Com 100 anos, guarda na memória histórias da sua família e de Pareci Novo
Em um século muitas mudanças ocorrem no mundo. Se regredirmos 100 anos e olharmos para o macro poderemos observar muitos avanços na tecnologia, inúmeros conflitos, o advento da internet e enormes mudanças culturais. Se quisermos saber o que aconteceu no micro da nossa região, basta perguntar para Lucy Heldt Bartel, que acompanhou o desenvolvimento e crescimento de Montenegro e Pareci Novo.
Lúcida e bastante conversativa, Lucy conta que nasceu em 17 de setembro de 1922, na localidade de Campo do Meio, no interior de Montenegro. Apenas três semanas após o seu nascimento, seus pais se mudaram para uma propriedade na localidade de Faxinal, também interior de Montenegro. “No Faxinal eu me criei e estive até os 28 anos lá”, recorda.
Da vida no interior montenegrino, a idosa centenária lembra-se da pesada rotina agrícola. Ela conta que seus pais acordavam às 4h para tirar leite e deixar as diferentes garrafas prontas. Depois, seus três irmãos mais velhos (ela também teve três irmãs mais novas) saíam para fazer, a cavalo, a entrega na porta da casa de diferentes clientes no Centro de Montenegro. Após as entregas, dois deles ficam na cidade para estudar – e depois voltavam a pé até a propriedade da família.
Lucy também estudou. Não chegou a ir ao colégio no Centro da cidade, tinha aulas em Alfama, com um professor que vinha de Campo do Meio. Da rotina, ela lembra que após as aulas era a hora de se fazer o almoço, seguido do tema e, então, a partir dos 10 anos, ir para a roça com o pai. Daquele tempo, também se lembra das empreitadas do pai com o avô materno, Carlos Frederico Schubert – que hoje dá nome à escola da comunidade de Faxinal. Juntos, eles tiveram uma tafona e também plantaram fumo.
Enquanto isso, Lucy crescia e, aos 15 anos, iniciou um curso de corte e costura. “Eu ia a pé ou a cavalo para Montenegro para fazer (o curso)”, conta. Uma vez conquistado o diploma, Lucy passou a costurar para clientes de fora da família. Ela manteve a profissão ao longo dos anos, costurando 25 vestidos de noiva enquanto esteve na ativa.
Aos 28 anos, quando seu pai faleceu, ela se mudou para Pareci Novo, estabelecendo-se com a mãe e uma de suas irmãs na propriedade de seu irmão Armin Adolfo Heldt, que trabalhava para a Prefeitura de Montenegro e viria a ser primeiro prefeito de Pareci Novo. 10 anos após a mudança, a mãe de Lucy veio a falecer. Durante período que ficou com a mãe, por um compromisso firmado por ela mesmo, Lucy não se casou.
Depois da morte da mãe, Lucy firmou relacionamento e casou-se com João Celestino Bartel, na época viúvo e com dois filhos. “E esses dois guris eu criei, (eles) casaram, tiveram filhos e são os meus filhos – que melhores impossível”, comenta. Além disso, ela também adotou uma menina que tinha quatro anos à época. Essa família cresceu e deu frutos: hoje além dos três filhos são seis netos e seis bisnetos.
Surpresa e homenagem pelos 100 anos
Para marcar os 100 anos de Lucy, sua família lhe preparou uma grande festa surpresa. 170 convidados se reuniram no Ginásio Municipal Armin Adolfo Heldt no exato dia do seu aniversário. “Quando eu vi aquilo, eu chorei. Porque eu sou assim: eu choro de alegria e eu choro de tristeza”, afirma. “Não faltou um sobrinho meu. Eles tinham avisado todos”, comenta.
A idosa diz que não planejava fazer festa alguma, apesar das brincadeiras dos netos dizendo que tinham espeto para assar e perguntando quantos quilos de carne ela iria comprar. Ela desconfiou quando pediram para ela alguns álbuns antigos e também quando deu conta pela falta de um conjunto de roupa. “Me enganaram até a última hora”, garante.
Pouco depois de fazer 100 anos, Lucy também foi homenageada na Câmara de Vereadores de Pareci Novo. Ela recebeu um voto de louvor pelo seu centenário e dedicação, comprometimento e relevantes serviços prestados à comunidade de Pareci Novo. “Foi lindo”, afirma sobre receber a comenda, que foi indicada pelo vereador Luciano Hensel.
Resiliência e fé para chegar tão longe
“Qual o segredo? Eu trabalhei muito no tempo que eu era nova – como eu disse, a gente ia para a roça – e eu por qualquer coisa não me entregava”, começa Lucy sobre o segredo para ter uma vida longeva. “Eu sempre dizia: ‘Deus é grande. Deus vai me dar força’. E, aí, se eu tinha uma dificuldade eu dizia assim: ‘Eu quero, eu posso e eu vou conseguir porque Deus vai me ajudar’. E estou aqui”, complementa, destacando também a importância da fé.
Lucy conta, ainda, que à noite sempre faz uma oração para que Deus lhe dê juízo, lucidez e força. E suas preces estão sendo atendidas. Mesmo com 100 anos, ela ainda toma banho por conta. Seu deslocamento pela casa e propriedade se dá com o auxílio de um andador. Além disso, ela também segue cozinhando e ajudando em outras tarefas de casa, como estender a roupa no varal.
Lucy já foi mais ativa na vida junto à comunidade – principalmente ajudando nas festas de igreja. Mas, ainda hoje, segue participando dos encontros do Clube de Mães quando há a oportunidade.
Lembranças de uma Pareci Novo de outros tempos
Morando desde os 28 anos em Pareci Novo, Lucy guarda na memória lembranças de uma cidade muito diferente e que evoluiu bastante. “Quando eu vim para cá tinha poucas casas”, recorda. Ela também lembra que o primeiro posto de saúde em Pareci Novo foi construído através da união dos moradores.
Sobre a emancipação, sendo irmã do primeiro prefeito eleito, Lucy lembra as dificuldades do início dos trabalhos da nova Prefeitura. “De casa ele levou as cadeiras”, comenta. Ela também guarda na memória importantes conquistas da gestão do seu irmão, como a vinda de uma agência dos Correios para a cidade e também a realização da 1ª Citrusflor.
Pensando no futuro, Lucy diz que espera que cada prefeito continue lutando para que o Município fique cada vez mais bonito e com os políticos ajudando todos e não apenas favorecendo algum grupo. “Faça o bem sem olhar a quem”, resume, usando-se de um ditado bastante conhecido.