Palestras, tour e lançamento de novo projeto fizeram parte do evento
Desde a data em que a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea – 13 de maio – já se passaram 134 anos da Abolição da Escravatura. Para discutir sobre a “liberdade” concedida ao povo negro, e a sua realidade no Brasil, Central Única das Favelas (Cufa) Montenegro promoveu neste sábado, 14, o evento “14 Maio, O Dia Seguinte. E Agora?”, na Casa Amarela, na Estação da Cultura.
Para o coordenador da Cufa Montenegro, sociólogo Rogério dos Santos, é importante sempre questionar a liberdade dada ao povo escravizado. “A gente ainda está pendendo essa tal abolição até hoje, onde aumentou muito os casos de racismo, onde negros ainda são enxotados de lugares que acham que eles não podem”, fala.
Segundo Rogério, nunca houve uma reparação propriamente dita pós-abolição. “Os negros ficaram 50 anos sem poder estudar e sem direito a propriedade, o que resulta nesse atraso. Se ver onde está a maioria da classe mais vulnerável do nosso país é a população negra”, completa.
Para abordar o tema, mulheres de diversas áreas levaram debates para o evento. A pedagoga, Jaqueline Rosa, destaca que a educação antirracista não deve ocorrer somente na escola. “Quantas vezes a gente foi em uma festa de aniversário e deu um presente de origem indígena para uma criança? Quando que deu um presente com personagens negros? A gente quase não leva isso nas festas de aniversário, então as crianças não tem esse contato e elas precisam ter esse contato A educação antirracista não se da somente em sala de aula, ela é pra vida, e as pessoas precisam entender isso. E mesmo que elas não entendam, a gente sabe que é uma lei e vai cobrar”, afirma.
Mulher negra e vereadora de Porto Alegre, Daiana Santos, reitera que neste dia é importante dar destaque a consciência adquirida. “Se não está da forma como deve ser devemos questionar, a gente não pode naturalizar que a cada 23 minutos um corpo preto jogado no chão morto de forma violenta, que a fome tem cor, que a população em situação de rua tem cor, que a violência contra as mulheres tem cor, que o encarceramento em massa tem cor, que a evasão escolar tem cor. A gente não pode naturalizar isso, porque isso é negligência de um Estado que nos aponta, responsabiliza, culpabiliza e nos tira a possibilidade de avanço, e quando a gente questiona mais, mata”, diz.
Ainda foram debatidos temas como a questão jurídica, com a Juíza Priscila Palmeiro e a delegada Sandra Mara Neto; atual situação, perspectivas e caminhos da mulher negra, com a advogada e representante das Mulheres do Brasil e da rede Afroempreendedorismo, Mariana Ferreira dos Santos; e particularidade da vida de uma mulher negra, com a coordenadora da Cufa Porto Alegre e ativista social, Ivanete Pereira. Após as palestras, foi realizado um passeio guiado por pontos históricos negros do Município, como a Associação Cultural Beneficente (ACB) Floresta Montenegrina, o bairro Santo Antônio, o Cais do Porto e o bairro Bela Vista.
Os participantes também foram guiados até o Espaço Isokan da CUFA Montenegro, onde foi servida uma comida típica e foi lançado o projeto Memorial Negro do Vale do Caí. O local para o Memorial foi marcado com um tronco, o que segundo Rogério é uma provocação a todos. “Muitas pessoas acham que é muito agressivo o tronco, mas é pra gente nunca mais esquecer (dessa história)”, diz. Ele explica que mesmo após a libertação os troncos ficaram durante muito tempo nas cidades como forma de “ameaça” aos negros.