Eu tive um vizinho muito caprichoso. Era aposentado e passava seus dias a cuidar do pátio, da calçada e de suas arvorezinhas ornamentais, as quais podava com esmero. Mas, tinha um vício o vizinho. Sub-repticiamente jogava o produto das podas por sobre o muro, para o terreno que outro vizinho havia limpado para construir sua humilde residência. Não queria sujeira em seu pátio, quase asséptico, mas não se importava em jogar seus restolhos para sujar o terreno do vizinho.
Em 1975, quando anunciado o terceiro pólo petroquímico brasileiro, ambientalistas-raiz, daqueles não remunerados e que enfrentavam os coturnos da ditadura militar, se opuseram ao inédito empreendimento. Entre aqueles bem intencionados ambientalistas dos 70, estava o mítico José Lutzemberger.
Não ganhou a guerra, o velho Lutz. Não obstante, venceu a mais importante batalha. Sua luta levantou discussões. Resultou que o Pólo Petroquímico do Sul foi projetado com a mais alta tecnologia de então, incluindo o sistema de tratamento terciário de efluentes líquidos, que devolve ao Rio Caí a água usada nos processos, dentro de parâmetros mundiais de qualidade. E com a devida fiscalização da FEPAM, órgão respeitadíssimo e temido por empreendedores não comprometidos com a sustentabilidade do planeta, os quais se arrepiam com o rigor da legislação ambiental gaúcha.
Em 1997, o Governo do Estado anunciou uma penitenciária modulada a ser instalada aqui na cidade. As chamadas forças vivas do município se levantaram contra. A prefeita de então, Madalena Bühler, foi maltratada como se fosse a responsável por trazer um mau negócio que atrairia a bandidagem, crença que é contra as estatísticas. Segundo dados científicos, em lugares onde há penitenciárias instaladas, há mais segurança. E a razão é simples. A polícia também está ali. Ninguém se importaria se o presídio fosse instalado em Capela de Santana ou em Nova Santa Rita. Em Montenegro, não.
No ano passado, o Governo estadual anunciou um pedágio em Muda Boi, arrancando a praça de Rincão do Cascalho, o que nos permitiria deslocamentos sem tributação para o Vale do Sinos e tantas outras localidades. A voz da unanimidade (Nelson Rodrigues, por favor, me acuda!) se levantou contra o pedágio. Nobres vereadores, respeitáveis comissionados, Executivo e parte das metamorfoses ambulantes municipais abriram o berreiro, marcharam sobre o Piratini e exigiram que a praça de pedágio não fosse instalada na Capital da Citricultura, do Tanino e das Artes. Certo, certo. Vocês venceram, pensou o pragmático burocrata das rodovias pedagiadas.
A praça será capelo-santanense. E aí, democraticamente, 70 mil montenegrinos foram, outra vez, incluídos como pagantes do pedágio da ERS-240.
Agora, a unanimidade se volta contra a instalação de uma empresa de tratamento de resíduos, já devidamente licenciada pela FEPAM. De fato, o passado governo municipal não chamou à discussão o CONDEMA – Conselho Municipal de Defesa do Meio-Ambiente – nem deu publicidade à solicitação de licenciamento ambiental. Entretanto, unanimidade inclui os vereadores reeleitos a quem pagamos para fiscalizar o Poder Executivo, que chuparam bala, entretidos em selfies em frente a obras alheias.
Toda discussão sem base em dados e conhecimento técnico-científico, é um gerador ineficiente. Produz mais calor do que luz. Uma empresa que trata resíduos é parte de uma grande engrenagem que pretende entregar sustentabilidade aos processos industriais. A empresa pode se instalar na outra margem do rio. Não em Montenegro. Isto me faz lembrar do vizinho, aquele, que mantinha seu pátio limpo jogando o que considerava lixo para o pátio do vizinho.
Montenegro não quer presídios. Montenegro não quer pedágios. Montenegro não quer empresas que tratam resíduos industriais.
Montenegro quer pão com banha.