030, o número de idosos ultrapassará o total de crianças entre zero e 14 anos. É diante do envelhecimento populacional que as casas de amparo ganham cada vez mais espaço, se tornado uma tendência.
“Eu trabalhei muitos anos na Editora Globo como desenhista, em Porto Alegre, e depois voltei para Montenegro, onde continuei atuando na área”, conta Herrmann, revelando o que o levou a optar por uma casa de repouso. “Por conta da pressão alta, acabei desenvolvendo algumas complicações e tive que me recolher, foi quando decidi procurar uma casa que cuidasse de mim”, completou o aposentado, que há quase cinco anos vive na Associação Beneficente Casa de Amparo Mão de Deus (ABCAMD), no bairro Santa Rita.
Com a falta de tempo dos familiares – muitas vezes condicionados a uma rotina puxada de trabalho –, está cada vez mais comum pessoas como o seu Herrmann optarem pelas casas de repouso como lar para passar esse momento de suas vidas. Bem longe daquela antiga ideia que a população tinha sobre asilo, atualmente as casas de repouso se tornaram locais onde pessoas da terceira idade podem manter uma vida independente, tranquila e feliz.
“A casa me acolheu muito bem e eu só tenho a agradecer”, enfatizou o aposentado. “Optei por esse lugar porque me apaixonei desde a primeira vez que vim aqui, então eu dizia que quando eu não tivesse mais condições de trabalhar e nem de ficar na minha irmã, iria para um asilo e foi isso que fiz”, acrescentou o montenegrino, afirmando que está feliz com a escolha e com os novos amigos que fez na casa.
Quem também compartilha do mesmo sentimento é a aposentada Ivonir Hercer, 83. Muito divertida, ela conta como foi o dia que comunicou aos filhos a decisão de morar na casa de repouso. “Eles me perguntaram, assustados, se eu sabia o que era um asilo, e eu disse que era como uma casa de família”, relembra Ivonir, que se divertiu com as reação dos filhos. “Cada vez que eles vêm me visitar, dizem ‘mãe, a senhora não pensou melhor em voltar?’, e eu sempre digo não. Eu gosto daqui”, enfatizou.
Há três anos vivendo na Casa de Amparo Mão de Deus, dona Ivonir revela que foram as sequelas de um derrame que a levaram a optar por esse tipo de moradia. “O derrame prejudicou um braço e uma perna minha e, por isso, não pude mais fazer os meus serviços e tomei a decisão morar aqui”, relembra a aposentada que, assim como o colega Herrmann, também conta com amizades dentro da casa.
“Por causa dos meus problemas, fico grande parte do tempo sentada, conversando com minha melhor amiga, colocando o papo em dia e dando muita risada. Sempre digo que nunca devemos brigar porque a gente não tem irmãos e irmãs aqui, só tem compadres e comadres, e o resto é tudo estranho”, ressalta dona Ivonir.
Socialização dos idosos é um dos maiores ganhos
Atualmente, a ABCAMD atende um total de 76 idosos e, junto a outras instituições que prestam os mesmos serviços em Montenegro, integram um número muito restrito no País. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 71% dos municípios não têm instituição para idosos e a maior parte das existentes são filantrópicas (65,2%), 28,2% privadas, e apenas 6,6% públicas. Dentro de um universo amplo e diverso, histórias como as dos aposentados Ruben Herrmann e Ivonir Hercer se cruzam e mostram que, ao contrário do senso comum, é possível viver com qualidade quando se trata de casas de repouso.
“Aqui tem de tudo”, conta dona Ivonir, se referindo à lista de programação da ABCAMD, que inclui atividades recreativas, rodas de conversas, atividades físicas, entre outras. “Quando ganhamos presente parecemos umas crianças”, brinca a aposentada.
Para Herrmann, a visão do lugar é a mesma. “O pessoal aqui é muito divertido. É interessante”, comenta o aposentado, que fica grande parte do tempo em uma das poltronas localizadas no centro da sala da casa. “Eu gosto desse cantinho aqui na casa porque consigo ter uma visão mais ampla”, acrescenta Herrmann, salientando a forma como suas particularidades são respeitadas na casa.
Como uma grande família: afeto une idosos e funcionários da Casa de Repouso
“Desde o primeiro momento que eles acordam, é com a gente que eles têm contato. Somos nós que tiramos eles da cama, damos o cafezinho, levamos para o banho, servimos o almoço e, assim, passamos a conhecer o jeitinho de cada um”, explica a técnica de enfermagem e funcionária da ABCAMD, Kátia Farias. Ela destaca como se constroem as relações entre os idosos e os funcionários, na convivência do dia-a-dia.
