Barbeiras, sim! E com muito orgulho

Mulheres usam a criatividade e a sensibilidade para superar preconceitos e conquistar seu espaço no mercado

As mulheres estão cada vez mais “invadindo” um mercado de trabalho que até pouco tempo era predominantemente ocupado pelos homens. O tempo em que ser chamada de barbeira era adjetivo para qualificar mulheres que dirigem mal acabou. Hoje em dia, elas têm orgulho de se apresentarem como profissionais que cuidam do visual masculino. Em Montenegro, várias mulheres encontraram um novo sentido para suas vidas no serviço de barbearia. E, embora ainda exista preconceito, elas investem na qualificação, no bom atendimento e na boa conversa para mostrar que são capazes de apresentar resultados surpreendentes, que só a sensibilidade e a visão feminina permitem.

Quando se fala em barbearia, logo surge a imagem de um salão com uma cadeira adequada para fazer barba e cabelo, um espelho grande na parede e outro menor, para que o cliente possa ver como ficou o corte. A figura clássica de um homem vestindo jaleco branco não escapa do tradicional formato das barbearias. Mas isso tudo é coisa do passado. Embora ainda exista o modelo tradicional, é com inovação que o mercado se aquece e amplia o número de serviços oferecidos. A sala branca ganhou cores. A barbearia passou a ser um local para tomar cerveja, café, jogar sinuca e colocar a conversa em dia. E os senhores de avental passaram a dividir espaço com mulheres empreendedoras.

Joziane Ferreira (Jô), de 40 anos, é uma dessas mulheres. Foi de pequena que ela desenvolveu o gosto pela profissão de barbeiro. Durante 20 anos, Jô se dedicou ao atendimento feminino e a ministrar cursos na área como cabeleireira profissional. Há cinco anos, resolveu dar uma virada em suas atividades e dedicar-se mais ao “universo masculino”. “A procura masculina aumentou muito nos últimos anos. Os homens estão cada vez mais vaidosos e exigentes”, comenta.

Jô oferece serviço completo: corte de cabelo, barba, design de sobrancelhas e alisamento, entre outros. Além disso, decorou o ambiente onde trabalha para que eles e elas sintam-se acolhidos. De um lado do salão, está presente a delicadeza de uma decoração em tons de rosa e branco. No espaço “deles”, cores fortes, como preto e cinza, ditam o estilo contemporâneo do local.

A busca por inovação e produtos de qualidade também é usada como arma para conquistar os clientes. E parece que isso tem dado certo. “Tenho clientes de várias cidades. Estou abrindo mais um salão em Harmonia e pretendo ampliar o salão aqui de Montenegro. Já estou contratando mais um funcionário”, revela a profissional.

Jairo Barbosa, de 22 anos, é um dos clientes que não abre mão dos serviços de Jô, inclusive o de consultoria na hora de definir o estilo do corte. Ele mora em São Sebastião do Caí, mas faz questão de vir para Montenegro para ser atendido pela profissional. “Já fui a vários salões no Caí, mas, depois que vim aqui, nunca mais troquei. Não achei nenhum erro no trabalho dela. Pra mim, é o melhor salão a que já fui”, destaca o jovem.

“Meu diferencial é o atendimento”
Num ambiente rústico, com som e climatização, café, cervejas e uma mesa de sinuca estão à disposição dos clientes, ou melhor, dos amigos/clientes da barbeira Daniela Pereira, 28. A clientela é recebida como quem vai à casa de um amigo. Daniela não quer que seu salão seja apenas um local onde as pessoas vão em busca de serviços de beleza; ela espera acolher a todos como quem recebe membros de sua família. “O cliente não quer chegar aqui e encontrar uma linha de produção. Tu é psicóloga, barbeira e amiga. Eu sou de Belém do Pará, pra mim é como se todos daqui fossem da minha família, por isso estreitamos os laços de amizade”.

DANIELA Pereira estabeleceu uma
relação de amizade com seus clientes

Daniela abriu sua barbearia há dois anos. No início, o dinheiro mal cobria a despesa do aluguel, mas as coisas mudaram. Hoje ela sonha em expandir os negócios. “Quero abrir várias outras barbearias, mas mantendo este meu cantinho, aqui em Montenegro”, conta.

Daniela fez vários cursos voltados à área da beleza, mas foi na barbearia que “se encontrou”. “Não trocaria de carreira por nada. Digo que a barbearia é a minha filha”. E como todo o filho, a empresa exige tempo e investimentos. Nas últimas semanas de 2018, houve grande movimento no espaço. Daniela chegava às 9h sem ter hora para retornar para casa, o que, para ela, não foi problema. Ao contrário, foi motivo de alegria e satisfação pessoal.

