Afinal, quem são os vilões da alta da gasolina?

O mês era fevereiro de 2021 e, com um tanto de pavor, a capa do Jornal Ibiá trazia que o valor da gasolina tinha passado dos R$ 5,00 em Montenegro. Hoje, que já passamos dos R$ 6,00, a manchete que era um pesadelo já tem ares de sonho. Pesquisa realizada pela coluna nessa terça-feira, dia 31 de agosto, em onze postos da cidade mostra a comum sendo comercializada por, em média, R$ 6,05. O mais barato dos pesquisados vende à R$ 5,94. O mais caro, à R$ 6,09.

O Seu Bolso já explicou, há algumas edições, o que vem influenciando essa alta tão acentuada, mas tem se visto ainda bastante desinformação sobre o assunto. A principal das colocações, repetida bastante pelo presidente Jair Bolsonaro, é a de que o imposto estadual do ICMS e a “ganância” dos governadores são os grandes responsáveis pelo fenômeno. Mas não é bem assim.

 

ICMS pesa, mas imposto estadual não passou por reajustes


A figura acima, com dados da Petrobras atualizados na semana passada, mostra a composição média do preço da gasolina que é cobrado dos motoristas no País. Há a parcela de 10,4% dos custos e da margem de lucro de distribuidoras e postos; 11,5% de tributos que são federais; 16,9% da mistura obrigatória de etanol; 33,6% do que é cobrado pela Petrobras (ou por importadores); e a diferença de 27,6% que é do tributo estadual do ICMS.

Esse imposto dos estados é cobrado, com um alíquota fixa definida por cada unidade da federação, em cima de um estimativa de preço médio pago pelos consumidores. Então, quando o preço aumenta na bomba, periodicamente os governos estaduais atualizam essa estimativa e o montante de ICMS recolhido, de fato, sobe. Veja: os valores praticados na venda influenciam diretamente no montante recolhido de imposto.

Dizer que é esse tributo o grande vilão diante das recentes altas da gasolina, portanto, faz pouco sentido. A alíquota fixa aplicada sobre o preço médio do produto, afinal, não teve nenhuma alteração durante esse período. Aqui no Rio Grande do Sul, inclusive, onde ela é de 30%, a Reforma Tributária aprovada no fim do ano passado definiu uma redução para 25% a partir do ano que vem. É evidente que reduzir o imposto vai influenciar no preço dos postos – algo que precisa ser feito com muita responsabilidade – mas, de novo, não dá pra afirmar que é por causa do tributo que os preços estão desse jeito.

Então, o que está acontecendo?
O próprio gráfico da Petrobras, que é dominante no mercado, já mostra que o item de maior peso no valor da gasolina é o custo da primeira etapa, nas refinarias, e os constantes reajustes feitos. É que o valor praticado pela estatal, desde o governo Michel Temer, tem como política a paridade com o mercado internacional. Em outras palavras, ele segue o valor do petróleo praticado a nível mundial, em dólar. Sendo assim, também varia de acordo com a variação cambial. São dois pontos chave para o que está acontecendo por aqui, nos postos de combustíveis. Vamos entender?

O petróleo está caro
É o barril de petróleo do tipo Brent, negociado em Londres, que a Petrobras usa como base para calcular o seu preço. Ele teve um aumento de quase 40% desde o início do ano. O que aconteceu, pra isso, foi a pandemia de coronavírus. Lá no ano passado, quando o mundo praticamente parou, houve uma disputa de preços entre a Arábia Saudita e a Rússia, grandes produtores mundiais. Na época, eles aumentaram a produção e, como havia baixíssima procura pelos combustíveis, derrubaram os preços no mundo todo. Você lembra?

Mas superado o impasse, logo depois iniciou-se um movimento contrário. As coisas começaram a se normalizar, as pessoas voltaram ao trabalho, voltaram a se deslocar mais; e a demanda pelos combustíveis só fez crescer. Acontece que a produção ainda não acompanhou esse mesmo ritmo.

A Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+), que engloba os maiores produtores do mundo, havia concordado em reduzir a produção durante 2020, mas ainda enfrenta impasses entre seus membros num processo de retomada que vem ocorrendo de forma gradual (e devagar). A projeção da Agência Internacional de Energia (AIE) é que a balança entre a oferta de combustíveis e a procura só se equilibre de novo no primeiro trimestre de 2022. Enquanto isso, os preços tendem a seguir altos.

O dólar está alto
Como os negócios são feitos pelo mercado internacional, tudo é negociado em dólar. E um problema extra para o Brasil, nesse sentido, é que o real ainda está muito desvalorizado diante da moeda norte-americana. Na segunda-feira, ele fechou a R$ 5,18. Se já está alto o valor do petróleo lá fora, ao atualizá-lo para a moeda nacional, força bastante o preço para cima.

É importante entender que a lógica do valor do dólar perante o real também segue a lei da oferta e da procura. Se há bastante dólar circulando no Brasil, a moeda estrangeira acaba custando menos reais. Quando há pouco dólar circulando, é o contrário. A moeda custa mais reais.

Aí, há uma série de fatores, internos e externos, que explicam a redução da entrada de dólar no País. Um deles é a redução do turismo, com menos estrangeiros visitando as cidades brasileiras no cenário de pandemia e, assim, deixando de injetar dólares em nossa economia. O principal fator, porém, parece estar na ainda reduzida atratividade do Brasil para investimentos estrangeiros. Um cenário de avanço da variante Delta do coronavírus; forte instabilidade política com ameaças às eleições e uma crise institucional entre os poderes; e incertezas quando a efetividade da agenda de reformas gera receio em investidores que, muitas vezes, preferem colocar seu dinheiro em países que consideram mais seguros para investir. Com isso, entra pouco dólar e o real desvaloriza.

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