80% dos presos na Modulada não têm condenação

Caos carcerário. Mutirão da Defensoria Pública encontrou homem inocente que há um mês aguarda pela liberdade

Punição sem justiça é irregular e pouco benéfica ao sistema de segurança e à comunidade livre. Pois esse cenário, alicerçado na morosidade do Poder Judiciário, pode ser observado na Penitenciária Modulada Agente Jair Fiorin, em Montenegro. Segundo levantamento da Defensoria Pública do Estado, dos 1.609 homens presos, 1.300 ainda não possuem condenação. A situação do anexo feminino ainda não foi calculada. Foi pensando em ao menos reduzir essa desordem que o mutirão do Projeto Defensoria Itinerante do Sistema Prisional (Disp) ficará duas semanas na Modulada.

E antes que alguém defenda que preso tem que sofrer sem direito a nada, é bom esclarecer que o resultado deste trabalho é justamente abrir vagas para mais presos no sistema. A defensora pública Barbara Lenzi, coordenadora do Disp e Dirigente dos Núcleos de Defesa em Execução Penal e Criminal da Defensoria Pública, observa que o mutirão surge justamente devido à crise na Segurança Pública do Rio Grande do Sul.

“Pensamos, precisamos colaborar de alguma forma”, declara. A ideia então foi entrar nas casas prisionais e rever processos, encaminhar pedidos pendentes e averiguar a situação de cada homem e mulher atrás das grades. Esse trabalho pretende dar liberdade, ou liberdade provisória, a réus primários, autores de crimes de baixa periculosidade e indivíduos que já cumpriram sua pena, abrindo, assim, vagas para outros criminosos que aguardam em delegacias e até viaturas da Brigada Militar estacionadas em pátios de delegacias. “Mais um vaga aberta é menos um preso em delegacia”, defende Barbara.

Detidos há mais de 2 anos e sem julgamento
Os casos encontrados na Modulada de Pesqueiro não diferem da realidade geral do sistema penal brasileiro. Um preso atendido pelos defensores do mutirão está há 6 meses aguardando a progressão de regime, após cumprimento da parcela de cadeia que lhe alcança esse direito. Esse é um caso no qual, além da morosidade do Judiciário, a falta de vagas no semiaberto tranca sua situação.

Doutora Barbara Lenzi (ao centro) ainda não calculou quantas vagas o mutirão abrirá em Montenegro

Há homens e mulheres que estão há 02 anos, 02 anos e meio, detidos aguardando um julgamento justo. Dependendo da pena imposta, eles até já a cumpriram. Houve um caso em que os defensores descobriram que há mais de um mês o preso foi absolvido da acusação, porém seu alvará de soltura ainda não chegou na Modulada. Essa é uma situação no qual trâmites legais colaboram para que houvesse a demora.

Antes de soltar o preso, os servidores da Susepe precisam fazer uma minuciosa varredura no sistema para verificar se ele não cumpre punição imposta em outro estado. Tudo que esses indivíduos pedem aos defensores são informações. Querem saber as quantas anda sua situação, se saiu condenação, se saiu absolvição, onde está parado seu processo.

Pedem encaminhamento de Habeas Corpus, remissão de pena por dias de trabalho na cadeia e progressão de regime. Barbara revela ainda que de toda a população carcerária gaúcha 35% são provisórios, aguardando andamento do processo. “Mas nossa proporção ainda é menor do que no País, onde o índice é de 40% dos presos”, afirma a coordenadora.

Judiciário não dá conta dos processos
Essa situação não é culpa da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). É exclusivamente problema da morosidade com que os inquéritos andam no Poder Judiciário. Mas Barbara Lenzi reitera que não é má vontade, e sim, déficit de juízes e varas criminais, diante do elevado número de processos acumulados. Números da Defensoria revelam que nos últimos 18 meses, as polícias prenderam 8 mil suspeitos.

Atenção dispensada no atendimento individual reduz tensão na cadeia

A advogada salienta que, ao contrário da percepção coletiva, os juízes estão soltando menos, o que agrava o problema da falta crônica de vagas no sistema prisional. Outro serviço que precisa urgentemente ampliar sua estrutura é a Defensoria Pública. “Precisamos de mais defensores”, decreta Barbara, usando o exemplo da Comarca de Montenegro que tem apenas um advogado atendendo gratuitamente.

Essa solidão profissional limita em apenas uma visita por mês à Penitenciária Modulada; enquanto divide seu tempo com pedidos de ajuda dos cidadãos livres, em diversas áreas. “Por isso que resolvemos vir aqui, pois o atendimento é precário”. Em pouco mais de uma semana, o mutirão irá zerar o atendimento aos cerca de 240 presos carentes de assessoramento jurídico gratuito.

A presença dos advogados tem reflexos positivos, pois acalma a casa prisional. A atenção dispensada e as notícias repassadas deixam os presos mais satisfeitos, logo, menos agressivos e propensos a brigas e rebeliões. Essa calma lá dentro acaba refletindo aqui fora.

O Número
Atualmente o Estado tem 36.784 presos, sendo que destes, 13.018 são provisórios
(Fonte: Susepe)

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