O dono da lancha

Os efeitos deletérios da pandemia de Covid-19 ainda não são todos sabidos, mas temos que admitir que algumas consequências para a política local já se fazem perceber.

O prefeito Gustavo Zanatta teve seu período de isolamento recomendado pela Ciência para que, contaminado, não oferecesse o risco de infectar seus circunstantes. Passou a chave do Palácio Rio Branco para o vice. Recuperado, manteve o plano de se afastar outra vez, desta ocasião em férias. Passou a chave do Paço Municipal ao vice. Cristiano Braatz mal alongara os músculos e tendões da mão que assinara a ata de transmissão do cargo e foi diagnosticado com Covid-19, a infecção viral que era só uma gripezinha, tornou-se uma pandemia mortal e, agora, com modificações aleatórias do coronae pela vacinação massiva, voltou a ser considerada pelo populacho como só uma gripezinha. Como os protocolos ainda exigem, o vice precisou se isolar.

Braatz poderia manter o cetro erguido em home office.Como “forma de demonstrar o respeito que temos com a Câmara e com o presidente”, decidiu-se por passar o bastão para o presidente da Câmara de Vereadores, Talis Ferreira.Então, como proponho, nesta semana começam a se fazer sentir alguns dos efeitos do coronavírus na política montenegrense.

A assunção do presidente abriu espaço para que uma suplente tome assento no plenário da Câmara. Fato histórico, trata-se da primeira mulher negra a assinar termo de posse como vereadora em uma cidade que, além do gentílico que nos define – montenegrinos – é a terra de grande parte da população que é negra, desde antes que existissem a vila Santo Antônio e a rua Flores da Cunha.

Embora saudada pela Associação Floresta e pela CUFA – Central Única das Favelas, Fabrícia Souza pertence a um partido liberal conservador (de direita, vá!) que, por relativização ideológica, atende pelo nome de Progressistas. No menu político do partido existe um certo movimento Afro Progressista que não se vê enrolado em bandeiras pelas ruas, clamando por justiça racial. Não que eu tenha visto.
Fabrícia é, de per si, uma lutadora pelas causas dos desafortunados. Neste momento, briga pela derrubada de um muro erguido por endinheirados que fizeram crescer seus quintais sobre o leito da antiga linha férrea, no bairro Centenário, impedindo o trânsito de qualquer veículo, inclusive os de socorro como ambulâncias, polícia e bombeiros, pela via pública que ali se formou, a rua Doutor Chagas de Carvalho. Luta inglória, ignorada pelos poderes que, neste momento, saúdam a entrada de uma mulher negra no Legislativo municipal.

Um outro efeito que o afastamento social do vice, causado pela Covid, conjuminado com as vacações do prefeito, é Talis Ferreira. Pragmático e competente em sua pragmática, vai construindo sua carreira política de forma surpreendente para os desavisados. Escrevo sobre Talis desde que se lançou repórter social (aqueles que não têm formação, mas que prestam prestimosos serviços de informação às comunidades), quando só planejava ser radialista. Imprensa e políticos o subestimaram à época. Escrevi duas crônicas para o Jornal O Progresso lá por 2012 ou 13. Apostei na sua primeira eleição quando concorreu à vereança. E na segunda.

Se depender da vontade de Talis, concorrerá a deputado estadual nas próximas eleições. Não se elegerá desta vez, mas terá suficiente publicidade para buscar a prefeitura em 2024.

O fato é que os planos do Ferreirinha (alcunha patronímica que lhe deu o radialista Jalvi Machado), desenrolam-se como roteiro de série sob demanda, ou seja, que inapelavelmente cumprirá seu desiderato.
Os demais personagens da história, coadjuvantes com a malícia política de um impúbere, portam-se como aquelas meninas contratadas para um dia de domingo.

Todos saem nas selfies, mas o dono da lancha é o cabeça pelada.

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