Motivação

A propósito de uma troca de memes com um amigo sobre a fase do Inter, recebi dele um corte de uma entrevista em vídeo de Muricy Ramalho, quando de uma de suas passagens como treinador do São Paulo Futebol Clube. Muricy nunca foi um gentleman de trato fácil; pelo contrário, é sempre duro e direto ao responder perguntas de repórteres e críticas de comentaristas e, mesmo no trato diário com jogadores. Por esta característica, leva a fama de marrento, mal-educado, grosso. Tem muitos críticos de seu modo de pensar e agir, mas nenhum deles pode qualificar o ex-treinador como um perdedor. Muricy Ramalho é multicampeão pelos clubes por que passou.

Na referida entrevista, Muricy fala sobre motivação de jogadores. “De vez em quando eu ouço estas palavras: Muricy, como é que você vai motivar os caras? O quê? Motivar os caras? Tá de sacanagem, pô! O cara tá num time como esse aqui, recebe em dia, recebe bem pra caramba, tem uma estrutura como essa, come bem, dão de tudo pro cara, e eu tenho que motivar o cara? Cêtá de brincadeira, rapaz! O cara entra naquele portão ali, o portão do CT, o cara tem que ser o cara mais motivado do mundo aqui no São Paulo. Aqui eu só tenho que cobrar o cara.O diálogo é o seguinte, meu filho: o São Paulo te dá tudo isso, mas quer uma coisa em troca de você. É você ser profissional, não ficar no departamento médico, você entrar em campo e dar a sua vida. Entendeu?”Quem é tão transparente e claro ao revelar seus conceitos, se estes são aceitáveis pelo exercício da razão, arranja ao longo da vida alguns inimigos e muitos seguidores gratos. Alguém poderia alegar que a Muricy Ramalho lhe falta razão por dizer as coisas de forma tão direta? Verdades não são cerveja que devessem sempre descer redondo. Alguns, às vezes, temos que ser despertados pela aspereza das palavras dos impacientes.

O exemplo de jogadores milionários que necessitam de motivação extra para se desempenharem de suas obrigações tão bem elencadas por Muricy, afetam-nos a ponto de nos solidarizarmos com iniciantes que ganham“só” cento e cinquenta mil reais mensais. Para qualquer grau de escolaridade seria impossível um trabalho que remunere com tanta benevolência como o futebol. Dificilmente um jogador profissional da elite pensará em trocar de profissão para viver melhor.

Essa distração toda pode nos levar à não percepção de nossa própria realidade.

Quando justificamos nosso desempenho profissional – alinhado com a mediocridade – pela falta de motivação externa, isto é, da motivação que vem de outros ou de outras coisas, agimos iguais aos mimados jogadores que precisam de cafuné emocional para que se lhes extraiam a melhor versão (aaarrghh!) dos craques que são. Fico a pensar como jogaria a melhor versão do Pelé ou do Maradona.

Se o que nos pagam não é compatível com que achamos que valemos, que nos sirva de motivação para buscarmos promoção ou trocarmos para emprego melhor.

Quando não se honra o salário que se ganha – enquanto dele necessitamos– podemos passar vergonha como os jogadores do Inter: jogamos como o Luiz Adriano e queremos ganhar como o Suárez.

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