Pichação ou arte? População opina sobre as pinturas e as frases espalhadas pelos muros e pelo chão da cidade
Pichação ou arte? Filosofia ou depredação? O amor acaba? A morte é “Serta”? Como você interpreta as frases pichadas em muros e no chão da cidade?
Os conteúdos geram opiniões contrárias, entre os que defendem e os que criminalizam a prática. Mas uma questão é dada como certa: muitos desses escritos servem para reflexão, trazem lições morais e retratam a atual situação política do país. Outros tantos, porém, de acordo com a convicção dos montenegrinos, só fazem sentido para quem os produziu, porque para muita gente isso não passa de uma afronta contra os espaços públicos do município.
Daila de Oliveira, 18 anos, e Paulo Griebeler, 33, interpretam como sujeira e poluição visual os recados que “estampam” a cidade. Apesar de raramente prestarem atenção ao sentido que o autor pretende passar, os textos e as mensagens, para eles, nada mais são do que rabiscos feios. Não há nada de arte.
Além do casal, tantos outros montenegrinos apressados devem dividir o mesmo ponto de vista, ou sequer notam os rabiscos, preocupados com seus afazeres diários. Na cidade que recebeu o título “das Artes”, tudo realmente é ou deve ser considerado arte?
Frases em muros ou estrategicamente escritas no chão normalmente estimulam a pensar no sentido do que retratam e influenciam atitudes, como uma provocação deixada no prédio do Sine: “Você já viveu hoje?”.
O amor acaba
Uma das frases rabiscadas em um muro da rua Ramiro Barcelos é a afirmativa de que, sim, “O amor acaba.”
Apesar de concordar com ela, pois tudo que tem início tem fim, Conceição Cruz, 80 anos, afirma que se trata de uma depredação do patrimônio alheio. “Polui a cidade. É feio.”
Conceição, casado há 55 anos, afirma que o amor não acabou e ainda vai demorar a findar. “Mas é transitório, da vida. De uma maneira ou de outra, seja com a morte de alguém, termina”, explica. O debate sobre questões cotidianas vem naturalmente quando se experimenta analisar a filosofia das ruas. É inevitável não pensar sobre elas. Tocam, muitas vezes, nas feridas da alma.
Como no caso de Hebe da Silva, 60 anos, que declara enfaticamente não acreditar mais no amor entre homem e mulher. Ao prestar atenção na declaração pichada, relembrou relacionamentos infelizes. “Há frases que valem a pena olhar com mais atenção, pois ficam como lição. Por exemplo, a que pergunta se o banheiro é ali. Alguns, principalmente homens, fazem xixi naquele canto quando estão apertados, e a pichação intimida”, acredita. Mesmo assim, para Hebe, é vandalismo.
Mateus Oliveira, 15 anos, ao contrário, considera as pichações uma manifestação de arte. Apesar de não refletir mais profundamente sobre elas, explica que muitas são carregadas de conotações de protesto. “Quando a pessoa faz só por fazer, aí é vandalizar. Mas muitas têm críticas ao governo”, afirma.
Protesto político é considerado válido
Edilene dos Santos Barreto, 17 anos, não sabe se os locais de pichação são propriedades particulares e se o donos concordam, mas
acredita que as frases estão coerentes com o atual cenário político. “Eu concordo. É uma forma de manifesto, traz uma reflexão. Quem escreve pode estar tentando expor os seus sentimentos. Eu concordo com pichação, mas não em local público ou propriedade sem autorização”, diz. “Fora Temer golpista” ou “não à PEC” são algumas das mensagens às quais ela se refere.
Celso Coelho, 59 anos, analisa placas, banners e frases sempre que transita pela cidade. Ele defende que a arte do grafite é uma coisa, mas “pintador” de muro é outra. Apesar disso, não nega que as
mensagens podem ter alguma influência sobre quem as lê.
“Ali naquele recado, ‘A morte é Serta’, já está dizendo que ela não é, pois a palavra está escrita errada. ‘Não à PEC’ é outra coisa correta. E onde diz ‘Coragem’, também. Precisamos de coragem para assumir um erro ou acerto”, frisa.
Contudo, ele afirma que é preciso cuidado por parte de quem pinta, pois as mensagens são expostas e permitem que um grande público as veja e interprete de diferentes maneiras.