Cultura de paz. Criado por lei federal, núcleo desenvolve ações no Ciep
Ivo Bühler para a superação de desentendimentos por meio muito diálogo
Conflitos ocorrem em qualquer ambiente e por diversas razões. Dentro do ambiente escolar, no entanto, eles ganham diferentes proporções, porque acabam atrapalhando o desempenho dos alunos e, ocorrendo em um período ainda de formação da personalidade, podem deixar marcas pelo resto da vida. É focando nessa questão que nasceram os Núcleos Escolares de Gestão de Conflitos e Combate ao Bullying (Negecobs).
A iniciativa foi criada a partir da lei federal 13.185, de 2015, – a chamada Lei do Bullying – e foi instituída, no Estado, nas instituições de turno integral. Em Montenegro, desde 2016, funciona um Negecob no Colégio Estadual Ivo Bühler, o Ciep. Ele acontece em uma sala especial nomeada pelos próprios estudantes como “Sala do Bem-Estar”, “Cantinho da Paz”, “Cantinho da Aliviação”, dentre outras nomenclaturas que sugerem acolhimento e humanização. Os títulos explicam bem o sentido do espaço.
Responsável pelo núcleo, a educadora Vera Regina Santos Franco explica que a sala não existe para punir ou apontar culpados pelas brigas ou demais situações que ocorrem. Os alunos em conflito – às vezes entre eles, às vezes com o professor, que também participa – são convidados para uma conversa com ela. Os envolvidos são ouvidos individualmente e depois são colocados de frente com a pessoa com quem dividem o problema. Ali, com o uso de um “objeto de fala” – só tem a palavra quem segura o objeto – eles podem falar, ouvir e serem ouvidos.
“É para possibilitar uma auto-responsabilização. O núcleo ajuda o aluno a assumir a responsabilidade pelo que ele fez. Para isso, ser escutado e ouvir o outro é o grande ponto”, resume Vera. Ela avalia que muitos dos que chegam em conflito, por vezes, trazem problemas da rua ou de casa, o que acaba reverberando nas atitudes dentro do ambiente escolar. O momento de conversa e troca entre as partes, por isso, é imprescindível.
Vera recebeu o treinamento para conduzir estes que chama de “círculos restaurativos” em 2015. Interessada no tema, foi atrás de outros treinamentos. O mais recente ocorreu no Fórum da cidade neste mês. Individual ou em grupo, todos os participantes do Negecob são tratados como iguais. O assunto que dividem com a educadora é confidencial, salvo se alguma interferência for necessária. Ela já teve casos de pais que, por várias razões, foram convidados a participar dos círculos.
Resultado para os alunos
A aluna Kailani, do sétimo ano, resume o núcleo como um lugar onde pode melhorar. Ela precisou participar algumas vezes no ano passado, envolvida em brigas e em “fofocas” com as colegas de turma. Viu na professora Vera uma forma de resolver os problemas.
O mesmo ocorreu com o estudante Leonardo, do quinto ano. Das vezes em que foi encaminhado ao núcleo, ele lembra da última, quando brigou com um colega que o chamava de “palito” por ser magrinho. Em conversa, ambos reconheceram que eram iguais do ponto de vista físico e pediram desculpas pela briga um ao outro.
São casos pequenos para quem lê, mas que, sem dúvida, fizeram a diferença na realidade dos estudantes do Ciep. Diretor da escola, Samuel da Silva Borges lembra de um caso mais representativo. Duas turmas de Ensino Médio foram unidas em um ano letivo e um sério problema de convívio se instaurou na sala. Uma ação foi necessária. Primeiro, uma grande conversa com a turma ocorreu. Após, seis dos integrantes foram destacados para um círculo no Negecob.
“Aquilo foi uma amostra dos resultados que isso dá para a escola. Eles entraram muito agressivos, participaram e saíram chorando, em uma tranquilidade. Eles tiveram um amadurecimento de 100%”, lembra Samuel. Responsável pela escola, ele lamenta que a educadora responsável não possa se dedicar ainda mais à iniciativa para um trabalho mais aprofundado. A carga horária atual é de dez horas.
Vera Regina frisa que a prática não vem sem desafios. Ela ainda trabalha para desvencilhar a imagem do Núcleo de algo punitivo e amedrontador na escola. Absorver os sentimentos e anseios dos participantes dos círculos também é algo desgastante. Apesar disso, os momentos de cura e de alívio que pode proporcionar a quem carrega algum problema – do tamanho que for – traz a gratificação que ela precisa para seguir estudando e aperfeiçoando a metodologia.