A verdade é que os jovens estão no campo

SUCESSÃO. Douglas Reidel é exemplo e exceção de permanência na terra

Talvez o Governo do Estado tenha sido surpreendido com as mais de 9.000 inscrições no Programa de Apoio a Projetos Produtivos para Jovens da Agricultura Familiar, sendo que na primeira etapa, divulgada em outubro, contemplará apenas 244. Essa realidade contrasta com a retórica de garantir a sucessão na propriedade rural, provando que, na verdade, os jovens estão lá, lutando contra dificuldades do clima, do mercado e incentivos pífios.

O Ibiá foi conferir as particularidades de um dos jovens no Vale do Caí selecionados neste ‘braço’ do Programa Agrofamília; para saber como e por que aos 26 anos Douglas Eduardo Reidel está convicto de sua decisão de ficar nas terras dos pais – Maria Lurdes e Vilson José Reidel – em Vila Nova, interior de Maratá. “Desde pequeno eu já ia junto à roça”, recorda, para explicar seu amor incondicional pelo lugar onde nasceu.

O menino ainda dividia seu tempo com a lavoura dos saudosos avôs maternos, Irena e José Colling, fortalecendo o vínculo afetivo que facilitou sua decisão aos 17 anos, após se formar no Ensino Médio. Não foi somente de ficar na terra, mas ele ambicionava ampliar a produção para além de o mato de Acácia Negra e da lavoura de Aipim. A mãe confirma que foi de Douglas a ideia de iniciarem criação de gado leiteiro.

Dona Maria queria que o filho seguisse os estudos, desejo contraposto pelo gosto do filho na lida com animais. “Eu queria ficar, e o gado daria uma renda mais certa”, explicou. Todavia, o pecuarista visionário confirma ser uma exceção, pois dos 20 alunos do 3º Ano – 2014 da Escola Estadual Engenheiro Paulo Chaves, apenas ele e outro colega seguem na agricultura.

A lida é dura
Na análise de Douglas, há variáveis que influenciam os jovens que deixam o campo; desde simplesmente não curtir a rotina e o serviço pesado, até a falta de impulso da própria família, inclusive de pais que não aceitam mudança no sistema de trabalho. “Tem que gostar! Não ter medo de se sujar”, comenta. Seu ramo de atuação mesmo ilustra bem os sacrifícios desta escolha; pois a criação não permite que a família se ausente por longos períodos. Ao menos uma pessoa precisa ficar cuidando das 63 cabeças de gado.

A contração de funcionários é pouco viável, uma vez que no meio rural não é como na cidade, onde há mão de obra operária dos diversos setores da economia. No interior, basicamente, vivem famílias que se dedicam às suas propriedades, não havendo quem atue na lavoura dos outros. Deste ponto, Douglas começa a explanar a respeito da profissionalização, assinalando que não há acesso ao conhecimento para uma pessoa que deseje trocar a cidade pelo campo. O ramo do leite, por exemplo, exige prática, sendo complexo devido a questões sanitárias e saúde do animal.

Douglas está feliz em casa, mas quer sua própria terra

Jovens querem conhecimento e sua terra

Profissão pede aprendizado constante e investimento

A falta de perspectiva é agravada pela ausência de incentivos mais significativos, e que vão muito além do financeiro. Um grande exemplo está no Vale do Caí, onde não há escola de Nível Médio ou faculdade de especialização agrícola. A instituição mais próxima é em Teutônia, cerca de 70 km, o que impõe uma jornada insana diante da impossibilidade de se ausentar por longos períodos.

Ele recorda que a rotina do agricultor inicia antes do sol nascer, logo, estudar no turno da noite e tão longe é muito desgastante. Para Douglas a alternativa foram cursos específicos de curta duração, em instituições privadas, que bancou com recursos próprios. Dos três que fez, apenas em um recebeu apoio do banco Cooperativa Sicredi e da Federação dos Trabalhadores (Fetag-RS).

Os pais estão felizes com a decisão do filho, e sua consequente garantia de que as terras que compraram com muito esforço ficarão na família. Já o jovem agricultor nutre o desejo de ter o seu quinhão, assinalando então ao último obstáculo à sucessão que observa. “Não tem uma linha de crédito para comprar tua própria terra. Com certeza muitos jovens iriam comprar, talvez até ficar mais na terra, porque teriam mais condições de investir”, avalia.

 

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