Naqueles tempos em que havia a sucessão obrigatória das estações do ano, os invernos eram marcados pela alternância entre os dias frios e claros e aqueles de chuvas renitentes, intermináveis. As famílias organizavam seus processos internos de modo a não serem pegas de inopino quando chegassem os dias inverniços.
Os sinais da natureza eram interpretados e transmitidos às gerações posteriores com o valor das leis físicas: inerrantes. Assim, se as touceiras de maricás florescem cedo, no início do outono, o inverno será de frio intenso. Ninguém passa frio por falta de aviso. Se as formigas se mostram buliçosas, deslocando-se a correição para terrenos mais altos, é sinal de chuvas nos dias próximos, daquelas de alagar formigueiros.
Entravam em operação as mães de família, a lavarem blusões e casacos, enquanto havia sol e calor suficientes para secá-los, libertando-os do mofo dos fundos dos guarda-roupas. Quando havia trégua das chuvas miúdas, aquelas que não se importam com força mas com perseverança, coloriam-se os quintais com as exposições de roupas e lençóis dependurados nos varais de arame, esticados entre dois postes e sustentados por uma vara de taquara. Era o ritual de secar os“mijados” ao sol, como se dizia. Quando intuía-se que as águas seriam diluviais, erguiam-se os móveis dentro das casa em mutirões ribeirinhos. Tempos previsíveis, aqueles.
Os tempos são outros, agora. Apareceram fenômenos que se chamam El Niño e La Niña, inversões térmicas, efeito estufa, ciclones e tornados, coisas que nossa vã filosofia não imaginava existirem quando nossas informações sobre o clima vinham de forma suscinta pelas vozes-padrão da Rádio Guaíba:“tempo bom com nebulosidade variável; temperatura estável. Previsão para as próximas horas: tempo bom com nebulosidades variável. Agora na rua Caldas Júnior, vinte e quatro graus.” Não era necessária a prolixidade de um especialista como o Cléo Kuhn, pois não havia tantos detalhes a serem destrinchados. Precisávamos saber, apenas, se faria sol ou chuva, frio ou calor.
Tais fenômenos climáticos são os responsáveis por transtornarem as vidas das pessoas em todo o mundo. A natureza, vingativa pelos maus tratos recebidos, se mostra muito cruel quando ataca por todos os flancos em distintas geografias. Inundações em locais tão díspares quanto a Arábia Saudita e o sul do Brasil, incêndios que destroem ecossistemas em cantos tão antípodas como a Califórnia e o Pantanal, terremotos e vulcões em lados diametralmente opostos do planeta, apontam para um novo normal em que as tragédias são parte do dia a dia e desnudam as fragilidades de todos os sistemas governantes. Se os socorros mitigatórios até agora prestados aos flagelados são necessários, diante do que se apresenta, doravante serão necessários esforços governamentais – municipais, estaduais e federais – e privados para obras estruturais preventivas e corretivas das catástrofes naturais.
Nada é igual como era antes. Os maricás se deixam levar por veranicos e frentes frias, as formigas já não se entendem e cada uma corre para um lado, confundindo-nos sobre o que querem predizer.
Como o bruxo Rúbeo Hagrid preveniu Harry Potter (A Ordem do Fênix),“o tempo está mudando como da última vez. Vem tempestade aí, Harry. Melhor estarmos prontos para quando ela vier.”