As mudanças na vida das mulheres em três gerações

Dia Internacional da Mulher. Elas conquistaram direitos e assumem cada vez mais responsabilidades na sociedade

A sociedade está em constante mudança e muitos dos conceitos do que é certo ou errado variam a cada geração. Em alusão ao Dia Internacional da Mulher, celebrado nesta quinta-feira (8), as histórias de uma avó, sua filha e sua neta, moradoras de Montenegro, mostram um pouco dessa transformação contínua. Com alguns pontos de vista diferentes, outros nem tanto, elas falam sobre cotidiano e opinam sobre assuntos diversos.

A costureira aposentada Norma Lurdes Endres, 82 anos, recorda a infância, adolescência e parte da juventude vivida no interior de Montenegro. “Era tudo muito diferente, não tinha os agarramentos que têm hoje”, observa. Por volta dos 15 anos, ela conheceu o marido em uma festa de aniversário, divertimento comum que acabava por aproximar os jovens. “Tinha reuniões dançantes, ia um gaiteiro e a gente dançava”, resume. Norma morava na localidade de Pinheiros e Gustavo Rodolfo Kochemborger (já falecido) era de Alfama. Os dois dançaram juntos, depois ele começou a visitá-la em casa.

E como era o namoro? Podiam dar as mãos e até uns beijinhos na boca, mas nada além disso. Norma conta que, na época, ter relação sexual antes do casamento vulgarizava a mulher. “Lá em casa, nenhuma das mulheres casou grávida”, acrescenta. Ela menciona um caso, em sua juventude, em que um pai expulsou a filha de casa porque engravidou ainda solteira. Norma casou aos 20 anos e teve rês filhas. Entre elas, a professora Liana Marta Kochemborger, 52 anos.

Liana conta que a mãe a criou com liberdade para sair, mas acredita que hoje é mais difícil porque há menos segurança. “Antes se podia voltar de madrugada para casa e não tinha problema, hoje não dá para fazer assim”, resume. Ouvindo a história da mãe, Liana observa que já na sua geração mudou muito a forma de se relacionar no namoro, com bem mais intimidade. “Não era só beijo, tinha relação sexual antes do casamento”, afirma. Divorciada há vários anos, ela conheceu seu ex-marido a caminho da faculdade, quando estudava História. Ele era motorista do ônibus que transportava os acadêmicos. Eles se casaram e tiveram uma filha, Luana Cabral.

“A vó vai achar um absurdo…”, diz a neta
Aos 21 anos, Luana Cabral é recepcionista em uma imobiliária e acadêmica de Fisioterapia. “A vó vai achar um absurdo o que eu vou dizer”, observa a neta. Ela refere-se às diferenças nos relacionamentos de casais. Luana lembra que, enquanto na geração de Norma a maioria das mulheres casava virgem, hoje a vida sexual começa cada vez mais cedo, assim como é mais comum a gravidez ainda na adolescência. “E muitas não transam apenas com um, mas com vários simplesmente porque gostam de transar”, observa. Para ela, embora as tansformações, a sociedade ainda é muito machista e reluta em aceitar que a liberdade seja para todos e não só para os homens.

Nesse contexto, Luana cita casos em que a mulher é estuprada e, embora seja vítima, há quem a condene e culpe pelo ocorrido. “Dizem que é porque a mulher estava com roupa curta, porque provocou”, afirma. Ela acrescenta que as mulheres são mais julgadas que o homem. A avó, Norma, lembra que antigamente não se ouvia falar em alguém ter sido estuprada, mas as três observam que a comunicação era mais limitada.

Um ponto em que as três concordam é sobre a maior liberdade de expressão das mulheres. “Sentar para conversar sobre esses assuntos é uma demonstração disso, porque antigamente não havia essa liberdade entre mãe e filha”, resume Liana Kochemborger.

Aborto é assunto polêmico e divide opiniões
A liberação sexual das mulheres foi impulsionada pelo aumento dos contraceptivos, no fim da década de 1960. O anticoncepcional reduziu o receio da gravidez antes do casamento. Norma afirma que tomou pílula após ter as três filhas, quando estava na faixa dos 30 anos. A filha e a neta, Liana e Luana, no entanto, cresceram com essa alternativa para evitar gravidez indesejada.

Nesse quadro, é mencionado um assunto polêmico que divide opiniões: o aborto. A legislação possibilita interromper a gestação em alguns casos, como estupro, por exemplo. Para Luana, no entanto, a mulher deveria ter total liberdade para decidir sobre o aborto em qualquer circunstância. Sua avó pensa diferente. Para ela, o aborto pode ser aceito apenas em casos de gravidez em consequência de um estupro. Norma justifica que há anticoncepcional para prevenir. E Liana tem outra opinião. “Fazer aborto vai da situação da gestante e da consciência de cada pessoa, mulher ou profissional da saúde. Eu não faria”, afirma.

Dupla jornada: em casa e no trabalho
Ao longo das últimas décadas, a mulher conquistou espaço no mercado de trabalho e, não raro, acumula os papeis de profissional, mãe e dona de casa. O trabalho é um aspecto comum nas histórias de Norma, Liana e Luana.

A avó recorda a infância e diz que, desde cedo, ela, as três irmãs e os quatro irmãos eram estimulados a trabalhar e ter alguma renda. Por isso, cada um ganhava uma vaca para tirar leite e vender. Morando no interior, ela parou de estudar ao concluir o antigo primário, que corresponde às séries iniciais. O pouco estudo, no entanto, não a impediu de ter uma profissão. Em casa, Norma aprendeu os primeiros passos na costura. Aprimorou trabalhando e tornou-se costureira profissional.

Liana seguiu a carreira de professora e salienta o esforço da mãe para pagar seu curso no magistério, que só era oferecido na rede particular. Ela começou trabalhando com contrato até fazer concurso e ser nomeada na rede municipal, em 1985, e seguiu estudando, fazendo curso superior. Por gostar muito do seu trabalho, Liana decidiu continuar em atividade mesmo após a aposentadoria.

Luana concilia o trabalho como recepcionista e o curso de Fisioterapia. Seus planos profissionais incluem fazer especialização na área de atendimento voltado a idosos e ou à saúde da mulher.

Apesar das conquistas das mulheres no campo profissional, Liana e Luana observam que ainda há casos em que os salários não se equiparam com os dos homens. Essa desigualdade é confirmada em estudo divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em relação ao rendimento habitual médio mensal, entre 2012 e 2016, as mulheres ganham, em média, 75% do valor recebido pelos homens.

Algumas facilidades da vida “moderna”
A professora Liana Kochemborger observa algumas criações da indústria que facilitam a dupla jornada encarada por muitas mulheres. Enquanto Norma Endres precisou recorrer a fraldas de tecido para as filhas, Liana contou com as descatáveis para usar em Luana Cabral. Liana também não precisou fazer todas as roupas da sua filha, pois o comércio já disponibilizava e, para lavar, há máquina. Sua mãe, porém, recorda que nada havia pronto na época em que suas filhas eram pequenas. “A vida da mulher hoje é mais fácil, tem mais comodidade, máquina de lavar roupa, faxineira”, acrescenta Liana.

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