Efeitos. Quebra da safra em 2020 foi tão severa que nem o ótimo sabor salvará este ano
A colheita da bergamota Montenegrina, iniciada em agosto, observa uma dubiedade em relação à lei da oferta e da procura. O mercado está pagando mais pela fruta, escassa após a quebra da safra ocasionada pela estiagem. O paradoxo está no fato de a insuficiência de oferta não ser resultado do aumento da demanda, mas em perdas de até 70% em alguns pomares, tirando dos agricultores a possibilidade de incrementar seu lucro. Ao contrário, mesmo com a valorização, eles deverão apenas cobrir os prejuízos. As frutas que vingaram no pé estão saborosas, todavia menores e com opções de venda limitadas.
Outro fator técnico a ser considerado é que uma Montenegrina miúda pede mais unidades para encher a mesma caixa, reduzindo ainda mais a margem de lucro. Entre as fontes ouvidas pelo Ibiá, a atual presidente da Associação de Citricultores do Vale do Rio, Elisandra Kehl, avisa que o lucro não será igual àquele alcançado em 2019.
Cada membro da organização faz sua venda individual; mas, na média observada, os preços têm variado entre R$ 48,00 e R$ 52,00 por caixa, contra os R$ 28,00 a R$ 35,00 pagos do ano passado. Mas a presidente reitera que este aumento não compensará ante a queda em quantidade e qualidade. “Não vamos nem conseguir chegar perto daquilo que foi a safra do ano passado”, afirma, ao alertar que quebra “anormal” de 2020 ainda trará mais prejuízos.
O agricultor Jaime Antônio Kochenborger, presidente da Associação de Produtores Rurais de Campo do Meio e Região (Citruscampo), explica que havia previsão de uma quebra de safra, baseada no ciclo de alta e baixa produtividade. Todavia, ela foi ampliada muito por uma seca inesperada. “Não sei dizer ainda quanto é realmente esta queda. Mas, nas variedades Caí e Pareci foi em torno de 60%”, analisa.
O valor pago pela caixa está cerca de 30% mais alto, o que traz alívio para quem temia não colher nada. “Mas, em valores gerais, não vai alcançar os da safra 2019”, confirma. E se na Montengrina a queda de produção for igual às primeiras variedades colhidas, a redução na renda do produtor será entre 25 a 30%, em relação a 2019.
Sobrevivência graças à qualidade da fruta
O valor pago pela caixa na propriedade varia conforme o tamanho da fruta, partindo, obviamente, da mais bonita com o preço mais alto. Todavia, em geral há poucas unidades desta fruta diferenciada; sendo que nesta safra a maior parte da Montenegrina deverá ser de frutas inferiores.
Uma das revendedoras no Vale, a Master Citrus Comércio Atacadista de Frutas, classifica esta como uma safra totalmente atípica. Em relação à Montenegrina, o diretor Márcio Luciano de Mello ressalta que já era esperada uma colheita menor do que a dos anos anteriores, primeiramente pelo fato de a floração do ano passado ter sido afetada pelo clima, e em seguida pela estiagem. “Resultando, assim, em uma safra em torno de 60% menor se comparada a uma normal. Isso claramente interfere no preço”, diz.
Todavia, Mello ressalta também um ganho de qualidade com os dias secos, conferindo à Montenegrina de 2020 equilíbrio entre acidez e açúcares. “Esse fato teve, como consequência, uma aceitação muito boa por parte do consumidor final”. E foi somente esta característica que garantiu o incremento de até 30% no preço, em comparação com 2019. “Mas, ainda longe de suprir o prejuízo causado pela estiagem. Que, além de gerar custos adicionais com irrigação, causou danos nas plantas e frutas que ultrapassaram em muito o valor adquirido a mais no comércio”, finaliza Mello.
Fruta pequena vai para suco
A avaliação da Emater em Montenegro reitera a projeção de prejuízo à produtividade e à qualidade dos citros. Mas há cenários distintos: a produção conseguiu se recuperar através do sabor e padrões de qualidade; porém, grande parte apresenta tamanho menor do que o mercado exige, sendo então direcionado à indústria de suco.
Segundo a extensionista rural agropecuária, Luísa Leupolt Campos, o preço da fruta de mesa está realmente mais alto, como é normal para este período. “Estamos na safra da Montenegrina, que apresenta preço superior à Caí e à Pareci”, explica. Todavia, ressalta que os preços pagos (média da caixa de Montengrina para mesa R$ 40,00; para suco R$ 6,00) são insuficientes para cobrir todas as perdas do setor.
“É importante entender que os agricultores fazem altos investimentos para terem uma fruta de qualidade padrão, que o mercado exige”, assinala Luisa. Todavia, devido ao tamanho, se viram obrigados a vender parte das variedades Caí e Pareci, e agora da Montenegrina, para suco, onde o preço varia apenas em R$ 5 a R$ 7,00.
Relatório regional
De acordo com o Informativo Conjuntural, produzido pela Gerência de Planejamento da Emater/RS-Ascar, em função das variações climáticas (estiagem, depois excesso de chuvas), os citros floresceram diversas vezes; dificultando tratos culturais e tratamentos adequados. A variação de tempo também causou amadurecimento desuniforme dos frutos; e a posibilidade de temporões – que ganham preço ainda melhor – não pode ser confirmada agora. Segundo o laudo, está encerrada no Vale do Caí a colheita das frutas cítricas de ciclo precoce a médio, como as cultivares Satsumas, e Poncã, e as cultivares de laranja Shamouti, Seleta, Céu Precoce e Umbigo Bahia. Ao mesmo tempo, é incrementada a colheita das cultivares tardias, Pareci, Montenegrina, Tangor Murcott e laranjas Valência, Céu Tardia e Umbigo Monte Parnaso.