Nunca gostei de cachorros. Calma. Nunca gostei de tê-los em casa. É preciso limpar o cocô do cachorro. É preciso dar banho no seu cãozinho. Tem que alimentar o cachorro e alguns são bem nojentinhos, não comem qualquer ração. Querem só as premiuns, aquelas com iscas de carne fresca. Eles têm pelos. E soltam-nos pela casa, pela roupa, pelo sofá. É preciso limpar a casinha do seu cachorro, colocar um perfume canino, senão fica com cheiro de cachorro molhado. Eca, você já sentiu cheiro de cachorro molhado? Enfim, nunca quis ter em casa pelos motivos expostos.
Só que tenho uma neta, a Marina. E ela adora cachorros em casa. E se ela adora e quer tê-los, vovô também quer. É a lógica. Os netos sempre conseguem com os avós o que os pais lhe negam. É a vida.
Assim, chegou à nossa casa, faz uns três anos, o Ohlaf, meu (da Marina) cãozinho. Levou este nome porque é branquinho como o boneco de neve criado por Elsa, da animação Frozen, dos estúdios Disney. E eu passei a adorar cachorro em casa. Ohlaf é minha terapia quando chego a noite, cansado de olhar, despachar, atender o contribuinte, levar processos para o prefeito assinar, me irritar com a burocracia pública. Você acredita que fazem quatro meses estou tentando comprar um bebedouro para o gabinete do prefeito? Quatro meses! Tudo isso é esquecido quando Ohlaf me olha com aqueles olhinhos pretos e começa a roncar pedindo minha atenção. Ele ronca, não late. Ronca. Esqueço tudo e passo a dar-lhe carinho. E ele retribui na medida em que seu cérebro canino permite. Por isso não entendo quando vejo animaizinhos enforcados na beira da estrada, ou assassinados por venenos em meio à carne moída. Alguém já disse uma vez que, quem trata mal um animal, certamente tratará mal um humano. Mais pura verdade.
Hoje penso que todos deveriam ter um cachorro em casa. Traz paz e harmonia à nossa existência. Algumas pessoas deveriam ser obrigadas a manter um animal em casa para tratar as suas frustrações. Deveriam, por ofício (palavra da moda) ser constrangidas a ter o seu cãozinho, para fazer a sua terapia, economizando com psicólogos. Tratar seus medos, seus demônios internos, sua irritabilidade, sua arrogância. Isso faria um bem a elas próprias. Imagina que, ao invés de desfilar seus recalques ou no lugar de ofender tudo e a todos você chegue a casa e passe a ser lambido pelo seu amiguinho de quatro patas? A raiva passa na hora. A irritabilidade amaina. A frustração some.
Animais são ótimas companhias. Mais até que alguns humanos, animais não traem, animais não são falsos, animais não cobiçam tuas coisas, não ficam com inveja, não cultivam ressentimentos. Ohlaf, por mais que às vezes eu o trate mal ou com indiferença, porque a vida é dura e nem sempre estamos de bom humor, ele nunca se lembra do que lhe fiz. Sempre está a abanar seu cotoco de cauda pedindo atenção e carinho. Que terapia, senhores. Meus problemas do dia a dia caem no esquecimento.
Sabemos que a vida está difícil. O dólar passando de cinco reais não está fácil para ninguém. Ainda mais em um país de terceiro mundo achacado há décadas pela corrupção. Desemprego, violência e infraestrutura são problemas que realmente nos deixam preocupados, mas nada justifica destilarmos ódio no dia a dia. Adote um cachorro. Talvez ele ronque para você e você se acalme.