Cortes para todos os gostos
No dia-a-dia da profissão de barbeira, é preciso estar preparada para atender ao gosto do cliente. Há quem prefira os cortes tradicionais, mas se o cliente for um pouco mais ousado e vaidoso, a profissional tem que estar atenta ao que “rola” no mundo da moda.
A influência de jogadores de futebol, cantores e artistas em geral costuma “fazer a cabeça” dos homens mais modernos. Veja alguns exemplos:

“Ser barbeira não é simplesmente cortar cabelos”, diz Nira
Antes de colocar as mãos na tesoura, Joziane Ferreira faz uma série de perguntas sobre a personalidade de seus clientes. O objetivo é, em conjunto, escolher um corte adequado ao estilo de vida e profissão da pessoa.

Estabelecer um diálogo e uma relação de amizade com os clientes também faz parte da rotina de trabalho de outras profissionais barbeiras. Nira Regina Sant Anna da Rosa, 53 anos, por exemplo, usou a experiência adquirida com anos de trabalho no comércio para investir no próprio negócio. O grande desafio foi obter a confiança dos clientes. “No começo de um negócio como este, você tem que conquistar a clientela individualmente. O cliente só volta se ele receber o que ele pediu”, diz a barbeira.

Há três anos, Nira inaugurou sua barbearia, ao lado da casa onde mora. Ela atende exclusivamente ao público masculino. O atendimento ocorre de forma individual, sem fila de espera. “A minha ideia é oferecer privacidade ao cliente. Aqui os homens têm o mesmo tratamento que uma mulher recebe ao ir no salão de beleza, eles saem com o cabelo lavado, seco e modelado, prontos para irem a qualquer evento”, salienta.

A BARBEIRA Nira da Rosa conquistou a confiança do empresário Marcelo Silva

Nira busca estar sempre por dentro das novidades. Ela continua fazendo cursos e faz questão de trabalhar com produtos de boas marcas. E para que os clientes fiquem mais à vontade, ela passou a pesquisar sobre assuntos como futebol e outros temas de interesse de seu público. “Não é simplesmente cortar o cabelo; o cliente senta na cadeira e a gente conversa. Vejo o que ele costuma fazer e até que ponto aceita mudar. A intenção é descobrir o que eu posso fazer para que ele se sinta melhor”, explica.

A barbeira tem como meta conquistar, pelo menos, dois clientes a cada mês. Mas está satisfeita com as cerca de 150 pessoas que já utilizam seus serviços. A propaganda feita por quem já é cliente, há anos, faz toda a diferença, garante Nira.

O empresário Marcelo Silva é um dos responsáveis por “divulgar” o trabalho de Nira. Ele foi o primeiro cliente a fazer a barba com ela, posteriormente passou a cortar o cabelo e hoje em dia indica os serviços dela para os seus amigos. “Acompanhei a mudança de ramo dela e passei a ser cliente. Sempre estou aqui e trago amigos, o bacana é que quem vem permanece. Hoje é difícil conseguir agenda, tem que ligar antes. No início eu vinha e era atendido e agora não. Essa evolução é legal”, observa o empresário.

Realização profissional ao seguir o sonho da mãe
Aos 17 anos, Rafaela Maia Pereira começou a trabalhar na área da beleza. No começo, a ideia era ter um ganho extra e realizar o sonho da mãe dela. “Comecei mais a carreira porque era um sonho da minha mãe. Ela faleceu muito jovem, com 36 anos, em um acidente de trânsito, e eu acabei abraçando esse sonho para mim. Claro que sempre gostei e ela sempre me incentivou. Com 12 anos, eu já cortava o cabelo do meu irmão”, conta.

RAFAELA ainda percebe certo preconceito por exercer uma profissão predominantemente masculina. Foto: Arquivo pessoal

Hoje, com 19 anos, Rafaela se dedica exclusivamente ao ofício de barbeira e cabeleireira. O conhecimento foi adquirido aos poucos. Na escola de formação, ela aprendeu as técnicas, mas foi com o trabalho em salões da cidade que Rafaela pegou prática em como tratar o publico. “Procuro sempre ser bem atenciosa e fazer algo a mais pelo cliente. Comecei como auxiliar de cabeleireiro e, em seis meses, abri meu espaço. Como eu sou uma pessoa que sempre quer mais conhecimento, gosto de ter asas. Por isso, também trabalho em uma barbearia com três grandes profissionais”, comenta.

Rafaela também precisou aprender a lidar com o preconceito. “Como sou menina, tinha cliente que perguntava se eu não iria cortá-lo. Eu respondia ‘porque que vou te cortar, sou barbeiro como qualquer outro?’. Aí eles diziam que eu era menina e que nunca havia me barbeado. Não dou bola, confio no meu potencial”, assegura.

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