Mesmo que a casa funcione com quase o limite das vagas preenchidas, a técnica conta que são nos pequenos detalhes que o vínculo afetivo entre funcionários e moradores se estabelecem. “Como estamos com eles diariamente, conseguimos descobrir o que agrada e desagrada cada um, e devido à convivência, também vamos nos apegando. É como se estivéssemos cuidando de uma mãe ou um pai nosso”, conta Kátia, que se emociona ao falar das experiências no lugar.
É por conta de todo esse carinho e atenção que muitos idosos consideram a casa como seus próprios lares, como revela dona Ivonir Hercer. “Quando meus filhos vêm me buscar para passar o dia com eles, eu já aviso que depois quero voltar para minha casa”, enfatiza a aposentada, que não polpa esforços para elogiar o atendimento que recebe da instituição montenegrina.
Um morador especial
De jeito simpático e alegre, o mecânico aposentado Plínio Lenhardt compartilha – com os colegas – muito mais do que a decisão de ter ido por conta própria morar na casa de amparo. Através da imposição das mãos, ele ajuda na cura de dores e outros males pelo que chama de energização, um dom especial que herdou de família. “A primeira professora que tive foi a minha avó, que era parteira e trabalhava com energias”, conta Lenhardt. “Depois fui ampliando os conhecimentos e desenvolvendo as técnicas”, completou.
Quando solicitado pelos colegas ou funcionários da casa, o energisista ajuda sem cobrar nada. “As pessoas possuem pontos específicos em que a gente toca para curar o que é preciso, seja articulação, dor de cabeça e barrigada, por exemplo. Isso tudo é possível tratar com as mãos”, explica o aposentado, que se tornou uma espécie de médico espiritual da casa.
Por todos os cantos do lar, não faltam depoimentos de pessoas que dizem terem sido curadas pelo montenegrino. Um deles é o seu Ruben Herrmann, que afirma ter controlado a diabetes após sessões de energização. Outra paciente que também passou pelas mãos do energisista é a Ivonir Hercer, que revela ter sido curada de uma catarata.
“Nós somos uma irmandade aqui dentro. Todo mundo é amigo de todo mundo. Lá fora eu estava sozinho, então falei para meus filhos que queria ficar em uma casa apropriada para isso e, como estou aposentado, ganho o suficiente para pagar a estadia e posso continuar ajudando as pessoas que precisam de mim”, justifica Lenhardt.
Para pedagoga, asilos têm estigma injustificado
Responsável pelo Projeto Promovendo a Dignidade da Pessoa Idosa, do Governo Federal, a pedagoga Mari Lopes salienta a importância do debate sobre o aumento da expectativa atrelado à qualidade de vida para desmistificar a ideia negativa das casas de amparos. “Por que esse tipo de instituição não pode ser mais considerado um depósito de pessoas como era antigamente?”, questiona Mari. “Porque eles têm atividades e continuam ativos como deve ser”, enfatiza.
Para a pedagoga, que desenvolve atividades na ABCAMD, as casas de amparos acabam oferecendo a atenção e cuidado que muitas vezes as famílias não conseguem dar. “Aqui eles não têm um dia de tédio, o que nos permite uma nova visão”, declara Mari. “Tanto no turno da manhã quanto da tarde, eles têm atividades diversas e são convidados a participarem, independente do grau de locomoção cada um.”
Como fazer a escolha certa?
Após a decisão, é preciso que os familiares e o idoso tomem alguns cuidados na hora da contratação do serviço de uma casa de repouso. Através da resolução RDC 283/2005, publicada em 2005, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) regulamentou o funcionamento desses estabelecimentos no Brasil. Por isso, é necessário conferir se o local está totalmente de acordo com as normas de segurança e relacionamento determinadas pelo órgão.
Outro passo importante é a família visita no local junto com o idoso para que, dessa forma, ambos possam fazer a melhor escolha.Tanto o idoso quanto os familiares precisam estar seguros do local escolhido.
Mas quais são as vantagens de morar em uma casa de repouso?
Essa pode ser uma excelente opção para os idosos que gostam socializar, precisam de assistência e cuidados com certa frequência e ainda querem manter certa independência com relação aos seus familiares.
Nelas, dependendo da estrutura oferecida, os idosos recebem cuidados como avaliações médicas, alimentação acompanhada por um profissional de nutrição, realizam atividades de lazer acompanhadas por terapeuta ocupacional, têm serviços de enfermagem, higienização e administração dos medicamentos.