Aos poucos, Esperança se levanta da tragédia

Interior do município, localidade é um canteiro de obras com pessoas trabalhando duro para recomeçar a vida

“Não vai ser mais como era antes.” Foi assim que Nelson Aloísio Gaelzer, 63 anos, respondeu ao questionamento de como seria voltar para a nova casa, que está sendo construída sobre a antiga, essa destruída pelo vendaval do dia 8 de junho, em Esperança, interior de Maratá.

Um dos Aviários de Fernando e Elisete ainda espera a reconstrução. Outro foi totalmente destruído pelos fortes ventos

Como a maioria daqueles moradores, Nelson e a esposa dormiam. Até ouviram o vento e a chuva que se anunciava, mas nunca imaginaram o rastro de destruição que o fenômeno causaria.

No último sábado, o vendaval que deixou dezenas de famílias desabrigadas completou um mês. Havia sol, algumas nuvens e uma temperatura agradável.

Tinha vento. Vento que ainda deixa os moradores com medo. As lembranças daquela madrugada ainda estão vivas na memória da comunidade.

Nelson relembra que em menos de um minuto as paredes, levantadas ao longo dos anos, foram derrubadas pelo vento. Hoje, a casa quase pronta, graças às doações e ajuda que voluntários, tem pouca diferença na distribuição dos cômodos. “Acho que até o fim do ano a gente pode ‘tá’ de volta”, projeta.

Na pequena casa de madeira, Elisete e Fernando recomeçam a sua história

Próximo da casa dele, os vizinhos Elisete e Fernando Schneider já moram na casa nova — também erguida com materiais que foram doados por amigos e desconhecidos. Onde antes ficava a garagem, agora está a residência do casal. A mobília também foi doada. Uma das camas acomoda uma montanha de roupas que ainda devem ser organizadas. “Tá difícil ainda. A gente conseguiu a casinha, mas ainda falta bastante coisa. No aviário falta bastante coisa. A gente não tem nem noção de quanto vai sair a reconstrução dele. ‘Tá’ difícil começar tudo de novo”, confessa Elisete.

Dois aviários, que eram a única fonte de renda do casal, estão parados desde aquele dia. Um deles, recém-construído e equipado com alimentadores automáticos, está totalmente no chão. “Ainda nem mechemos nele”, revela Fernando. O outro, cujo teto cedeu, será a prioridade de reconstrução agora.

“Agora a gente ri, mas tu sabe o que a gente pensava depois daquilo?”, questionou Elisete. “Eu falava ‘vamos embora daqui’”, conta, tamanha desolação ao ver o trabalho de anos no chão. “A gente se sentiu perdido, mas aí vieram as doações.”

Na Casa de Dérno e Paulo Alberto Musskpof, apenas as paredes resistiram

Neste sábado, em Boa Esperança, Dérno Musskopf, 81 anos, trabalhava cortando lenha para abastecer o fogão que aquecia as panelas do almoço. De estatura mediana, ele usava um boné, constantemente levantado para que a mão pudesse arrumar os cabelos brancos.

Na língua nativa, o alemão, Seu Dérno relembrou como foi aquela madrugada. “Estávamos aqui”, aponta ele para o seu lado direito. “Aí veio aquele vento — vruum vruum — e levou o telhado. Achei que ia levar a casa toda”, descreve.

Ele e o filho, Paulo Alberto Musskopf, 51, se abrigaram na peça de alvenaria nos fundos da casa, área que sustentou as paredes de madeira para não serem levadas pelo vento. “Tem que ir refazendo aos poucos. A gente recebe ajuda dos voluntários. As paredes eu mesmo vou levantar, porque trabalho de pedreiro”, conta Paulo.

O reencontro depois da destruição
Com a sabedoria de alguém que já viu, e passou, por muitas coisas na vida, Maria Lerner Schneider, 80 anos, a Dona Iris, como é conhecida, reagiu de forma tranquila ao ver pela primeira vez como ficou a casa depois daquela madrugada.

IRIS retornou sábado à localidade e viu, pela primeira vez, a casa destruída

Ela lamenta, mas agradece por todos estarem bem. “A gente estranha sair assim tão rápido de casa”, conta Dona Iris, que naquele dia foi levada para o hospital por ter se ferido. Depois foi a Porto Alegre, onde ficou na casa de outro filho. “Hoje faz um mês, né?!”, indaga. “Tenho 80 anos, sou viúva há 26, e nunca vi uma coisa dessas”, lembra ela, espantada.

Mãe de Fernando Schneider e Odete Stein, moradores de Esperança, que também tiveram as casas atingidas pelo vento, Dona Iris, neste sábado, reviu a casa onde morava, onde criou os filhos e recebia a constante visita dos netos. Viu também o moinho de pedra grés, a casa dos filhos e vizinhos. Viu a destruição que nunca tinha imaginado ver de perto. Dona Iris conheceu ainda, a sua casa nova, que está sendo construída ao lado da residência da filha Odete.

“Quando a mãe ligava, perguntava: E a minha casa?”, contou Fernando. “Bah…eu não sabia o que falar. Fiquei enrolando, mas aí ela disse: ‘Vamos construir uma nova’”, disse, na tentativa de tranquilizar o filho.

Qualquer ajuda é bem-vinda
“Levantei para desligar o freezer. Ouvi o som e pensei ‘isso vem chuva’, mas aí logo começou a tremer toda a casa. Ainda me arrepio de lembrar disso”, conta Ricardo Musskopf, 52, morador da localidade de Esperança. Depois do temporal, ele, a esposa e os dois filhos tentaram recuperar o que conseguiram e se abrigaram em uma casa na vila cedida por um conhecido. “Fiquei quatro noites sem dormir e quase sem comer até tudo começar a se encaixar de novo.”

Com as paredes levantadas, a nova casa da família Musskopf, terceira a ser construída ao longo da vida, contou com a ajuda de doações e mão de obra voluntária de pessoas que Ricardo nunca havia visto. “Ganhamos quatro dias de mão de obra de graça de pedreiros de Ivoti”, recorda. Ainda faltam as aberturas da casa, telhado, piso e acabamentos, mas a família não vê a hora de voltar para o lar. “Esses dias vim aqui às 3h da madrugada. Não conseguia dormir. Fiquei aqui, olhando. Pensei quando vou vir pra casa de novo?”, revela Ricardo, emocionado.

A fonte de renda da família, uma pequena carvoaria, ficou parada durante esse mês. No sábado, Ricardo reacendeu o forno e a fumaça despontava do alto do morro. O gado leiteiro, que no dia do vendaval esperava para ser ordenhado, e as galinhas são para consumo próprio.

ODETE Stein, filha de Dona Íris, também ainda batalha pela reconstrução da casa

O espanto ainda é grande. Com olhar perplexo, ele tenta entender o que houve na madrugada da quinta-feira, dia 8 de junho de 2017. “A gente via na TV, esses tornados nos EUA levando casa assim, até comentava: ‘isso deve doer’, mas nunca imaginava que ia acontecer e passar por isso”, confessa.

 

 

a tragédia em números
Prejuízo em Maratá: R$ 7.399.550,00
Danos:
– 2 pocilgas destruídas
– 3 aviários (2 frango de corte e 1 postura comercial) destruídos
– 11 casas totalmente destruídas
– 4 residências perderam todo o telhado
– 8 casas tiveram danos em 30% do telhado
Doações:
– Aproximadamente R$ 140 mil

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